Estadão

Em convenção Republicana nos EUA, Vance lembra infância pobre e critica Biden

O candidato a vice-presidente J.D. Vance foi o grande destaque da terceira noite de Convenção Nacional Republicana. Visto como o futuro para o movimento "Make America Great Again" (MAGA), ele aproveitou o discurso em horário nobre para falar sobre o seu passado difícil, criado em família pobre, com a mãe viciada em drogas e o pai ausente, em mensagem direcionada a um eleitorado que pode ser decisivo.

Vance descreveu a cidade onde nasceu, em Ohio, como um "lugar esquecido por Washington", afirmando que trabalhadores americanos perderam empregos por causa de políticas ruins, que atribuiu a Joe Biden. A lista foi do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta da sigla em inglês), assinado há trinta anos, à abertura do mercado para produtos chineses e a invasão do Iraque, lançada pelo ex-presidente republicano George W. Bush.

A mensagem de J.D. Vance reflete a aposta do partido, que conta com ele para reforçar a sua base na classe trabalhadora branca, parcela do eleitorado que foi crucial para vitória de Donald Trump em 2016. Confortável no palco, ele agitou as delegações e se dirigiu, em particular, a Estados decisivos para eleição.

"Este momento não é sobre mim. É sobre todos nós e as pessoas por quem estamos lutando. É sobre o trabalhador do setor automobilístico em Michigan, que se pergunta por que políticos fora de cogitação estão destruindo seus empregos. É sobre o trabalhador da fábrica em Wisconsin", disse ele, prometendo que Trump criaria mais empregos se eleito.

Vence ficou conhecido ao narrar a sua história no best seller "Era Uma Vez Um Sonho" ("Hillbilly Elegy", no título original). Quando despontou como figura pública, chegou a dizer que era "Trump Nunca" e comparar o líder republicano a Hitler, mas se converteu ao trumpismo nos últimos anos, tendo sido eleito senador por Ohio, em 2022, com apoio de Donald Trump e nomeado agora seu candidato a vice.

Durante o discurso, ele falou sobre as dificuldades da mãe Beverly Vance, que sofreu com o vício em drogas. Da plateia, ela foi ovacionada pela multidão que gritava "mãe de J.D.". "É sobre mães solteiras como a minha, que lutaram contra falta de dinheiro e o vício, mas nunca desistiram. E tenho orgulho de dizer que minha mãe está aqui. E está há 10 anos sóbria", disse.
Em contraste com a sua história, de alguém que veio "do nada", ele descreveu o companheiro de chapa como empresário bem-sucedido que "não precisava da política".

Ao falar sobre o atentado contra Donald Trump no fim de semana, o candidato a vice culpou a retórica dos seus adversários. "Disseram que ele precisava ser parado a todo custo", disse ele, que foi um dos republicanos acusar Joe Biden de incitar o ataque.

A tentativa de assassinato também foi lembrado por familiares do líder republicano. Sua neta, Kai, descreveu a relação com o avô para dizer que a mídia o faz "parecer diferente do que é". E afirmou que foi "de partir o coração" saber que ele foi baleado. "Muitas pessoas fizeram meu avô passar por um inferno."

Donald Trump Jr., filho mais velho do ex-presidente, lembrou a imagem do pai sendo retirado do palco com o rosto ensanguentado – foto essa que estava sendo vendida na Convenção. "Ele se levantou erguendo o punho e disse o quê?". A multidão respondeu com gritos de "lute, lute".

Enquanto apontava o republicano como um símbolo de união, o filho criticava seus adversários, descrevendo a eleição como uma escolha "entre os que querem construir e os que querem destruir o país". "Eles mentiram sobre o conluio com a Rússia, mentiram sobre o computador de Hunter (Biden, filho do presidente). Eles mentiram sobre a aptidão de Joe Biden para o cargo, mentiram sobre a segurança da fronteira", disse Trump Jr, que questionou quem estava no comando da Casa Branca no momento em que as capacidades do democrata, de 81 anos, não colocadas em dúvida. "Quem quer que esteja comandando o show, a única coisa em que eles são eficazes é em perseguir o meu pai", disparou.

Assim como fez nas primeiras noites de convenção, Donald Trump assistiu aos principais discursos da plateia. Ele estava sentado ao lado do governador da Virgínia, Glenn Youngkin, e do senador da Flórida Marco Rubio, ambos cotados para compor o gabinete do republicano em caso de vitória nas eleições.

Trump tem usado um curativo na orelha – que alguns dos seus apoiadores adotaram como sinal de apoio – após ter sido atingido de raspão no atentado ao seu comício. O candidato à Casa Branca falará publicamente pela primeira vez desde a tentativa de assassinato nesta quinta-feira, 18, quando discursa no encerramento do encontro republicano.

Outro destaque na noite foi a aparição de Peter Navarro, ex-funcionário da Casa Branca de Trump condenado por desacato ao Congresso. Ele foi recebido pelos republicanos com uma ovação que durou mais de um minuto, horas após deixar a prisão.

Navarro cumpriu uma sentença de quatro meses por se recusar a cooperar com uma investigação do Congresso americano sobre o ataque de 6 de janeiro de 2021. "Se eles podem vir atrás de mim – e se podem vir atrás de Donald Trump – tenha cuidado, eles virão atrás de você", disse ele, ecoado a tese de perseguição, ou "caça às bruxas", que Trump costuma evocar ao falar sobre os seus problemas com a Justiça.

