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ESPAÇO AAPAH – A proteção ao entorno do bem tombado

Legenda: Árvores do entorno do Teatro Padre Bento foram derrubadas sem consulta aos órgãos responsáveis. Foto tirada em 2009. Acervo: AAPAH/Bruno Leite de Carvalho.
 
 
 
É comum que em nosso país não haja respeito ao patrimônio cultural, embora sejamos um dos países mais ricos em diversidade cultural e vanguardistas no que tange ao desenvolvimento de políticas públicas de preservação do Patrimônio Cultural. 
 
Pois bem, ainda assim, bens tombados por lei ou decreto sofrem depredações ou são demolidos sem a menor cerimônia. Além do bem em si, é protegido também o seu entorno, para que haja visibilidade e construções vizinhas não o atrapalhem.  
 
Proteger o entorno do bem é uma medida necessária, para que outras construções não impeçam ou atrapalhem a sua visibilidade pela população. O Decreto-Lei nº 25/1937, recepcionado pela Constituição Federal de 1988 prevê, em seu artigo 18, in verbis: 
 
Art. 18 – Sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto. 
 
 
Entendamos aqui vizinhança como o entorno do Bem Tombado. Veja que pequenas alterações como colocar cartazes (outdoors, banners, etc), erguer ou reformar edificações próximas ao Bem Tombado devem ser aprovadas pelo órgão de preservação do patrimônio local. Isto quer dizer que mesmo modificações pequenas no entorno, precisam ser aprovadas previamente pelo Conselho de Patrimônio. A legislação municipal de Guarulhos é cristalina neste sentido. 
 
Vejamos o que diz a Lei 6.573/2009, que dispõe sobre o funcionamento do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e estabelece normas para a preservação e proteção do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos, além de dar outras providências: 
 
Art. 28. O Poder Público Municipal tomará as medidas administrativas e judiciais cabíveis à proteção de bens sujeitos a sua tutela.
 
Art. 29. O bem tombado não poderá ser destruído, demolido, mutilado, desmontado ou abandonado, ressalvado o disposto no artigo 26 desta Lei. 
Parágrafo único. Caberá ao Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos analisar e aprovar projetos e serviços de reparação, pintura ou restauração ou qualquer obra de intervenção nos bens móveis e imóveis tombados e de sua área de entorno.
 
Art. 31. A fixação de painéis e letreiros sobre imóveis tombados e nas respectivas áreas de entorno no Município de Guarulhos deverá ter prévia aprovação do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos.
 
Art. 38. Os imóveis tombados terão área de entorno, ambiência ou vizinhança, para proteção da unidade arquitetônica e paisagística, na qual não será permitida a execução de construção, obra ou serviço que interfira na estabilidade, ambiência e/ou visibilidade dos referidos bens.
 
Art. 39. O entorno do bem tombado será delimitado em processo instruído pelo Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos, no prazo de 60 (sessenta) dias, após a data da homologação do tombamento. A decisão do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos será enviada ao Chefe do Poder Executivo Municipal para homologação.
§ 3º Enquanto o Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos não houver delimitado a área de entorno do bem tombado, esta será delimitada pelas quadras circunvizinhas imediatas do bem em questão.
Isto quer dizer que, as casas no entorno do bem, mesmo as de propriedade particular, são parte do entorno do bem tombado.
Demolir ou depredar bens no entorno do bem tombado é considerado Infração pela Lei 6.573/2009, que prescreve:
 
Art. 42. Constitui infração, para efeito desta Lei, qualquer ação ou omissão que importe na inobservância dos seus preceitos, bem como aos do regulamento e demais normas dela decorrentes. 
 
Art. 43. As penalidades pelas infrações previstas nesta Lei não excluem a tomada de outras medidas e a aplicação de outras sanções pelas autoridades municipais competentes, inclusive pela via judicial, com respaldo na Legislação Federal. 
Parágrafo único. O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico, Ambiental e Cultural do Município de Guarulhos comunicará ao Ministério Público Estadual as infrações cometidas, para as providências civis e penais cabíveis.
 
Art. 44. Sem prejuízo das demais medidas estabelecidas em normas federais, estaduais e municipais, os infratores sujeitar-se-ão às seguintes sanções:
I – multa;
VII – obrigação de reparar e indenizar os danos que houver causado independentemente da existência de culpa ou dolo;
§ 1º A multa de que trata o inciso I deste artigo, no caso de bens imóveis, corresponderá a, no mínimo, 30% (trinta por cento) e no máximo 100% (cem por cento) do valor venal do respectivo bem tombado.
Além disso, destruir patrimonio histórico é CRIME, conforme nosso Código Penal preleciona: 
Art. 165 – Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de valor artístico, arqueológico ou histórico:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
 
Com efeito, a Lei nº 9.605/98, que Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências, no Capítulo concernente aos crimes contra o meio ambiente (V), em sua seção IV, trata dos crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural (artigos 62 a 65), senão vejamos: 
 
Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar:
I – bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;
II – arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:
Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.
 
Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida:
Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.
 
Art. 64. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida:
Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.
 
Portanto, é nosso dever cuidar de nosso patrimônio histórico, e denunciar quaisquer violações aos nossos bens tombados, bem como seu entorno, ao Ministério Público Estadual e ao Conselho de Patrimônio Histórico e Artístico de Guarulhos, que tomarão as devidas providências legais cabíveis.
 

Advogado, especialista em Direito do Entretenimento, Patrimônio Histórico e Cultura. Pós-graduando em Gestão Cultural pela Universidad Nacional de Córdoba – Argentina. É membro da AAPAH – Associação Amigos do Patrimônio e Arquivo Histórico e Pai do Ariel.

 

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