O corpo técnico do Tribunal de Contas da União (TCU) considera que o modelo de regulação das concessões das rodovias à iniciativa privada incentiva a não execução das obras pelas empresas que assumiram as estradas. Mesmo não cumprindo as obrigações do contrato, as concessionárias conseguem autorização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para aumentar as tarifas com o objetivo de compensar o custo de novas obras que não estavam previstas no projeto original.
A avaliação do TCU é reforçada por Carlos Campos, coordenador de infraestrutura econômica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Já estudamos esses reajustes e também chegamos à mesma conclusão. Os mecanismos incluídos nos contratos permitem esses aumentos abusivos e essa situação fica ainda mais difícil porque a ANTT não tem condições de fiscalizar tudo o que foi concedido”, afirma.
Campos lembra ainda que, em algumas ocasiões, os reajustes sequer têm relação com obras. Em 2016, quando caminhões com eixos suspensos foram liberados de pagar pedágio, sobrou para os demais usuários. “Automaticamente todo mundo teve de bancar um aumento médio de 20% na tarifa, para manter o equilíbrio financeiro dos contratos”, diz.
Segundo ele, os problemas com a modelagem financeira dos contratos não estão restritos às concessões brasileiras. O Ipea fez um levantamento de experiências feitas no México, Chile, Colômbia e Estados Unidos. “Todos esses países tiveram graves problemas na execução de contratos, sempre por conta de reclamações com cobrança abusiva”, afirma. No México, o governo chegou ao ponto de tomar a rodovia de volta. “O que vemos no Brasil envolve ainda a falta de capacidade de fiscalização. Não há avanço regulatório que possa justificar as tarifas de pedágio praticadas por aqui”, diz Campos.
Briga
A Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), representante das empresas que atuam nas estradas federais, critica o que definiu como “postura ideológica” da corte e diz que nenhum centavo cobrado nos pedágios pelo País é criado pelas empresas, mas sim analisado e autorizado pela diretoria da agência.
“As concessionárias são o polo passivo dessa discussão. Essa é uma briga do TCU com a ANTT. Quem inclui ou exclui obras em rodovias é o poder concedente, não as empresas. Ninguém faz uma obra ou muda uma tarifa se estas não forem, antes, aprovadas pela agência”, afirma o presidente da ABCR, César Borges, ex-ministro dos Transportes durante o governo Dilma Rousseff.
“Temos uma agência presa numa camisa de força, sem coragem de tomar as decisões por causa do TCU. Já estamos há mais de três anos sem lançar um edital de rodovias na esfera federal, enquanto os projetos avançam nos Estados”, comenta o presidente da ABCR.
Questionado sobre os altos índices de atrasos informados pela ANTT, Borges diz que a metodologia aplicada pela agência para calcular a “inexecução” das obras não corresponde à realidade. “Se você está prestes a concluir uma passarela, o modelo da agência imputa que 100% da obra não está pronta porque não foi entregue.”