<b>Política externa de Joe Biden na mira</b>

O tema desta quarta-feira, 17, foi "Faça a América Forte de Novo", com foco em política externa e, mais uma vez, na imigração, tema central nas eleições americanas. Logo na abertura, Michael Whatley, presidente do Comitê Nacional Republicano deu a tônica da terceira noite de convenção.
"Precisamos lembrar onde estávamos há quatro anos. A Rússia, a China e o Irã estavam sob controle. Nossa fronteira estava segura e nossa economia estava forte", disse Whatley. "Agora, a Rússia invadiu a Ucrânia, instalou capacidades nucleares em Cuba. A China está ameaçando Taiwan e o Irã atacou o nosso aliado Israel com seus grupos por procuração e seus mísseis. Dezenas de milhões de imigrantes entraram pela nossa fronteira e não sabemos quem são, onde estão o que estão fazendo."

Donald Trump afirma, e os republicanos tem repetido ao longo da convenção, que as guerras na Ucrânia e Faixa de Gaza seriam resultado da fraqueza de Joe Biden. "Estamos testemunhando hoje que a força preserva a paz e a fraqueza é um convite para a guerra. E não podemos nunca projetar força pelo mundo quando a fraqueza está na Casa Branca", disse a deputada Nancy Mace, da Carolina do Sul.

A retirada das tropas americanas do Afeganistão foi outro ponto-chave da política externa de Biden que foi alvo de críticas durante a noite. Familiares dos 13 soldados americanos que morreram em um ataque a bomba do lado de fora do aeroporto em Cabul em 2021 subiram ao palco. Os discursos culparam o democrata pelo ataque, criticando a condução da retirada das tropas.

O acordo para a retirada dos EUA do Afeganistão após 20 anos de guerra foi assinado pelo ex-presidente Donald Trump em fevereiro de 2020. O acordo previa que as tropas americanas saíssem até maio de 2021, mas Trump deixou o cargo em janeiro sem deixar um plano para a retirada efetiva das forças, que foi concluída por Biden e de forma caótica, marcada por imagens de afegãos pendurados aos aviões americanos.

Depois do momento dedicado aos soldados mortos no Afeganistão, subiram ao palco Ronen e Orna, os pais de Omer Neutra, cidadão americano que atuava no Exército de Israel e é mantido como refém pelo Hamas desde o ataque terrorista em 7.

"Onde está a indignação?", questionou Ronen ao descrever mortes e sequestros de cidadãos americanos. Na plateia a multidão respondia "traga-os de volta para casa", grito de protesto dos familiares de reféns.
Eles disseram que Donald Trump os procurou logo após o atentado e apelaram pelo fim da crise no Oriente Médio, sem criticar diretamente o governo Joe Biden, que tem sido um dos principais apoiadores de Israel, apesar da pressão dentro do partido democrata pela crise humanitária em Gaza.

Os republicanos, por outro lado, não pouparam o atual governo de críticas. "A fraqueza e a confusão do presidente Biden permitiram que o terrível ataque do Hamas matasse mais de 1.200 pessoas inocentes", disse Newt Gingrich, ex-presidente da Câmara dos EUA.

<b>Imigração é tema central</b>

O tema da migração, um dos principais tópicos do evento, pareceu concentrar-se nas implicações para a segurança americana, com a palavra "invasão" – anteriormente relegada às margens do debate nacional – agora aparecendo com mais frequência nas declarações dos apoiadores do partido.

Tom Homan, que foi diretor interino de Imigração e Alfândega na administração Trump, disse que tinha uma mensagem para as pessoas que entraram ilegalmente no país durante o governo Biden. "É melhor você começar a fazer as malas agora", disse Homan em meio a aplausos, acrescentando: "Porque você está indo para casa".

"Parece e parece uma invasão porque é", disse Jim Chilton, um fazendeiro do Arizona, sobre os problemas da imigração que observou perto de sua propriedade, na fronteira sul. A esposa de Chilton, Sue, alegou que sua casa foi invadida duas vezes.

David Lara, dono de uma pequena empresa na fronteira com o México, denunciou problemas em sua cidade como resultado das políticas migratórias de Biden. "Imagine estranhos aterrorizando suas casas, seus vizinhos, seus quintais e escolas locais", disse. "Biden e Kamala Harris não se importam. Na verdade, eles parecem satisfeitos. Eles não fizeram nada para impedir e fizeram tudo para piorar", declarou.

A presença de cidadãos americanos comuns, intercalados ao longo da convenção, reforçavam o discurso dos republicanos, que descrevem os Estados Unidos como um país em crise, estabelecendo paralelos com o governo Donald Trump.

"Posso te dizer que os Estados Unidos precisam de um presidente que vai proteger a fronteira", declarou o governador do Texas, Greg Abbott. O republicano, que trava uma batalha com a Casa Branca na Justiça para implementar sua política anti-imigração, acusou o governo democrata de bloquear os seus esforços para "retomar nossa terra e fechá-la com arame", referindo-se à cerca que instalou na fronteira.

A entrada de imigrantes nos Estados Unidos atingiu o pico no fim do ano passado, com cerca de 250 mil encontros na fronteira em dezembro, antes de começar a cair este ano. Os democratas, por outro lado, acusam os republicanos de sabotar os esforços do governo para beneficiar ao bloquear o projeto de lei bipartidário para reforçar a segurança na fronteira. A proposta não foi mencionada por republicanos na convenção.

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