Com apetite reduzido por negócios no último pregão pré-Carnaval e na ausência de novos ruídos vindos de Brasília, o real experimentou uma rodada mais forte de apreciação na tarde desta sexta-feira, 17, alinhado à valorização de seus pares mais relevantes – peso mexicano, peso chileno e rand sul-africano – frente à moeda americana. Apesar do recuo do Ibovespa, operadores voltaram a relatar entrada de fluxo estrangeiro para investimentos em carteira, além da venda de dólares por exportadores.
Afora uma alta pontual na primeira hora de negócios, quando registrou máxima a R$ 5,2546, o dólar operou em baixa ao longo de toda a sessão, com mínima a R$ 5,1506 à tarde. No fim do dia, a divisa era negociada a R$ 5,1615, em queda de 0,96%, acumulando baixa de 1,16% na semana. Além do avanço de pares do real, o aprofundamento da baixa do dólar por aqui coincidiu também com o recuo das taxas dos Treasuries e a perda de fôlego do índice DXY, que mede o desempenho da moeda americana frente a divisas fortes.
"Não houve um fator econômico para explicar essa queda mais forte do dólar. Parece mais relacionada ao cenário externo, com os juros dos Treasuries virando para baixo à tarde. Pode refletir também um ajuste técnico para redução de posições em dólar antes do feriado", afirma a economista Cristiane Quartaroli, do Banco Ourinvest.
No campo político, a manutenção das metas de inflação no encontro ontem do Conselho Monetário Nacional (CMN), apesar de até certo ponto esperada, trouxe alívio. Palavras do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, hoje relatando estreitamento das relações com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, contrabalançaram os ataques, embora já mais amenos, do presidente Lula à gestão da política monetária. Ainda reverbera nas mesas de operação também a promessa de Haddad de adiantar a divulgação da proposta de novo arcabouço fiscal de abril para março.
Ontem, em entrevista à CNN, Lula disse que "não interessa brigar com um cidadão que é presidente do BC", mas pontuou que pode voltar a discutir a autonomia da autarquia, ao dizer que "se não melhorar a economia, nós temos que mudar", e afirmou que a meta de inflação definida pelo CMN não pode ser a razão pela qual o BC aumenta a taxa Selic.
"As divisas emergentes estão se valorizando frente ao dólar hoje e o real parece que está acompanhando essa onda", afirma o analista de câmbio da analista de câmbio da corretora Ourominas, Elson Gusmão, acrescentando que declarações de Haddad sobre aproximação com Campos Neto podem ter contribuído para a queda do dólar aqui. "Haddad parece uma espécie de escudo para as flechas que o Lula lança contra ao Banco Central"
Pela manhã, o ministro da Fazenda disse que o almoço ontem com Campos Neto, antes da reunião do CMN, trouxe uma boa aproximação com a ministra do Planejamento, Simone Tebet. Haddad se esquivou de perguntas sobre o debate em torno da meta de inflação e afirmou que a conversa foi "sobre alinhar políticas fiscal e monetária".
Circulou também informação de que estudo elaborado pela Secretaria de Política Econômica (SPE), ligada ao Ministério da Fazenda, mostrou ao presidente Lula que a meta de inflação no País não é a principal causa para os juros elevados. O presidente, segundo interlocutores do governo, teria se impressionado com os dados e poderia atenuar as críticas à meta.
A economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, observa que, na ausência de dados domésticos relevantes, a taxa de câmbio reagiu principalmente ao noticiário político ao longo desta semana. A promessa de divulgação do arcabouço fiscal para março, embora a proposta ainda não seja conhecida, "atuou para diminuir a incerteza do investidor". Além disso, houve a entrevista em tom conciliador do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, ao programa Roda Viva, da TV Cultura, e a ausência de surpresas na reunião do CMN.
"Esses eventos indicaram a disposição de alinhamento entre Banco Central e equipe econômica do governo, além de postergar uma eventual mudança nas metas de inflação. De todo modo, a moeda brasileira segue apresentando volatilidade", afirma Damico, ressaltando que o ambiente externo é de mais aversão ao risco, após dados da economia americana sugerirem que "o aperto monetário do Federal Reserve tende a ser mais prolongado e mais restritivo que o anteriormente previsto".