O subprocurador Paulo Gustavo Gonet Branco tomou posse nesta segunda-feira, 18, como procurador-geral da República defendendo o foco do Ministério Público no "agir técnico" e não na busca por "palco nem holofote". Segundo Gonet, o Ministério Público Federal vive um "momento crucial na cronologia da República democrática", de "reviver na instituição os valores constitucionais".
Em breve discurso, Gonet deu ênfase para a harmonia entre os Poderes. O novo PGR também pregou "equilíbrio e unidade" dentro da instituição, ressaltando que é "imperioso" o funcionamento dos órgãos de coordenação e disciplina para que a "independência desatenta não resulte em períodos de cacofonia institucional".
"Nesse plano, como Ulisses no mar das sereias, sedutoras e capciosas, devemos estar aferrolhados ao mastro forte, no nosso caso, o dos princípios constitucionais diretores do nosso atuar e do nosso destino. No nosso agir técnico, não buscamos palco nem holofote, mas, com destemor, havemos de ser fiéis e completos ao que nos delega o constituinte e nos outorga o legislador", afirmou.
Gonet evocou o direito à dignidade no cumprimento da tarefa de investigação. Ponderou que os integrantes do Ministério Público devem mostrar "compromisso com os direitos de dignidade de todos, mesmo do mais censurável malfeitor". "Submetendo-nos às garantias constitucionais dos que estão sob as nossas vistas, contendo-nos às competências de que somos titulares e obedecendo aos limites éticos."
Este trecho do discurso foi na linha da fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na cerimônia de posse. O chefe do Executivo declarou que "acusações levianas não fortalecem a democracia, tampouco as instituições". "Muitas vezes se destrói uma pessoa antes de se dar a ela a chance de se defender. E, quando as pessoas são provadas inocentes, elas não são reconhecidas publicamente."
<b>8 de Janeiro</b>
O novo procurador-geral da República terá como um de seus primeiros atos de gestão definir o novo responsável pelo Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos, que coordena as investigações dos ataques às sedes dos três Poderes no dia 8 de janeiro. Existe a possibilidade de o novo PGR não delegar a chefia da equipe a um subordinado e manter consigo a supervisão desses processos para facilitar a interlocução com o Supremo Tribunal Federal (STF). Gonet deve decidir o futuro do grupo nos próximos dias em reunião com o novo vice-procurador-geral da República, Hindemburgo Chateaubriand. O antigo coordenador do grupo estratégico, o subprocurador Carlos Frederico, entregou o cargo ontem.
No comando da PGR, Gonet terá uma série de desafios: assumir processos sensíveis no Supremo que miram o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o atual ministro das Comunicações, Juscelino Filho; lidar com o rescaldo de tensões entre o Ministério Público Federal e a Suprema Corte; e se posicionar diante de cobranças de transparência no órgão.
Desde a saída de Augusto Aras da Procuradoria-Geral da República, o órgão vinha sendo chefiado por Elizeta Ramos e vive um período de "transição". Integrantes do MPF ouvidos reservadamente pelo <b>Estadão</b> apontam similaridades entre o perfil de trabalho de Gonet e de Aras, com uma atuação considerada mais "clássica", mais reativa e processual.
Um dos desafios que o novo procurador-geral da República deve enfrentar está ligado diretamente à relação mantida entre Aras e o Supremo, com alguns pontos de tensão. Durante seu mandato, o ex-PGR chegou a ser cobrado por ministros da Corte sobre manifestações relativas a processos que tramitam no tribunal, especialmente aqueles que atingem o governo Bolsonaro.
Gonet vai atuar nas investigações que implicam o ex-presidente tanto em casos ligados à conduta do ex-chefe do Executivo como nas apurações sobre as doações via Pix feitas a Bolsonaro. Também deve dar pareceres sobre o inquérito das milícias digitais, que abarca uma série de frentes de apuração, como a das supostas fraudes no cartão de vacinação do ex-presidente e as tentativas de venda das joias sauditas. Nessa esfera, vai ainda se manifestar sobre a delação do ex-ajudante de ordens Mauro Cid. Ontem, Gonet pregou o "dever indeclinável de combater a corrupção".
De outro lado, o novo chefe do Ministério Público vai atuar nos autos da Operação Benesse, que mira uma suposta quadrilha responsável por fraudes em licitações, lavagem de dinheiro e desvio de verbas federais da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf). O ministro das Comunicações de Lula, Juscelino Filho, é um dos investigados.
<b> Não pode achar que todo político é corrupto </b>
Durante a cerimônia de posse do novo procurador-geral da República, Paulo Gonet, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que "um procurador não pode se submeter a um presidente da República, nem à manchete de jornal e canal de televisão". O chefe do Executivo ainda disse que o novo PGR deve evitar dar publicidade precoce a investigações. Em discurso, Lula criticou o que chamou de "acusações levianas" e disse que o Ministério Público "não pode achar que todo político é corrupto".
"Um procurador não pode se submeter a um presidente da República, a um presidente da Câmara, a um presidente do Senado, aos presidentes de outros Poderes, e também não pode se submeter à manchete de nenhum jornal, nenhum canal de televisão", afirmou Lula. "É um conceito que se criou e qualquer denúncia contra qualquer político se parte do pressuposto que é verdadeira. E nem sempre é. Se a gente quiser evitar aventuras nesse país, como aconteceu no 8 de janeiro, e consagrar o processo democrático, o MP precisa jogar o jogo de verdade."
Entre 2016 e 2020, o presidente foi alvo de diversas denúncias do Ministério Público, na Lava Jato. Condenado, ficou preso por 580 dias. (COLABOROU WESLLEY GALZO)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>