Cidades

Eles moram em áreas de risco, perdem tudo, mas não deixam suas casas

Cada vez que o céu escure e começa a trovejar, algumas centenas de moradores de Guarulhos se preparam para o pior e para reviver uma cena que se arrasta há anos: o alagamento de suas casas que foram construídas em locais impróprios, em áreas de risco, muitas vezes em cima de córregos ou muito próximos deles. É o caso dos moradores da Rua Marcelo Francisco, na Vila Barros, que reclamam de grandes prejuízos causados pela invasão de água nos imóveis, no último dia 2 de março, após as fortes chuvas que atingiram Guarulhos.  
 
De acordo com a dona de casa Célia Santos de Santana, a água chegou a altura de 1,70 m em sua residência. "Perdi sofá, geladeira, fogão, armário, cama… Acredito que tenha ido uns R$ 8 mil para o lixo", contou ao mostrar a foto de um caminhão levando suas coisas embora. No fim da tarde da última terça-feira, quando mais um temporal desabou sobre a cidade, ela foi surpreendida com a visita do prefeito Guti, que esteve no local para verificar o drama que as famílias ali vivem.
 
Durante o Carnaval, Guti colocou uma força-tarefa que atua em bairros atingidos pelas chuvas, formadas por diferentes secretarias para atender não só a população da Vila Barros, mas de pelo menos outras dez regiões afetadas. “O poder público não se exime, mas são problemas que se acumulam há anos. Não há solução imediata. Atuamos rápido para minimizar o sofrimento urgente e trabalhamos para encontrar saídas que sejam definitivas”, explicou Guti ao GuarulhosWeb.
 
Vizinha de Célia, Luana Arcanjo Souza também contabiliza um prejuízo na casa dos R$ 7 mil. No terreno onde fica a sua casa, há mais dois imóveis. Um deles, segundo ela, era ocupado por seu tio há 40 anos. No entanto, por causa das enchentes, ele deixou o local para morar com seu filho, depois de perder praticamente tudo, inclusive roupas.
 
"Nós deixamos três bombas ligadas dia e noite aqui porque, desde o sábado retrasado, a água não para de entrar em casa. Além da energia, gastamos com gasolina para abastecê-las. Só em uma madrugada, gastamos R$ 115 de combustível. Estamos atrasando algumas contas para bombear a água para fora. Perdemos muitas coisas. A cama em que estou dormindo foi doada pela igreja. Não tem nem como preparar comida. Às vezes, as pessoas se solidarizam e trazem o almoço pronto", relatou Luana, que, a exemplo de Célia, afirma que o problema foi causado por uma ocupação irregular na Rua Cândida Rodrigues Barbosa, que fica atrás da Rua Marcelo Francisco.
 
"Os barracos foram montados há sete meses, mas só agora com as fortes chuvas que caíram, sofremos com este problema de a água passar por cima dos muros e invadir nossas casas", disse Luana. Ainda segundo ela, não há recolhimento de lixo na Rua Cândida Rodrigues Barbosa, pois os caminhões não conseguem trafegar pela via.
 
Outro morador da Rua Marcelo Francisco, o motoqueiro Wilson Vinicius também reclamou de perdas materiais. "Até meu carro foi danificado. Também fiquei sem a máquina de lavar", lamentou. Já a dona de casa Jenifer Santos de Jesus, que mora com duas crianças e uma mulher de 31 anos com deficiência mental, perdeu roupas, cama e outros móveis. "Ainda tem o cheiro de mofo que é insuportável", ressaltou.
 
Enxugando gelo
Questionada pelo GuarulhosWeb, a Defesa Civil confirmou que o local em questão se trata de um ponto concentrador de águas com residências sobre a canalização, ou seja, casas construídas em local inapropriado. Desta forma, por mais que as ações das autoridades aconteçam, os problemas voltam a ocorrer.
 
O órgão destacou que mapeia as áreas de vulnerabilidade ambiental e realiza ações de prevenção a desastres naturais e tecnológicos antes do período das chuvas. "Assim que o verão acaba, as forças-tarefas de prevenção iniciam uma nova preparação da cidade para o fim do ano", afirmou.
 
Ainda de acordo com a Defesa Civil, os agentes executam o acompanhamento de riscos nos bairros mapeados e, em parceria com a população, compreende os problemas e riscos locais para minimizar possíveis transtornos, solicitando a limpeza de bueiros, vias e córregos, vistoria de construções, cadastramento em programas habitacionais e sociais, entre outros. “Durante as visitas dos agentes, os moradores recebem orientações sobre como evitar acidentes em situações de risco e acionar o órgão responsável”.
 
Não faltam locais com problemas crônicos
Mas os problemas de alagamentos não se concentram apenas na Vila Barros. A dona de casa Aline Silva Barbosa mora há 27 anos na Rua Maria Paula Motta, antiga Rua 100, no Jardim Presidente Dutra, ao lado do Centro de Educação Unificado (CEU), e afirmou que as enchentes são constantes na via.
 
“Quando chove aqui, parece um rio. A água chega à altura do joelho. Nas vielas, chega a 1,40 m. As pessoas perdem tudo e depois jogam na rua. Fica cheia de entulho. Por isto, enche sempre. O Rio Baquirivu está sujo constantemente”, afirmou. 
 
Procurada pela reportagem, a Defesa Civil confirmou que os alagamentos no Presidente Dutra são ocasionados pelo do nível da água do Rio Baquirivu-Guaçu.
 
Já na Vila Flórida, mais especificamente na Viela Boni, entre as Ruas Hungria e Arminda Maurus, há construções sobre um córrego. Isto também provoca alagamentos na região, segundo um morador que não quis se identificar. “Até construí um murinho para impedir que a água entrasse na minha casa, mas não tem jeito. Há duas semanas choveu forte aqui e ficou tudo inundado. O córrego transbordou. Perdi roupa, colchão, cobertor, máquina de lavar e outras coisas. Só consegui salvar o freezer, porque quando começa a chover, eu já o desligo e tiro do lugar”, contou.
 
Orientações em casos de alagamento
A Defesa Civil disse que, em casos de enchentes, o órgão orienta primeiramente comunicar o problema pelo 199 para que profissionais se dirijam até o local. Em seguida, é preciso ter atenção à situação de risco para caminhantes a partir do momento em que a água ultrapassa a altura da canela.
 
"Neste caso, o indivíduo deve se manter parado até que consiga subir em um lugar alto e aguardar chegada do socorro. Na situação de motoristas, se a inundação alcançar metade da altura do pneu do automóvel, é preciso abandonar imediatamente o veículo. De modo algum deve-se tentar passar pela inundação. Evitar entrar nas águas, pois pode ocorrer energização de cabos elétricos caídos, buracos ou bueiros", completou.
 

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