O dólar à vista encerrou a sessão desta quinta-feira, 31, em alta de 1,68%, cotado a R$ 4,9511 com máxima a R$ 4,9601 pela manhã. À onda de valorização da moeda norte-americana no exterior, em especial em relação a divisas emergentes, somou-se o aumento da percepção de risco fiscal em dia de apresentação do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024.
Analistas comentam que é grande o ceticismo no mercado financeiro em torno da possibilidade de o governo cumprir a meta de zerar o déficit primário no ano que vem, dada a necessidade de ampliar a receita bruta em R$ 168 bilhões, segundo estimativas oficiais.
Operadores notam que houve fatores técnicos que ajudaram a turbinar o dólar nesta quinta, como a disputa pela formação da última taxa ptax de agosto, pela manhã e início da tarde, e a rolagem de posições no segmento futuro na virada do mês. O contrato de dólar futuro para outubro apresentou giro forte, movimentando mais de US$ 18 bilhões. Com a arrancada nesta quinta, o dólar à vista sobe 1,55% na semana e 4,69% em agosto. No ano, a divisa ainda perde 6,23%.
Lá fora, os principais pares do real, à exceção do peso colombiano, também apresentaram perdas em relação ao dólar. Peso mexicano recuava mais de 1,80% no fim da tarde, ao passo que o peso chileno tinha baixa mais modesta, ao redor de 0,20%.
Termômetro do comportamento do dólar frente a uma cesta de seis moedas fortes, o índice DXY operou em alta firme, e voltou a superar os 103, 500 pontos, em meio ao enfraquecimento do euro. Em sua ata, o Banco Central Europeu (BCE) deixou a porta aberta para eventual pausa no aperto monetário em setembro. Nos EUA, tanto o índice de preços de gastos com consumo (PCE) quanto seu núcleo vieram em linha com o esperado, revelando aceleração da inflação na comparação anual. Já o índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) industrial superou as expectativas.
"Hoje foi um dia de dólar forte no mundo mesmo. Foi mais o mercado de juros no Brasil que voltou a sofrer com as preocupações fiscais", afirma o diretor de investimentos da Alphatree Capital, Rodrigo Jolig, que ainda mantém uma visão construtiva para a moeda brasileira. "As taxas dos Treasuries estão caindo e as bolsas americanas seguem fortes. O ambiente de risco me parece ok. Obviamente estou um pouco mais cauteloso. Se o mercado resolver ficar pessimista mesmo com o fiscal, tudo pode piorar, inclusive o real."
Nas mesas de operações, pairam dúvidas sobre a capacidade do governo de zerar o déficit em 2024, uma vez que não há perspectiva de cortes de gastos. Na quarta-feira, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto que prorroga a desoneração da folha de pagamentos e reduz a contribuição previdenciária de municípios, o que tende a drenar alguns bilhões dos cofres públicos. De outro lado, o Senado aprovou a volta do voto de qualidade no âmbito do Carf, uma das principais apostas da Fazenda para ampliar a arrecadação.
"O mercado local tem incorporado aos preços dos ativos a percepção de maior risco fiscal, tendo em vista as dificuldades do governo em ajustar receitas e despesas a fim de entregar déficit primário nulo em 2024 ou, pelo menos, sinalizar trajetória mais benigna para as contas públicas", afirma o economista-chefe do Banco Pine, Cristiano Oliveira.
Em apresentação do PLOA à tarde, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que o potencial de arrecadação com o projeto de lei do Carf é "muito maior do que o mercado estima". Na quarta, o <i>Broadcast</i> (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) mostrou que o PL do Carf traria receitas adicionais de R$ 54,7 bilhões em 2024, um terço do necessário para zerar o déficit no ano que vem.
A ministra do Planejamento, Simone Tebet, esclareceu que as medidas para arrecadar R$ 168 bilhões em 2023 consideram também receitas compartilhadas com Estados e municípios. A parcela do governo federal é de R$ 124 bilhões, próximo do ventilado inicialmente pela Fazenda. "Não houve aumento de despesas por parte da União. Para garantir os gastos públicos igualmente a 2023, eu preciso de R$ 124 bilhões", afirmou.