O presidente dos EUA, Donald Trump, ainda não aceitou a derrota. Esgotadas praticamente todas as ações jurídicas, ele vem adotando duas novas estratégias para se manter no cargo: impedir a certificação da vitória de Joe Biden em alguns condados e pressionar os Legislativos estaduais a escolher representantes republicanos fiéis a ele no colégio eleitoral – mesmo que o democrata tenha vencido a eleição no Estado.
Duas semanas após a eleição e 12 dias depois de Biden ter sido declarado o vencedor, Trump entrou com 28 ações judiciais em vários Estados. Ganhou apenas uma: na Pensilvânia, os tribunais encurtaram o prazo de 9 para 6 dias para que os eleitores que cometeram erros no preenchimento da cédula enviada pelo correio façam correções – um total pequeno para quem foi derrotado por mais de 80 mil votos no Estado.
Segundo a campanha de Trump, seus advogados ainda têm entre 30 e 40 ações judiciais em seis Estados: Arizona, Geórgia, Michigan, Pensilvânia, Nevada e Wisconsin. Algumas exigem a anulação de cédulas, outras alegam erros de procedimento, como restrições ao monitoramento da apuração. Todas, no entanto, têm uma coisa em comum, de acordo com juristas: a falta de provas de que houve fraude.
Por isso, a campanha do presidente já trabalha em duas frentes: impedir a certificação da vitória de Biden e tirar do democrata os delegados estaduais que votam no colégio eleitoral. Isso porque a eleição presidencial dos EUA é indireta. Depois de apurados os votos, ela entra em uma fase modorrenta, que envolve a oficialização dos resultados e a escolha dos 538 eleitores que de fato elegem o presidente.
No passado, tudo isso era apenas protocolar e nunca mereceu a atenção de analistas ou a cobertura da imprensa. Trump mudou o jogo. Um exemplo aconteceu no condado de Wayne, onde fica Detroit, em Michigan. A certificação dos resultados é feita por um comitê de quatro pessoas: dois de cada partido. Na terça-feira, 17, os dois republicanos – William Hartmann e Monica Palmer – se recusaram a certificar a vitória de Biden.
Na prática, a medida ameaçava tirar da contagem final 860 mil votos, três quartos deles de eleitores negros. Biden obteve uma vantagem de 330 mil votos em Detroit e venceu em Michigan com 158 mil votos a mais que Trump. Sem o resultado do condado, portanto, o vencedor seria o presidente. "Se tirarmos os votos de Detroit, mudamos o resultado da eleição em Michigan", afirmou Rudy Giuliani, que lidera a equipe de advogados de Trump.
Horas depois, os dois republicanos foram convencidos a aceitar o resultado das urnas. Em troca, conseguiram a promessa de que os votos de Detroit seriam auditados. Mas, em seguida, segundo o Washington Post, Trump telefonou para Palmer. Ao jornal, ela confirmou a conversa, mas garantiu que não foi pressionada. "Ele só queria saber como eu estava", disse. Seja como for, após falar com o presidente, ela mudou de ideia e quis retirar sua aprovação.
Os democratas do comitê, no entanto, disseram que era tarde demais. O resultado já havia sido homologado e enviado para as autoridades eleitorais do Estado, que têm até a segunda-feira para certificar toda a apuração em Michigan. Se não conseguirem cumprir o prazo, ninguém sabe com quem ficariam os 16 votos do Estado no colégio eleitoral.
Aliados do presidente defendem a tese de que, em caso de impasse, os Congressos estaduais seriam os responsáveis pela escolha dos eleitores. Como os republicanos têm maioria em vários Estados vencidos por Biden, incluindo Michigan e Pensilvânia, eles poderiam escolher eleitores fiéis a Trump.
O problema da estratégia de Trump – além de ignorar o resultado das urnas – é que a Constituição dita a composição do colégio eleitoral, mas deixa para os Estados decidirem como os eleitores serão escolhidos, e todos aprovaram leis que cedem esse direito à população. Os próprios congressistas republicanos, em Michigan e na Pensilvânia, disseram reiteradas vezes que não pretendem intervir.
A pressão, porém, está cada vez maior. Nesta quinta, 19, Trump convidou os congressistas de Michigan para visitá-lo hoje na Casa Branca. "Colocar o peso da presidência em indivíduos e autoridades eleitorais de condados e Estados é um atentado ao processo democrático", disse Richard Pildes, constitucionalista da Universidade de Nova York. Para Joanna Lydgate, do Programa de Proteção ao Voto, o comportamento de Trump "chegou ao ponto mais baixo". "As legislaturas estaduais não têm poder para certificar as eleições – e já admitiram isso", disse.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>