Após furar o piso de R$ 5,00 pela manhã desta quinta, 2, e descer até R$ 4,9408 (-2,36%) na mínima, o dólar reduziu bastante o ritmo de queda ao longo da tarde e encerrou a sessão desta quinta-feira, 2, em baixa de 0,30%, cotado a R$ 5,0454, perto da máxima da sessão (R$ 5,0509). Principal termômetro do apetite por negócios, o contrato de dólar futuro para março apresentou giro expressivo, movimentando mais de US$ 16 bilhões. Isso sugere que pode ter havido desmonte relevante de posições defensivas, em especial na primeira etapa de negócios.
Operadores atribuíram a perda de fôlego do real a movimentos de ajuste e realização de lucros intraday, estimulados pela aceleração dos ganhos da moeda americana ao longo da tarde, em especial na comparação com o euro e a libra esterlina. Houve também algum ruído político, com nova crítica do presidente Lula ao teto de gastos, o que não constitui novidade, mas reforça a desconfiança com a política fiscal.
Lá fora, o Banco Central Europeu (BCE) anunciou hoje elevação dos juros em 50 pontos-base e acenou com nova alta de igual magnitude em março, mas, segundo analistas, abriu a porta para uma pausa no processo de aperto em seguida. As divisas emergentes, que surfaram ontem a decisão do Federal Reserve, ensaiaram subir pela manhã, mas acabaram em baixa com o tombo das commodities. As exceções foram o peso chileno e o real, além da lira turca.
Ontem, o Banco Central dos EUA, como esperado, desacelerou o ritmo de alta de juros ao anunciar elevação dos Fed Funds em 25 pontos-base, para a faixa entre 4,50% e 4,75%. Fala do chairman Jerome Powell sobre sinais de desinflação na economia americana estimularam apostas de que o aperto monetário não vai tão longe. Mais: levaram a chance de corte de juros ainda neste ano a superar 60%, segundo monitoramento do CME Group.
O ponto central que fez a moeda brasileira se destacar entre pares hoje foi a perspectiva de manutenção de um diferencial de juros interno e externo em níveis elevados, após o Comitê de Política Monetária (Copom) sinalizar que pode manter a taxa Selic congelada em 13,75% por mais tempo. No que foi interpretado como recado duro ao governo Lula, que recentemente teceu críticas a atuação do BC, o colegiado dedicou um parágrafo de seu comunicado para salientar que a "incerteza no campo fiscal" eleva "o custo de desinflação". Em um cenário alternativo, em que a Selic segue inalterada no chamado horizonte relevante da política monetária (que abrange 2024), o IPCA caminharia para a meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
"O BC foi enfático ao mostrar preocupação com a questão fiscal. A Selic pode ficar em 13,75% por tempo prolongado e isso levou a queda do dólar aqui, porque garante taxa de juros mais atrativa", afirma a economista Cristiane Quartaroli, do Banco Ourinvest, ressaltando que é cedo para falar em tendência mais forte de apreciação do real, uma vez que ainda há muito "ruído político" e dúvidas sobre a política fiscal.
"O BC desta vez foi bastante duro na comunicação e mostrou que parte fiscal precisa colaborar para que comece a cortar juros ainda em 2023. E juros mais altos levam o real a se valorizar", afirma o economista-chefe de RPS Capital, Victor Candido, observando que houve também o "vento positivo" vindo de fora com a postura mais amena do Fed.
Em mensagem presidencial no início do ano legislativo, o presidente Lula voltou a criticar o teto de gastos e afirmou que o governo vai "construir um novo regime fiscal para o Brasil", com regras que "assegurem previsibilidade e credibilidade". Ele disse que a proposta será submetida ao Congresso "ainda no primeiro semestre".