A disparada no preço da energia desde o início do ano onerou o consumidor e não foi suficiente para evitar que as distribuidoras enfrentassem um problema de fluxo de caixa associado à chamada conta CVA. A Conta de Compensação de Variação de Valores de Itens da Parcela A (CVA) tem como objetivo compensar a elevação dos custos não gerenciáveis (parcela A) e, no processo de reajuste tarifário anual, fazer com que essa variação seja refletida nas novas tarifas. Porém, diante da trajetória ascendente dos custos, a CVA tem acumulado montantes elevados, de forma a colocar as distribuidoras na posição de financiadoras dos consumidores e vítimas de uma conta bilionária.
De acordo com o presidente da AES Eletropaulo, Britaldo Soares, o ativo regulatório a recuperar pelo setor está atualmente entre R$ 11 bilhões e R$ 12 bilhões, em termos líquidos. Esse montante será reincorporado às tarifas das distribuidoras, a partir dos reajustes anuais, porém o descasamento cronológico entre aumento de despesas e a adoção de novas tarifas provoca uma situação de desarranjo no fluxo de caixa.
“Você tem o consumidor insatisfeito, porque a tarifa praticamente dobrou, e um fluxo de caixa do setor que não está funcionando como esperado”, disse Soares. “(O setor) está precisando ser financiado a taxa de juros mais cara por conta do aumento da taxa básica de juros e do aumento do spread de risco setorial, dado que a exposição dos bancos ao setor hoje é muito maior e o risco regulatório ao longo dos anos recentes aumentou bastante”, complementou o executivo, durante o 1º Encontro dos Altos Executivos do Setor Elétrico (Enaltesse), promovido pela Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE). Os valores acumulados na conta CVA são corrigidos pela taxa básica de juros, o que implica custos ainda mais elevados para os consumidores.
Embora defenda o modelo da CVA, criada em 2001, o presidente da Eletropaulo destacou que a “sequência de desequilíbrios introduzidos” (no setor) impede que o mecanismo apresente uma situação normal de acúmulo de valores. Por isso, após ser questionado se as distribuidoras não estariam financiando os consumidores, Soares concordou com a análise. “Realmente financiamos o consumidor”, disse.
Tal situação ganha ainda mais relevância em decorrência dos problemas financeiros enfrentados pelas distribuidoras desde 2013, os quais obrigaram o setor a recorrer a empréstimos bancários bilionários. O financiamento ao setor será pago a partir de tarifas de energia mais caras.
Outro agravante é o atual momento de retração de demanda, o qual pode resultar em sobrecontratação de energia por parte das distribuidoras e riscos crescentes de perdas não técnicas e aumento de inadimplência. Na semana passada, a Eletropaulo anunciou que a demanda nas áreas de concessão da companhia deve encolher 4,5% em relação ao ano passado.
Para evitar efeito ainda maior em termos de perdas e inadimplência, a companhia tem feito um “esforço dobrado”, disse Britaldo Soares. Uma situação generalizada do setor, segundo executivos das distribuidoras. “Começamos a fazer muito mais para trazer (os indicadores) aos níveis onde esperamos que estejam”, afirmou a presidente da Neoenergia, Solange Ribeiro, também presente no evento.
Na CPFL, o controle sobre os números de perdas e inadimplência é feito a partir do trabalho de “um batalhão” de funcionários, responsáveis pelas atividades de desligamento de fornecimento, mas também de envio de SMSs aos inadimplentes e outras iniciativas. Como resultado, as empresas precisam rever os processos de forma a compensar os efeitos da parcela A. “Para combater o aumento da parcela A, estamos utilizando a parcela B”, afirmou o presidente da CPFL Paulista, Carlos Zamboni Neto, em referência à parcela atribuída às despesas gerenciáveis das distribuidoras.