Sabotage não tinha medo de sorrir. A cara feia poderia surgir, às vezes, mas não era a marca registrada. Morto a tiros aos 30 anos, em 24 de janeiro de 2003, o rapper paulistano deixou apenas um disco gravado (O Rap É Compromisso), e uma sensação de que poderia ter sido muito mais. O documentário Sabotage: O Maestro do Canão, que terá pré-estreia nos dias 23 e 24 deste mês, sexta e sábado, quando o assassinato completa 12 anos, exerce a função de trazer um novo olhar para a vida curta e explosiva daquele que foi uma das personalidades mais visionárias da cultura hip-hop no País, justamente por não temer as câmeras.
O ano era 2002. Ivan 13P deixou a favela do Canão, na zona sul de São Paulo, embasbacado pela história contada por Mauro Mateus dos Santos, apelidado de Sabotage pelo irmão, por atrapalhar as brincadeiras quando criança. O diretor entrevistara o rapper para o documentário Favela no Ar, uma coprodução ao lado de duas empresas europeias na qual outras figuras do rap nacional, como KLJay, RZO, Xis, Afro-X, assim como Sabotage, falavam sobre suas experiências e os reflexos do ambiente no qual viviam em suas músicas. O documentário, atualmente, é considerado como responsável por marcar a disseminação da cultura hip-hop.
A trajetória de Maurinho, como Sabotage era chamado pelas vielas do Canhão, era viva demais para ser resumida em um documentário ao lado de outros rappers. Ivan queria mais. “Tínhamos muito material sobre o Sabota, mas não conseguiríamos colocar tudo no Favela no Ar. Poderíamos fazer algo só com ele”, relembra o diretor, dono da 13 Produções. Cinco meses após a entrevista, ao deixar a mulher, Dalva, no ponto de ônibus para ir trabalhar, Sabotage é abordado. Quatro tiros arrancam a vida de suas veias. Sobrou a história a ser contada. “O material que tínhamos merecia ser contado.”
Ao longo dos anos, Ivan se encontrou com outros nomes do hip-hop, amigos e companheiros de vida de Sabotage para realizar O Maestro do Canão. A cada dois meses, em média, levava a câmera para fazer alguma outra entrevista. Em 2010, já estava com um corte do longa-metragem, pronto para ser colocado em circuito. “Mas era um filme só de rapper falando sobre ele. Senti a necessidade de ter algo mais abrangente”, conta o diretor.
Foi quando Wanderson Sabotinha, filho de Sabotage, colocou Ivan em contato com Denis Feijão, diretor-presidente da Elixir Entretenimento. Denis havia produzido Marighella e estava finalizando Raul – O Início, o Fim e o Meio, dirigido por Walter Carvalho. “Conheci o Sabotinha por intermédio do ator Daniel de Oliveira e pensei em fazer um filme sobre o Sabotage. Ele me falou do Ivan e deu uma liga, cara”, diz Denis.
O filme é uma coprodução entre a 13 Produções e a Elixir Entretenimento. Depois da pré-estreia no Auditório Ibirapuera, o longa-metragem será exibido em todos os cinemas da rede Itaú Cultural, com entrada gratuita.
Foi iniciado um novo trabalho para aumentar a amplitude do documentário – uma marca das próprias rimas de Sabotage. Chegaram as entrevistas de figuras fora da cena do rap, como Hector Babenco, diretor de Carandiru (2003), filme no qual Sabotage não apenas atuou como trabalhou como um consultor sobre o local, que ele frequentou durante o período no qual um dos seus irmãos esteve preso por lá. “Assistir ao Babenco falando sobre o Sabotage, cheio de carinho, é incrível”, diz Ivan 13P. “O Sabota era um cara agregador, fazia as pessoas se aglutinarem e escutarem, com respeito, o que ele tinha a dizer”, conclui o diretor.
O próprio Sabotage esteve envolvido com o crime e tráfico de drogas, mas a passagem recebe pouco tratamento em O Maestro do Canão, cujo intuito, como conta o diretor Ivan 13P, é homenagear o rapper que ele foi, com rima rápida, afiada e com uma capacidade rítmica invejável. “Muita gente me pergunta sobre o (período no) tráfico e sobre a morte dele, mas essa não era a minha intenção. Isso é assunto policial”, explica. “Queríamos registrar essa parte artística e cultural.” O produtor Denis Feijão completa: “Quem conhece o Sabotage, vai celebrar o cara. Vai resgatar a memória e o legado dele. Quem não conhece, vai se familiarizar mais com ele. O seu legado vai ser passado adiante”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.