A campainha que toca no apartamento térreo da Alameda Santos, nas imediações da Avenida Paulista, anuncia, como qualquer outra, a chegada de um visitante. Só que, por volta das 20h desta quinta-feira, 14, o sinal sonoro – parecido com o barulho daqueles telefones antigos – será tocado três vezes. Quem frequenta teatro sabe que o terceiro sinal anuncia o início da peça. Mas não estamos em um teatro.
O endereço é da casa do ator Renato Borghi, de 78 anos, e o espetáculo é o Fim de Jogo de Samuel Beckett (1906-1989), montagem que ele viu pela primeira vez aos 20 anos e odiou. “Era uma coisa tão chata que não andava”, denuncia. E logo justifica: “O problema são as fôrmas quando dizem: Beckett é assim, Chekhov é assim, Brecht é assado. Sempre fui contra.” De fato. O intérprete do icônico Abelardo I em O Rei da Vela com o Teatro Oficina, em 1967, fundou mais tarde o Teatro Promíscuo, que completa 20 anos com Elcio Nogueira Seixas.
O reencontro com o dramaturgo irlandês ocorreu de forma mais amistosa em 2009 no projeto Beckett – O começo está no fim. Cinco anos depois, nem um dos dois imaginava, mas o universo metafísico e aparentemente pessimista de Beckett iria sugá-los para uma dimensão paralela à dos personagens da peça – Hamm, o velho que não anda, e Clov, que cuida dele.
Borghi passou por três cirurgias na coluna e ficou sob os cuidados de Seixas. “Um dia, eu estava arrumando a cadeira para o Renato assistir à televisão”, conta Seixas. “Empurrava para lá, para cá, e nunca ficava bom.” Essa cena ocorria da mesma forma como no texto. E vice-versa. “Nós lemos a peça e rimos muito”, diz Seixas. “Um riso macabro”, completa Borghi.
Dali em diante, os dois convidaram Isabel Teixeira para dirigir e logo ela sugeriu: “Por que não montamos a peça aqui?”. A conversa que viria a seguir merecia um café e uma pausa antes de continuar. Fique à vontade. A casa é sua.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.