Uma deterioração dos mercados acionários aqui e lá fora ao longo da tarde, em meio à falta de avanço na terceira rodada das negociações entre Rússia e Ucrânia e ao eventual banimento do petróleo russo pelo Ocidente, fez com que o dólar apagasse as perdas mais fortes observadas pela manhã e encerrasse a sessão desta segunda-feira, 7, praticamente estável. Os debates dentro do governo em torno de medidas para segurar os preços dos combustíveis, que contribuíram para a derrocada do Ibovespa à tarde, não tiveram papel relevante na formação da taxa de câmbio, mas acabaram respingando no dólar futuro quando o mercado à vista já estava fechado.
Em dia marcado por alta generalizada da moeda americana no exterior, o fato de o dólar ter ficado no zero a zero por aqui mostra a resiliência do real, atribuída por analistas à atração de capitais para operações de carry trade e aos preços das commodities, em razão dos gargalos de ofertas provocado pela guerra. As cotações internacionais do petróleo voltaram a disparar, tendo o contrato futuro do Brent para maio se aproximado de US$ 140, para depois se acomodar na casa de US$ 120,00, fechando a US$ 123,21 (+4,32%). No fim da tarde, a Casa Branca informou que o presidente dos EUA, Joe Biden, não havia tomada sobre possível embargo ao petróleo russo.
A onda inflacionária vinda de fora reforça as expectativas de que a taxa Selic possa atingir o patamar de 13%, ao mesmo tempo em que se espera uma postura gradualista dos Bancos Centrais desenvolvidos, em especial do Federal Reserve – combinação que mantém um diferencial entre juros internos e externos muito elevado, dando sustentação ao real.
Apesar de todo o mau humor e volatilidade no exterior, o dólar por aqui oscilou apenas cerca de seis centavos entre a mínima R$ 5,0308 e a máxima R$ 5,0980. No fim da sessão, era cotado a R$ 5,0797 (+0,03%). Em março, a moeda já acumula desvalorização de 1,47%. Em 2022, perde 8,90%.
O economista-chefe da Western Asset, Adauto Lima, vê a taxa de câmbio doméstica sob forças opostas. De um lado, o ambiente internacional de aversão ao risco, que empurra o dólar globalmente para cima. Do outro, commodities em preços elevados (que tendem a se traduzir em mais entrada de dólares via exportações) e juros domésticos muito atraentes.
"Essa questão dos juros e das commodities, ajudada também pelo maior crescimento da China, vem se sobrepondo à aversão ao risco e determinando a taxa de câmbio no curto prazo", diz Lima, acrescentando que o real pode se beneficiar também de uma realocação entre emergentes de recursos antes alocados em ativos russos. "Mas esse equilíbrio é bem instável. Se a crise continuar e houve risco de retração global, a moeda pode se depreciar".
Lima também chama a atenção também para sinais de deterioração dos fundamentos domésticos, dado o impacto fiscal de eventuais medidas do governo para tentar conter os preços dos combustíveis no mercado interno, a despeito da escalada do petróleo lá fora. Por ora, diz o economista, tanto a aversão global ao risco quanto a possibilidade de piora das contas públicas estão refletidas no mercado de juros futuros, enquanto o real segue preservado. "Os fundamentos podem começar a deteriorar de novo de forma acelerada. E isso pode atingir o câmbio. Não podemos contar apenas com fluxo, porque é algo que não se consegue projetar", diz.
O presidente Jair Bolsonaro voltou a criticar a gestão da Petrobras, que alinha os preços do óleo no mercado doméstico à cotação internacional do petróleo, dizendo que isso "não pode continuar". Segundo apuração do Broadcast, os ministro Paulo Guedes (Economia) e Ciro Nogueira (Casa Civil), além da técnicas do governo, teriam se reunido hoje no Palácio do Planalto para tratar do tema. Fontes da equipe econômica ouvidas pelo Broadcast disseram que, mesmo que se encontra receita para subsídio aos combustíveis, não há espaço no orçamento que abrigue as despesa necessárias para segurar os preços da gasolina e do diesel.
Uma das propostas que estaria na mesa seria o congelamento temporário dos preços dos combustíveis pela Petrobras, justificado pela excepcionalidade da guerra, e bancado integralmente pela empresa. Fontes também disseram que, caso os gastos com subsídios para manter os preços congelados fossem assumidos pelo Tesouro, o dólar iria para R$ 5,70. Com o mercado à vista já fechado, o dólar futuro para abril acelerou o ritmo de alta para a casa de R$ 5,14, diante da possibilidade de congelamento, enquanto o Ibovespa aprofundou as perdas.