O presidente Luiz Inácio Lula da Silva desembarcou na Guiana nesta quarta-feira, 28, para participar da cúpula do Mercado Comum e Comunidade do Caribe (Caricom). Lula foi recebido pelo presidente guianense, Irfaan Ali, que enfrenta as ameaças de guerra da vizinha Venezuela, e voltou a chamar as operações de Israel na Faixa de Gaza de genocídio.
"O genocídio na Faixa de Gaza afeta toda a humanidade, porque questiona o nosso próprio senso de humanidade e confirma uma vez mais a opção preferencial pelos gastos militares, em vez de investimento no combate à fome na Palestina, na África, na América do Sul e no Caribe", disse o presidente brasileiro.
Lula tem criticado a resposta de Israel ao ataque do Hamas, que desencadeou a guerra, no dia 7 de outubro, quando terroristas mataram 1,2 mil pessoas em território israelense e sequestraram cerca de 240 pessoas. Recentemente, ele comparou a situação com as mortes de judeus por Adolf Hitler durante a 2.ª Guerra.
As críticas criaram uma crise diplomática e fizeram o chanceler israelense, Israel Katz, declarar Lula persona non grata até que ele se retrate – o que o governo brasileiro ignorou. Na terça-feira, 27, em entrevista ao programa É Notícia, do jornalista Kennedy Alencar, da RedeTV!, Lula negou que tenha utilizado a palavra "Holocausto" para se referir ao conflito entre Israel e o Hamas.
A viagem de Lula, no entanto, pretende resolver uma outra crise diplomática muito mais relevante para os interesses brasileiros, entre Venezuela e Guiana, dois vizinhos. O governo venezuelano reivindica a soberania sobre o Essequibo, uma região rica em petróleo que representa mais de dois terços do território guianense.
<b>Tensão</b>
Apesar da mediação brasileira, que conseguiu um acordo para que os dois vizinhos não resolvessem o impasse por meio da força, a Guiana acusou a Venezuela de realizar manobras militares perto da fronteira em algumas ocasiões neste ano. No dia 25 de janeiro, ocorreu a última reunião para tratar da crise de Essequibo.
O encontro durou mais de cinco horas e foi mediado pelo chanceler do Brasil, Mauro Vieira, e contou com observadores da ONU, do Caricom e da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac). No fim, os dois países se comprometeram a não recorrer à força para resolver a disputa, mas a crise está longe de ser resolvida.
Venezuela e Guiana continuaram a trocar provocações. Nove dias depois do acordo, o Reino Unido anunciou o envio de um navio de guerra à Guiana, ex-colônia britânica, para uma série de manobras militares. No dia 28 de dezembro, o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, ordenou a mobilização de 5.600 militares para a realização de exercícios em "resposta à provocação e à ameaça do governo britânico".
O Itamaraty emitiu nota, no final de dezembro, expressando "preocupação" com a tensão. "O governo brasileiro acredita que demonstrações militares de apoio a qualquer das partes devam ser evitadas, a fim de que o processo de diálogo ora em curso possa produzir resultados", disse o Ministério das Relações Exteriores.
<b>Críticas</b>
Desde que retornou à presidência, Lula tem caminhado em uma linha tênue entre fortalecer as relações entre Brasil e Venezuela e reabilitar politicamente o ditador chavista. Em maio de 2023, ele recebeu Maduro para uma reunião em Brasília e cobriu o venezuelano de elogios – provocando críticas até de governos de esquerda da América do Sul, como o presidente chileno, Gabriel Boric.
Desde então, o Brasil tem apoiado diplomaticamente a negociação entre oposição e chavismo para a realização de eleições limpas neste ano, apesar da decisão de Maduro de barrar a candidatura de María Corina Machado, a mais competitiva da oposição.
Em fevereiro, novas acusações elevaram ainda mais a tensão no Caribe. A Venezuela afirmou que responderia de forma contundente caso fosse iniciada a perfuração de poços petrolíferos no Essequibo, como havia anunciado o governo da Guiana, em parceira com a americana ExxonMobil.
<b>Diplomacia</b>
Hoje, Lula vai para São Vicente e Granadinas, no Caribe, para a cúpula da Celac, onde deve ser reunir com Maduro. Além do desconforto do Brasil com a crise regional, o brasileiro terá a difícil missão de abordar a repressão do chavismo aos candidatos de oposição na Venezuela.
A realização de eleições justas e transparentes era a condição imposta pelos EUA para suspender as sanções econômicas à Venezuela. Um processo limpo seria fundamental para romper o isolamento internacional do chavismo e colocar Lula na condição de capitão da democracia na América do Sul. Resta só combinar com Maduro, que não dá sinais de que pretende colaborar.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>