Estadão

Dólar sobe 0,93% com fuga de ativos de risco provocada por caso Evergrande

Os negócios no mercado doméstico de câmbio foram pautados nesta segunda-feira, 20, pela onda de liquidação de ativos de risco deflagrada pela crise de solvência da incorporadora chinesa Evergrande, que reascendeu temores de risco sistêmico no mercado financeiro global e de desaceleração mais aguda da economia do gigante asiático.

Em movimento típico de fuga para a qualidade, investidores liquidaram posições em mercados acionários e correram para o abrigo do dólar e dos Treasuries – as taxas da T-note de 10 anos chegaram a cair mais de 4,5%. As divisas emergentes e de países exportadores de commodities – cujos preços despencaram – caíram em bloco em relação à moda americana. O real, por questões técnicas do nosso mercado e já fragilizado pelos problemas locais, foi quem mais apanhou.

Já em alta desde o início dos negócios, o dólar à vista operou sempre na casa de R$ 5,30 e renovou máximas ao longo da tarde, em linha com a deterioração do ambiente externo. Operadores notaram movimento de ordens de "stop loss" (limitação de perdas) e de montagem de posições defensivas assim que o dólar rompeu R$ 5,36, o que fez a moeda americana correr até a máxima de R$ R$ 5,3772 (+1,80%).

Com arrefecimento da aversão ao risco na reta final do pregão, em linha com a moderação das perdas das Bolsas americanas, o dólar encerrou em alta de 0,93%, a R$ 5,3312 – maior valor de fechamento desde 23 de agosto (R$ 5,3820). À época, o mercado se ressentia do aguçamento da crise institucional, após o presidente Jair Bolsonaro pedir impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, questionar o voto eletrônico e atacar governadores.

O Credit Default Swap (CDS) de 5 anos do Brasil – derivativo que protege contra calotes e serve termômetro do risco-país – subiu de 180,14 pontos, no fechamento de sexta-feira (17), para 198,76, segundo dados da IHS Markit. A última vez que o CDS havia trabalhado na casa de 190 pontos foi em 20 de agosto.

Em relatório, os estrategistas de mercados do Brown Brothers Harriman (BBH) Win Thin e Ilan Solot, em Londres, afirmam que a "saga da Evergrande" aumenta os temores em torno do sistema financeiro chinês e de uma contaminação mais ampla dos mercados financeiros.

"Esperamos firmemente uma forte intervenção do governo Chinês. Se evitará uma crise como o subprime nos EUA, é impossível responder neste momento", escrevem os estrategistas. "Mas a boa notícia é que investidores e reguladores estavam cientes da situação há muito tempo. Agora, é hora de definir o que grande demais para falir realmente significa na China."

A onda de aversão a ativos de risco vem justamente na semana que abrigará a "Super Quarta" (dia 22), com decisões de política monetária aqui e nos Estados Unidos – o que reforça a cautela no mercado doméstico de câmbio. Além de os integrantes do Fed atualizarem suas projeções para o momento em que os juros serão elevados, o BC americano pode anunciar quando pretende iniciar a redução de compra mensal de bônus (tapering).

Para o economista-chefe e sócio da JF Trust, Eduardo Velho, é provável que o Fed sinalize o início da retirada de estímulos no fim do ano (novembro ou dezembro) ou até mesmo no começo de 2022, uma vez que os resultados recentes do payroll, inflação e a variante Delta confortam a ala dovish do Fed. "A despeito do aumento das vendas do varejo, Fed deve estar preocupado com os reflexos da desaceleração chinesa sobre os mercados globais", afirma Velho, em relatório.

Em relação ao comportamento do dólar no Brasil, Velho avalia que o efeito da crise imobiliária na China deve abalar os preços das commodities, sustentando o dólar acima da casa de R$ 5,20, que vê como suporte para a taxa de câmbio.

Por aqui, investidores acompanham as negociações em torno da questão dos precatórios. Fontes ouvidas pelo Broadcast afirmaram que o ministro da Economia, Paulo Guedes, desistiu de acompanhar a comitiva presidencial na assembleia da ONU em Nova York para negociar uma solução para as dívidas judiciais.

Hoje à tarde, o presidente da Câmara, Artur Lira (PP-AL), confirmou que se encontrará na noite desta segunda-feira com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para falar do pagamento dos precatórios. "É importante que a gente ache uma saída rápida para esse assunto porque ele vai impactar em muitos outros assuntos, inclusive no Auxílio Brasil", afirmou.

Lira também disse que pretende avançar na reforma administrativa. O relator da reforma, deputado Arthur Maia (DEM-BA), deve protocolar um novo texto para ser apreciado esta semana, já que a primeira versão foi criticada por trazer privilégios a categorias da base do governo.

"A vitória do governo na PEC da despesa dos precatórios não é garantida, o que mantém o risco fiscal do descumprimento do teto dos gastos no radar. Além disso, a taxação dos dividendos pode ser reduzida no Senado, o que tira mais receita fiscal de 2022.", afirma Velho, da JF Trust, acrescentando que a votação da reforma administrativa pode ser um teste para balizar a disposição para a "austeridade fiscal".

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