Mundo das Palavras

Erotismo e fé

Como sabe quem gosta de estudar a História, a mescla de erotismo e fé tem uma tradição milenar dentro do Cristianismo. Passagens impregnadas de sentimento erótico podem ser encontradas já no Velho Testamento, conforme foi apontado pelo pesquisador Edson Dorneles de Andrade, no ensaio “A Bíblia como literatura. Violência, poder e erotismo na narrativa sagrada”.


O pesquisador reproduziu, neste seu estudo, trecho do Velho Testamento, extraído do capítulo 19 do Livro dos Juízes, com o relato do seguinte episódio que teria ocorrida no ano 1.200, antes de Cristo: um membro da tribo sagrada dos Levita e sua amante, uma mulher casada, se encontravam sob a proteção de um nobre, quando a casa do anfitrião foi cercada.


Prossegue a narrativa: “Um bando de gente perversa rodeou a casa, batendo à porta e gritando ao velho dono da propriedade: ‘Traga para fora o homem que esta aí! Queremos abusar dele!’. O dono da casa saiu e falou com eles: ‘Meus irmãos, não façam essa loucura!’, suplicou. ‘Eu trago aqui a minha filha virgem e a mulher dele. Vocês poderão abusar delas quanto quiserem. Mas não façam essa loucura com meu hóspede’.


Ainda no Velho Testamento são amplamente conhecidos os versos do livro poético “Cântico dos Cânticos”, que, como recorda Edson; “reúne uma coleção de diálogos amorosos entre um homem e uma mulher, nos quais se exaltam a beleza e a paixão”. 


Em seu ensaio acadêmico sobre os versos deste cântico bíblico, intitulado “Os deslimites da palavra”, a pesquisadora Raquel Mendonça chama a atenção dos leitores para o que ela denomina de “maneira deliciosamente delicada” como uma mulher pode falar sobre seu amante com imagens sutis e sugestivas de prazeres sexuais neste verso: “O meu amado meteu a mão pela fresta da porta e as minhas entranhas estremeceram por amor dele”.


 


Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP

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