O PSOL do Rio entrou em crise após um candidato a vereador do partido em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, receber, de pessoas ligadas ao setor financeiro, doações para sua candidatura. Wesley Teixeira é um jovem negro de 24 anos, evangélico e "anticapitalista" que trabalha como educador popular no município de 924 mil habitantes.
Nascido e criado no Morro do Sapo, ele recebeu contribuições do economista Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central no governo FHC; do cineasta João Moreira Salles, que integra o conselho administrativo do Itaú Unibanco; e da escritora Beatriz Bracher, também ligada ao Itaú. Os três aportaram recursos que somam R$ 75 mil.
Para setores mais radicais da legenda, especificamente o grupo Insurgência, Wesley deveria devolver o dinheiro ou desistir de concorrer pelo partido. Isso porque, segundo essa ala, o estatuto da sigla é claro ao proibir doações diretas ou indiretas de "empresas multinacionais, empreiteiras e bancos ou instituições financeiras nacionais e/ou estrangeiros." Ele se recusou a acatar as orientações. Anunciou, inclusive, que não integrará mais o grupo interno do qual fez parte por seis anos. Líderes do partido, como o deputado federal Marcelo Freixo, principal quadro da legenda, saíram em defesa de Wesley.
Militante antirracista numa região em que a esquerda é quase nula e na qual a política tem histórico clientelista, Wesley teve a candidatura apoiada por Sueli Carneiro, diretora do Geledés – Instituto da Mulher Negra, e por Pedro Abramovay, presidente da Open Society para a América Latina. Surgiu de Abramovay a ideia de apresentar o caxiense a intelectuais milionários que se preocupam com a situação política do País.
"O Pedro é uma pessoa que eu valorizo muito, e ele sugeriu que valeria conhecer o Wesley. Tivemos uma ótima e longa conversa com ele", contou Armínio ao Estadão. "É um cara jovem, com trajetória de vida muito relevante e marcante. E foca em temas importantes: racismo, violência, política."
Questionado sobre as posições "anticapitalistas" do candidato, o ex-presidente do Banco Central, que atualmente comanda a Gávea Investimentos, disse que as visões do jovem sobre regimes políticos são irrelevantes no momento. Afinal, disse, o cargo de vereador não lhe daria atribuições voltadas para a macroeconomia.
Armínio afirmou ainda que não vai comentar as intrigas internas do PSOL, já que não tem nenhuma relação com o partido. "Eu apoio o Wesley na direção que ele resolver tomar."
Enquanto doou R$ 30 mil para o candidato do PSOL de Caxias, o economista deu também R$ 25 mil para um candidato a vereador pelo Novo na capital fluminense. O partido ultraliberal está no lado oposto ao do PSOL no espectro político.
Em nota divulgada após a repercussão do caso, Wesley endossou a versão contada por Armínio e explicou que não houve nenhum tipo de acordo ou contrapartida exigida em troca do dinheiro. "(…) e para entender esta doação é preciso lembrar que vivemos um período iniciado em 2016 com um acordo com o Supremo e com tudo cruel de ameaça a direitos básicos e aumento da violência contra os mais pobres", escreveu, lembrando também a morte da vereadora Marielle Franco e a eleição de Jair Bolsonaro presidente.
"Por isso, neste período tão ameaçador que vivemos, algumas pessoas que contribuíram para a retirada de direitos e para a ascensão do governo de morte que temos hoje passam a temê-lo", assinalou.
Outro ponto abordado por ele foi a discrepância de recursos entre brancos e negros. Com os milhares recebidos da elite, disse, poderá investir em um mandato com base nos seus valores.
"É por isso que este dinheiro será usado em uma campanha de afirmação da vida, de ocupação preta para chegar na Câmara Municipal de Duque de Caxias e combater a política de morte das mesmas famílias que governam esta cidade, para eleger um mandato comprometido com os movimentos sociais, com controle e participação popular, para pensar uma cidade para se viver e não para o lucro."
O <b>Estadão</b> não conseguiu contato com a direção do PSOL no Rio e com o grupo Insurgência para comentar a polêmica.