Após uma manhã de muita volatilidade, fruto da disputa pela formação da última taxa Ptax de setembro, o dólar se firmou em alta ao longo da tarde desta quinta-feira, refletindo, sobretudo, os temores relacionados à política fiscal, em meio ao debate em torno da prorrogação do auxílio emergencial e da tramitação da PEC dos Precatórios.
No pior momento ao longo da tarde, a moeda chegou a tocar na casa de R$ 5,47, ao correr até a máxima de R$ 5,4758 (+0,84%). A piora coincidiu com informações, apuradas com exclusividade pelo Broadcast, de que uma ala do governo defende a inclusão da prorrogação do auxílio emergencial na PEC dos Precatórios, ideia que encontraria resistências no ministério da Economia. Se não for incluída na PEC, a extensão do auxílio emergencial, adotado para lidar com os efeitos da pandemia do coronavírus, pode ser feita por crédito suplementar (fora do teto de gastos).
O Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) também apurou que, em reuniões organizadas por XP Investimentos e BTG pela manhã, o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, afirmou que não assinaria qualquer medida relacionada à prorrogação do auxílio emergencial. Segundo relato de fontes, Funchal adotou um tom pessimista e disse que há muitas pressões políticas para aumentar o gasto público.
A escalada do dólar só diminuiu após intervenção inesperada do Banco Central com a oferta de até 10 mil contratos (US$ 500 milhões) de swaps cambias, absorvida integralmente pelo mercado. Na prática, o BC injetou dinheiro no sistema com uma operação equivalente a venda de dólar futuro. Foi a primeira intervenção "surpresa do BC" desde 8 de julho, quando o dólar bateu R$ 5,30. Naquela época, o BC também ofertou também US$ 500 milhões.
Com o arrefecimento do ímpeto altista após a atuação da autoridade monetária, o dólar à vista fechou o dia cotado a R$ 5,4462, em alta de 0,29%. Foi o sétimo pregão seguido de ganhos da moeda americana, que encerrou setembro com valorização de 5,30% – resultado só inferior ao mês de janeiro, quando subiu 5,51%.
Mais cedo, em apresentação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, ao comentar a oferta de swaps para lidar com o <i>overhedge</i> dos bancos (até US$ 1,4 bilhão por semana), havia repetido que o câmbio e flutuante e as atuações do BC são para evitar "disfuncionalidades no mercado". No caso do <i>overhedge</i>, Campos Neto disse que é importante atuar, porque se trata de um fluxo "bastante grande, em um ano com bastante incerteza".
Segundo operadores, a virada do mês, com rolagem das posições no mercado futuro, tende a provocar solavancos no mercado e contaminar a formação da taxa à vista. Nas mesas de operação comenta-se, contudo, que uma ala do mercado quer esticar a corda para estimular uma atuação mais forte do Banco Central.
"O BC tentou se adiantar a pressão de fim de ano do <i>overhedge</i> já oferecendo swap, mas acabou piorando a situação, porque deixou o mercado com a impressão de quer é diminuir a fricção no dólar por que está atrás da curva (na condução da política monetária)", afirma o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo, ressaltando que tem tesouraria querendo "peitar o BC".
Na avaliação do diretor de estratégia da Inversa, Rodrigo Natali, não havia disfuncionalidade do mercado nem restrição de liquidez que justificasse uma intervenção do Banco Central nesta quinta. "A impressão é de que ele está querendo forçar a barra e segurar o câmbio para tentar de alguma forma conter a inflação e não subir tanto os juros", afirma Natali, que chama a atenção para o volume de intervenções do BC no câmbio, com os leilões de rolagem de swap, leilões para o <i>overhedge</i> e intervenções extras não programadas "O problema é que isso não funciona e mostra fraqueza do Banco Central".
O diretor da corretora Correparti, Ricardo Gomes da Silva, observa que o BC precisava atuar para evitar uma alta mais acentuada da moeda. Além das questões domésticas, Gomes da Silva ressalta que, apesar da moeda americana ter perdido força entre a maioria das divisas emergentes nesta quinta, a tendência é de valorização do dólar no exterior por conta da perspectiva redução da liquidez por conta do início da redução dos estímulos monetários nos Estados Unidos.
"O mercado se antecipa ao encurtamento da liquidez por conta do <i>tapering</i> , e ainda pelo aperto monetário via elevação dos juros em 2022. E aí não tem jeito, o dólar vai continuar valorizando", afirma o diretor da Correparti, que chama a atenção para declarações mais duras do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell.
Em fala no Congresso americano nesta quinta, Powell disse que o quadro inflacionário é "frustrante", diante de gargalos na cadeia de produção que perduram e parecem piorar. Isso, disse Powell, deve levar a inflação a ficar mais elevada por mais tempo do que o esperado anteriormente. O presidente do BC espera algum "alívio apenas no primeiro semestre de 2022".
O índice DXY – que mede a variação do dólar frente a seis divisas fortes – chegou a operar em alta, na esteira do discurso de Powell, mas depois arrefeceu e passou a trabalhar entre estabilidade e ligeira queda. É preciso ressaltar, contudo, que o índice vem de uma sequência relevante de alta e já está na casa dos 94 pontos.
Pela manhã, foi divulgado que o PIB anualizado dos EUA cresceu 6,7% no segundo trimestre, ligeiramente acima das previsões (6,6%). Já o índice PCE avançou 6,5% no período (alta de 6,1% do núcleo). A nota negativa para a economia americana foi a alta de 11 mil nos pedidos semanais de auxílio desemprego, para 362 mil (ante projeção de 335 mil).
Em sua fala nesta quinta, Powell também afirmou que os Estados Unidos estão em uma situação muito complicada, já que a inflação está em níveis elevados, enquanto o emprego permanece longe do patamar ideal.