No último pregão antes do primeiro turno da eleição presidencial, especulações em torno da condução da política econômica a partir de 2023 agitaram o mercado doméstico de câmbio. Notícia da revista <i>Veja</i> dando conta de que o ex-presidente do BC Henrique Meirelles é nome certo na equipe econômica de um eventual governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez o real encontrar forças para se descolar, em boa parte da segunda etapa de negócios, da tendência de depreciação de divisas emergentes e de países exportadores de commodities.
Após uma manhã de muita volatilidade, em meio à assimilação de dados da economia americana e à disputa técnica pela formação da taxa Ptax, o dólar operava no início da tarde acima de R$ 5,41, quando a informação sobre Meirelles começou a circular nas mesas de operação. Foi a senha para uma onda vendedora que levou rapidamente a moeda a perder cerca de nove centavos e descer até a mínima de R$ 5,3291 (-1,23%), em sintonia com a aceleração dos ganhos do Ibovespa, que superou os 110 mil pontos.
Ao Broadcast Político (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), Meirelles negou que já tenha sido convidado para assumir o Ministério da Fazenda em novo governo Lula, caso o petista vença o pleito. "Não conversamos ainda. Portanto, não recebi convite", disse.
Além do pregão desta sexta-feira, o real também havia se descolado do mau humor externo no último dia 19, justamente quando Meirelles declarou seu apoio formal a Lula em evento.
Com o aprofundamento das perdas das bolsas americanas e a negativa de Meirelles, o dólar foi se afastando das mínimas e, nos últimos minutos da sessão, chegou a tocar pontualmente terreno positivo. No fim do dia, era cotado a R$ 5,3946, com variação de apenas -0,02%. Assim, a divisa acumulou alta de 2,78% na semana e de 3,71% em setembro. No ano, porém, o dólar ainda recua 3,25% – o que faz do real, ao lado do peso mexicano, o principal destaque entre as divisas globais em um período marcado por fortalecimento generalizado da moeda americana.
"A cautela com as eleições e o fechamento do mês, com a disputa da ptax, trouxeram mais volatilidade para o câmbio", afirma a economista Cristiane Quartaroli, do Banco Ourinvest, em referência a formação da última taxa ptax de setembro e do terceiro trimestre, que vai servir para liquidação de contratos derivativos e confecção de balanços corporativos.
O sócio e head de câmbio da Nexgen Capital, Felipe Izac, também viu grande influência técnica sobre a dinâmica da taxa de câmbio, sobretudo até a formação da Ptax, no início da tarde. Em seguida, o mercado aproveitou a notícia sobre Meirelles para vender dólares, apoiado na perspectiva de menor risco fiscal, já que o ex-ministro é conhecido defensor do controle das contas públicas. "Mas o comportamento do dólar na semana esteve muito mais ligado a fatores externos, como a expectativa para novas altas da taxa de juros americana", afirma.
"Vimos hoje o efeito positivo em torno do nome de Meirelles, que já havia acontecido antes quando ele declarou apoio formal ao petista", afirma Gabriel Cunha, especialista em mercados internacionais do C6 Bank, ressaltando que a moeda americana subiu contra a maioria das divisas nesta sexta-feira, em especial a de exportadores de commodities.
Pela manhã, além da disputa em torno da taxa ptax, o mercado assimilou dados da economia americana e as expectativas para a extensão do aperto monetário nos Estados Unidos. Medida de inflação preferida pelo Federal Reserve, o índice de preços de gastos com consumo (PCE, na sigla em inglês) subiu 0,3% em agosto ante julho. O núcleo, que exclui itens voláteis como alimentos e energia, avançou 0,6%, acima do esperado (0,5%). Na comparação anual, o PCE subiu 6,2% em agosto e seu núcleo aumentou 4,9%. Os gastos do consumo subiram 0,4% em agosto, superando as expectativas (0,3%).
"O PCE mostrou que a inflação continua pressionada. Os dirigentes do Fed têm mantido a posição de que vão subir os juros até o nível necessário para controlar a inflação. A taxa terminal do ciclo de aperto pode ficar próxima de 5% ou até acima disso. Há temor de recessão nos Estados Unidos", diz Izac, da Nexgen Capital.
Lá fora, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – operou entre leve queda e estabilidade na maior parte do dia, em nova rodada de recuperação da libra. Mesmo assim, o DXY segue em níveis elevados, ao redor dos 112,000 pontos.