Em Belhell, Edyr Augusto narra rotina em torno de cassino ilegal

O escritor paraense Edyr Augusto tem um método de trabalho desenvolvido quando exercia a função jornalística e hoje é precioso para sua carreira literária: todos os dias, ele frequenta determinada regiões de Belém do Pará (normalmente as que não figuram em cartões-postais) em busca de histórias impressionantes, mas demasiadamente humanas. "Sempre morei no centro da cidade e lá converso com prostitutas, craqueiros, engraxates, camelôs, olhadores de carros, motoristas de táxi", conta. "Sou um ouvinte atento, me interesso pelos relatos, pela cadência das falas – afinal, o escritor é uma espécie de esponja."

É justamente a escrita direta e frenética que impressiona em seus livros, cuja coleção acaba de ganhar mais um título, Belhell, lançado agora pela Boitempo. Trata-se de uma contração do nome da capital paraense com "hell", inferno em inglês. O resultado, portanto, é uma trama aparentemente mirabolante, mas que Augusto jura ter inspiração na realidade. É o caso de um submarino que traficantes construíam para transportar drogas pelo Rio Amazonas – a polícia descobriu a tempo, quando já havia um protótipo na região de Salgado, área de encontro de rios com o Oceano Atlântico.

O foco de Belhell é um assunto que há anos fascinava Augusto: cassinos clandestinos. É, portanto, no Royal, que o destino dos personagens se cruzam e se definem, entre carteados, dados, uísque, cocaína e sexo. "Minha intenção era mostrar o triângulo da cobiça que envolve esse delito", conta o escritor, cujos personagens foram todos baseados em figuras conhecidas por ele.

Apenas uma é ficcional: a garota Paula que, de entediada, se torna uma excelente jogadora de cartas ao acompanhar o avô em uma sessão, a fim de espantar o enfado. Primeiro, a jovem limpa os amigos de seu Cosme; depois, sua habilidade chama atenção de um escroque, Samuel, que a contrata para rapelar jogadores mais polpudos. "Paula foi inspirada em uma história que ouvi quando fui, certa vez, a São Paulo, sobre uma menina que aprendeu os truques do carteado e se tornou uma grande jogadora, levando o dinheiro de várias pessoas."

Edyr Augusto é autor também de Pssica, publicado em 2015 e que serviu de cartão de visitas para novos leitores – entre eles, o cineasta Fernando Meirelles, que comprou os direitos da história, interessado em levá-la para o cinema. Isso porque a narrativa do paraense tem ritmo cinematográfico, com uma sucessão de ações, todas com o poder de fixar a atenção do leitor.

"Em Pssica, a ação se concentrava na Ilha de Marajó, o que limitava o número de personagens e também a linguagem era muito própria daquela região", conta o autor que, em Belhell, há uma sucessão de fatos que acontecem simultaneamente. Assim, ao mesmo tempo em que acompanha a ascensão de Paula no mundo do pôquer proibido, o leitor é apresentado também a Zazá, a moça que, por conta do nanismo, é abandonada pelos pais e acaba na prostituição.

Ainda em relação ao romance anterior, Belhell impressiona pelo grau de violência, especialmente pela trajetória de Aragão, funcionário de um hospital que, nas madrugadas vagas, assassina mendigos com um fio cortante, provocando cortes profundos no pescoço. Seu prazer atinge um ponto máximo quando a vítima, já morta, libera os intestinos – nesse instante, Aragão tem um orgasmo.

"Sou direto quando escrevo cenas de sexo e violência, sem esconder nada", comenta Augusto. "Eu me inspiro em autores que admiro muito como Rubem Fonseca, Dashiell Hammett, Bret Easton Ellis." Sua escrita só nasce quando toda a trama está definida em seu pensamento e, nesse momento, a concentração é total. "Escrevo para me entreter e para incomodar", diverte-se ele, que encara bem a solidão que habitualmente domina a rotina dos criadores de histórias. "É, de fato, um ato solitário, mas consigo encher a minha sala com os personagens, que me fazem companhia."

BELHELL
Autor: Edyr Augusto
Editora: Boitempo (152 págs., R$ 44)

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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