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Encantado com o Brasil, AI Weiwei produz obras em conjunto com artesãos daqui

O artista dissidente chinês Ai Weiwei, de 61 anos, inaugura amanhã, dia 20, às 12 horas, sua primeira exposição no Brasil, Ai Weiwei Raiz, na Oca, no Ibirapuera. Pelos 8 mil metros quadrados do prédio estão espalhadas 70 obras de períodos diversos, 24 delas recentes e realizadas no Brasil com a ajuda de artesãos, como a série de 200 ex-votos talhados em Juazeiro do Norte, Ceará, que reproduzem peças do repertório de Weiwei, entre elas a mais popular, sua mão com o dedo médio rígido que esboça um gesto obsceno.

É uma exposição grande – e pesada. Pela primeira vez, ele vai mostrar a obra Straight como foi originalmente concebida, uma instalação com 164 toneladas de vergalhões de diâmetro variado resgatados dos escombros das escolas de Sichuan, na China, destruídas pelo terremoto que abalou a cidade há dez anos. Contra a omissão das autoridades, que não divulgaram o número de vítimas, ele pesquisou e descobriu que 5 mil crianças foram mortas na tragédia. Na Bienal de Veneza de 2013, Straight foi parcialmente exibida ao lado de outra obra de Weiwei, S.A.C.R.E.D, série de dioramas com o registro da prisão do artista na China, em 2011.

Weiwei continua um ferrenho opositor do regime chinês. Ele autoproclama-se um defensor das liberdades individuais e dos direitos humanos. Uma das maiores obras da exposição é justamente um barco de refugiados à deriva, que flutuou sobre o lago do Ibirapuera antes de ser instalado no último andar da Oca. Ao lado dela, o visitante poderá ver cenas tocantes e reais dos abrigos de refugiados na Europa gravadas em vídeo pelo artista.

Entre outros vídeos, Weiwei mostra como era o seu antigo ateliê em Xangai, que custou 1 milhão de euros e foi demolido por ordem das autoridades chinesas antes mesmo de ser ocupado. Ele não se nega a falar da perseguição que sofreu do governo chinês – em 2011, seu estúdio em Pequim foi invadido por 40 policiais, que confiscaram dezenas de obras.

Agora seria mais difícil esse confisco. Cada vez mais seus trabalhos assumem uma dimensão pantagruélica. A última extravagância de Weiwei foi decalcar milímetro por milímetro o tronco de um pequi com a altura de um prédio em Trancoso, Bahia, para moldar a árvore e fundi-la em ferro na China (o peso final será de 250 toneladas). Na Oca, o visitante poderá ver outros troncos de árvores que formam um conjunto escultórico semelhante aos do falecido escultor Frans Krajcberg (1921-2017).

Ele desconhece a obra de Krajcberg e outros brasileiros. Artista que não liga para pintura e muito menos considera-se autor de uma obra, Weiwei encara sua atividade como parte de uma experiência existencial na qual o culto religioso não é desprezado (ele instalou um Buda no interior do pequizeiro).

Ao mesmo tempo, Weiwei sentiu na Bahia uma intensidade corpórea inaudita que o fez ter sonhos eróticos pela primeira vez em anos, segundo revela o curador da mostra, Marcello Dantas. Submeteu-se, então, a oito horas de uma sessão de molde em gesso para registrar seu corpo nu e roliço que estará exposto na Oca, num colchão, ao lado da escultura de uma mulher de origem afro com dreadlocks. Detalhe: o naturalismo das figuras fica entre a sobriedade de George Segal (1924-2000) e o hiper-realismo do australiano Ron Mueck.

Essa atração por uma arte figurativa fácil de ser decodificada vem, segundo ele, da descoberta de veteranos da arte povera nos anos 1980, como o italiano Michelangelo Pistoletto, premiado na Bienal de São Paulo em 1967, com o qual vai conversar no domingo, 21, às 11h, no Sesc Pinheiros. “Como Pistoletto, que vi pela primeira vez em 1988, no MoMA, acredito numa arte interativa, em que o espectador tenha um papel ativo, o que para mim é essencial.”

Weiwei preza sua individualidade antes de tudo e diz que faz uma obra militante em defesa da liberdade, “sem a qual a arte deixa de ter sentido”, segundo ele. “Mais que nunca, a questão das raízes é essencial, o que justifica o título da exposição, porque a verdadeira tragédia humana é a da solidão, sentir-se desgarrado num exílio permanente”, conclui. “Basicamente, a minha é uma exposição sobre como sobreviver num mundo de órfãos sem raízes.”

AI WEIWEI RAIZ
Oca. Av. Pedro Álvares Cabral, s/n, Ibirapuera, portão 3. 3ª a sáb., 11h às 20h; dom. e fer., 11h às 19h. R$ 20. Abre 20/10. Até 20/1.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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