Estadão

Dólar fecha no maior nível desde abril na véspera de decisão do Fed

A piora do humor externo ao longo da tarde, com aceleração das perdas das bolsas em Nova York e aumento dos ganhos da moeda americana frente a divisas emergentes, acabou respingando no mercado doméstico de câmbio. Após operar em queda firme pela manhã, quando chegou a descer até o patamar de R$ 5,61, sob impacto de leilão de linha realizado pelo Banco Central e do tom duro da ata do Copom, o dólar à vista ganhou força na etapa vespertina e, na máxima, chegou a se aproximar da linha de R$ 5,70.

Na véspera da decisão de política monetária do Federal Reserve, que deve anunciar a aceleração da redução de compras mensais de bônus (tapering) e trazer novas projeções dos membros da instituição para a trajetória da taxa de juros, investidores se acautelaram e reduziram a exposição a ativos de risco. Há também certa apreensão com o impacto da disseminação da variante Ômicron sobre a atividade econômica, em especial na Europa.

Em meio a um ambiente externo já desafiador, não pegou bem por aqui a notícia de que a agência de classificação Fitch ter reafirmado o rating soberano do Brasil em BB-, mas com perspectiva negativa pretextando o aumento do risco fiscal, diante da mudança da deterioração das perspectivas para as contas públicas com a mudança na regra do teto de gastos na PEC dos Precatórios.

Com oscilação de cerca de oito centavos entre a mínima (R$ 5,6190) e a máxima a (R$ 5,6981), o dólar à vista encerrou a sessão desta terça-feira (14) a R$ 5,6937, alta de 0,35%, emendando o quarto pregão seguido de valorização e no maior valor desde 13 de abril (R$ 5,7176).

"O mercado continua na expectativa de que o Fed vá acelerar o tapering amanhã e começar o aperto monetário nos Estados Unidos antes de junho do ano que vem. Isso acaba prejudicando as moedas emergentes", afirma a economista e estrategista de câmbio do Banco Ourinvest, Cristiane Quartaroli, acrescentando que o rebaixamento da perspectiva da nota do Brasil pela Fitch contribuiu para a alta do dólar por aqui à tarde.

Nos EUA, a inflação continua a surpreender para cima, o que estimula as apostas em um Fed mais duro. Pela manhã, foi divulgado que o índice de preços ao produtor (PPI, na sigla em inglês) subiu 0,8% em novembro, superando as estimativas dos analistas, de 0,5%. O núcleo do PPI, que exclui os voláteis preços de alimentos e energia, avançou 0,7% na mesma comparação, ante projeção de acréscimo menor, de 0,4%. A inflação acima do esperado ajudou a dar mais força ao dólar no exterior. O índice DXY – que mede a variação do dólar frente a seis divisas fortes – operou em alta firme ao longo da tarde, na casa dos 96,500 pontos, perto das máximas.

Operadores ressaltam que o real até se comportou bem ao registrar perdas inferiores a de seus pares emergentes, como o rand sul-africano e o peso mexicano. Boa parte da resistência do real hoje é atribuída a movimento de ajustes técnicos, com realização de lucros, e a atuação do Banco Central, que tem provido liquidez para fazer frente a remessa de recursos de fim de ano.

Depois de venda US$ 1,592 bilhão em leilões de venda à vista na sexta-feira e ontem, o BC colocou hoje US$ 500 milhões em leilão de oferta de linha (da oferta de US$ 1 bilhão).Foi vendida a oferta total de 15 mil contratos (US$ 750 milhões) para rolagem dos vencimentos programados para fevereiro.

"Essa atuação do BC ajudou a amenizar um pouco a pressão de alta do dólar. Com o leilão de linha hoje, ele ajuda a aliviar o caixa dos bancos, que precisam devolver linhas e já não encontram tanta liquidez no exterior para fazer operações", afirma o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo.

Galhardo vê o dólar oscilando em uma banda informal entre R$ 5,50 e R$ 5,70, de acordo com o apetite por risco no exterior, a demanda por remessas e a percepção de risco fiscal doméstico. As intervenções do BC podem não trazer um alívio permanente para a taxa de câmbio, mas têm o poder de modelar as flutuações e podem ter evitado que o dólar rompesse os R$ 5,70, diz Galhardo.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reiterou hoje que o BC atua no mercado de câmbio para eliminar problemas de liquidez, e não como linha auxiliar da política monetária. "Se existe a percepção de que a intervenção está indo além, as pessoas procuram outro instrumento de hedge (proteção).Vemos claramente que intervenção cambial exagerada causa danos no mercado de juros, porque as pessoas deixam de se proteger no dólar e vão se proteger nos juros longos", afirmou Campos Neto, em debate sobre política monetária realizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Divulgada pela manhã, a ata do Copom reiterou o tom duro do comunicado do comitê na semana passada, quando a Selic foi elevada em 1,50 ponto porcentual, para 9,25% ao ano. Apesar da expectativa de uma Selic terminal em dois dígitos, na casa de 11% ou 12%, é cedo para avaliar a atratividade para operações de carry trade, dado que ainda é preciso saber o tamanho e o ritmo de aperto monetário nos EUA.

No front político, a expectativa é pela votação ainda hoje da parte da PEC dos Precatórios alterada pelo Senado no plenário da Câmara. Um dos temas em questão é a vigência do limite para pagamento das sentenças judiciais. O Senado limitou o pagamento de precatórios até 2026, e não mais até 2036, como havia sido inicialmente aprovado pelos Deputados.

O Broadcast apurou com fontes que líderes da Câmara fecharam uma negociação para retirar a data, em uma estratégia para enviar o texto direto para promulgação, garantindo um espaço fiscal de mais R$ 43,8 bilhões no Orçamento de 2022, além dos R$ 62,2 bilhões já garantidos com a mudança no cálculo do teto de gastos.

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