Depois de chegar a R$ 5,80 em março, ficar em R$ 5,40 em abril e fechar o mês de maio em R$ 5,22, o dólar caiu ainda mais ao longo dos primeiros dias de junho, alimentando a expectativa no mercado financeiro de um rompimento da marca de R$ 5.
A moeda americana fechou na terça-feira a R$ 5,03, cotação que oscilou ontem para R$ 5,06 (alta de 0,69%), mas os especialistas ouvidos pelo Estadão ainda veem espaço para novas quedas nos próximos dias. O movimento de valorização do real tem sido puxado por uma conjunção de fatores externos mais favoráveis, como a abundância de recursos no mercado internacional e o aumento de exportações brasileiras, puxada pela retomada da economia mundial e alta dos preços das commodities (produtos básicos) agrícolas e metálicas.
No ambiente interno, a alta da taxa básica de juros (a Selic) também favorece a entrada de dólares no País, com a busca dos investidores por ganho mais elevado. O clima das últimas semanas é também de maior otimismo, com o crescimento da economia brasileira, melhora da arrecadação do governo e perspectiva de a dívida pública fechar em patamar mais baixo do que o previsto, apesar de o risco fiscal do País ainda não ter saído do radar.
"É o resultado de uma enxurrada de dólares, euros e yuans no mundo", diz Nathan Blanche, sócio da Tendências Consultorias. Segundo ele, o fluxo cambial mais forte e a perspectiva de um superávit da balança comercial de pelo menos US$ 25 bilhões a mais do que os US$ 50 bilhões registrados no ano passado ajudam a reforçar a queda da cotação do dólar.
Ele lembra que o fluxo cambial do ano, até 4 de junho, estava positivo em US$ 10,5 bilhões, enquanto no mesmo período de 2020 o saldo estava negativo em US$ 9,6 bilhões. Ou seja, tem muito mais dólares entrando no País. Blanche calcula que a taxa de câmbio de equilíbrio seria de, no máximo R$ 4,50, mas ressalta que o Brasil ainda tem uma doença crônica que é o rombo nas contas públicas a atrapalhar. "Não tem governo, não tem desempenho que vá para frente com o déficit crônico."
<b>Alinhamento</b>
Professor da Universidade Federal do ABC, Fábio Terra diz acreditar que as condições internas do Brasil têm pouco efeito nesse movimento de queda do dólar. Ele avalia que o dólar está cedendo por conta do ciclo de liquidez internacional, que melhorou bastante há um mês, depois que investidores e empresários assimilaram melhor o plano econômico do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. "O mundo entra num cenário um pouco mais calmo e isso favorece o Brasil, porque os investidores estão menos avessos ao risco", diz.
Terra aponta outro fator que está favorecendo o cenário atual: os exportadores, que estavam deixando lá fora as receitas obtidas das suas vendas, começaram a trazer os dólares para o País. "Os exportadores estão aproveitando para voltar com o dinheiro enquanto o dólar ainda está valorizado. Para eles, é importante voltar num momento de dólar mais alto", afirma.
O economista da UFABC diz que há margem para uma queda maior na direção do câmbio de equilíbrio entre R$ 4,50 e R$ 4,60. O gatilho para esse movimento vai depender de como vierem os dados da economia americana e da decisão do Banco Central dos Estados Unidos (Federal Reserve, o Fed) sobre os juros.
Economista-chefe da BlueLine Asset, Fabio Akira, vê um alinhamento de fatores externos (dólar enfraquecendo no mundo, commodities subindo, juros futuros caindo nos EUA) favorecendo a queda da moeda americana, mas também domésticos, como crescimento melhor que o esperado favorecendo as contas públicas junto com aumento da inflação, alta acelerada da Selic e respeito a regras orçamentárias. "Pelo menos, não houve rompimento aberto delas. Foi uma conjunção desses fatores", diz. Para ele, esses fatores devem permanecer no curto prazo. "Mas meu medo é esse otimismo do mercado abrir espaço para leniência fiscal", pondera.
Akira avalia que, se a inflação americana ficar dentro do esperado e o Fed se mantiver paciente com a retirada de estímulos fiscais, o dólar pode cair abaixo de R$ 5. "A divulgação da inflação americana é na quinta-feira (hoje) e a reunião do Fed é na semana que vem. Então, se tudo for mais ou menos tranquilo, pode haver apreciação adicional do real. Mas estou assumindo que as coisas por aqui também não vão se alterar muito do clima positivo que prevalece", diz.