Para a dança, é relevante que uma empresa do porte da O Boticário a ela associe a sua marca, com duas ações: um festival anual, e uma plataforma de financiamento, que contemplou 40 projetos em 2014. O festival aconteceu em São Paulo e Rio de Janeiro e, além dos espetáculos, com ingressos entre R$ 60 e R$ 5 no Rio, e R$ 20 e R$ 10 em São Paulo, ofereceu workshops gratuitos nas duas cidades.
A programação da terceira edição do Festival O Boticário na Dança reuniu cias estrangeiras e brasileiras (escolhidas entre as que a empresa financia) e não foi a mesma nas duas cidades: a cia de Antonio Nóbrega e o Grupo Raça não se apresentaram no Rio, e o Balé da Cidade de São Paulo não dançou no Auditório do Ibirapuera.
A formato escolhido enquadra-se no modelo habitual desse tipo de evento. O que diferencia cada um dos que o adotam é a programação, que define o perfil com que se comunicam. Curiosamente, a informação de quem a assina não consta do programa, distribuído gratuitamente. Ela confirma uma vocação para os espetáculos voltados para o que antigamente se chamava de “grande público”, formado, neste caso, pelos que habitualmente não frequentam o dia a dia da dança. Poderia, com o seu alto potencial de abrangência, contribuir para o aumento de frequentadores, mas, infelizmente, as estatísticas confirmam que isso não ocorre. Quem sabe, ainda seja possível esperar que uma iniciativa importante como esta consiga, quando discute a sua missão, fazer desta uma meta, mas escapando do que até agora vem sendo praticado.
O destaque deste ano foi a dupla Israel Galván & Akram Khan, duas das mais luminosas estrelas em suas áreas (Galván no flamenco e Khan no khatak). Ambos sobressaem pelo trânsito entre tradição e cena contemporânea que realizam. Quem estiver precisando de uma referência do que seja precisão em cada gesto, competência na concepção do que vai ser mostrado (música, iluminação, figurino, dramaturgia, técnica), com sofisticação em cada detalhe, encontra em Torobaka, obra na qual os dois estão juntos pela primeira vez, um exemplo perfeito. Os músicos com quem dividem o palco são da mesma grandeza artística e excelência no desempenho.
Os dois outros nomes internacionais, Cullberg Ballet e Michael Clark Company, vivem hoje da nostalgia do que foram. Perderam os postos que já ocuparam e o que nos mostraram confirma porque isso aconteceu. A força das misturas de Clark enfraqueceu junto com o punk, e a singularidade do que Mats Ek construiu no Cullberg não encontrou descendência depois do seu afastamento da companhia. Os atuais interesses do escocês Clark estetizam formas vazias de ideias, e a companhia sueca tornou-se mais uma entre as que vivem da produção de coreógrafos convidados, marcada pela irregularidade da sua “carteira de nomes”.
Com relação à Cia. Antonio Nóbrega de Dança, a grande notícia é que ela continua existindo. Sua nova produção, Pai, criada em três meses, ainda pede tempo para amalgamar os materiais que reuniu para chegar onde pode. A nova proposta (buscar o lugar do pai na cultura brasileira) já valida a iniciativa. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.