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ESPAÇO AAPAH – O último sarau da Casa dos Cordéis

Legenda: Bosco Maciel na varanda da Casa dos Cordéis. Ano: 2009. Acervo: AAPAH/Bruno Leite de Carvalho.
 
 
Quem passava pela avenida Torres Tibagi, número 90, talvez, não sabia o que acontecia dentro daquele casarão, mas com certeza não deixava de notar os bonecos que ficavam expostos pela calçada.
 
Hospedada no Casarão da Família Nader, o Instituto Casa dos Cordéis durante onze anos abrigou exposições, saraus, shows, reuniões, foi cenário de filme, entre outras atividades. O projeto levado nas costas pelo poeta, folclorista e cantador, Bosco Maciel, projetou vários artistas e poetas da cena cultural guarulhense.
 
 O instituto de cultura popular fechou suas portas com seu último sarau no dia 28/08/2016. Na entrevista abaixo, Bosco Maciel fala sobre a Casa dos Cordéis e o futuro.
 
 
Espaço AAPAH – Como surgiu a ideia de montar a Casa dos Cordéis? 
Bosco Maciel – Em 2005, descobri este imóvel no Gopoúva, que aluguei para guardar meu acervo. Mas, com o tempo nasceram as atividades culturais com forte viés para a nossa cultura popular do Brasil. A Casa dos Cordéis esteve em atividade no bairro por onze anos. 
 
Espaço AAPAH – O que fará com todo acervo de fotos, bonecos, fantasias e adereços? Como vai guardar? 
Bosco Maciel – O acervo (equipamentos, fotos, bonecos, fantasias, adereços, livros, folhetos de cordel, quadros, etc.) está sendo guardados no apartamento que resido, e em um imóvel que tenho. 
 
Espaço AAPAH – Você tem ideia de quantos artistas e movimentos surgiram na casa? 
Bosco Maciel – Foram muitos Artistas e Grupos populares de Guarulhos, de São Paulo, e do Brasil que mostraram seus Talentos em nosso teatro. Além dos saraus, lançamento de livros, exibição de filmes, exposições de artes, festas populares, e outras atividades culturais, aconteceram mais de 480 apresentações artísticas neste período, em nosso teatro. 
 
Espaço AAPAH – Qual o maior legado que a Casa dos Cordéis deixou? 
Bosco Maciel – O maior legado foi a consciência incrustada Brasil afora, de que, nossas culturas populares são o grande tesouro que os brasileiros ainda desconhecem. 
 
Espaço AAPAH – Há a possibilidade de o projeto voltar em outro prédio? 
Bosco Maciel – Sim. Logo que conseguir um local em Guarulhos em que tenhamos condições de custear o projeto, retornaremos as atividades culturais. 
 
Espaço AAPAH – As atividades externas como “A Procissão do Fogaréu” e “Romaria de Bonsucesso” vão continuar? 
Bosco Maciel – Tenho a obrigação como folclorista, de passar estas atividades para grupos ou instituições culturais de Guarulhos para que sigam dando sequencia a estas festas populares. Assim, me sobrará mais tempo para trazer para a cidade, tradições seculares como as cavalhadas (muito comuns em cidades do interior de Goiás). 
 
Espaço AAPAH – Qual a maior dificuldade para manter um centro cultural? 
Bosco Maciel – No caso da Casa dos Cordéis, a maior dificuldade foi o custo financeiro. Não que fosse caro, mas como sou aposentado, não disponho de recursos suficientes para custear o Projeto. Consegui manter o projeto em funcionamento por onze anos, por que nos primeiros seis anos, eu trabalhava em grandes empresas e custeava a casa com recursos próprios. Aí parei de trabalhar, então iniciei um projeto de coleta de contribuições junto com o poeta e jornalista, Castelo Hanssen, que durou dois anos. E, nos últimos três anos, custeei o projeto com o dinheiro que eu ganhava como arte-educador do Ponto de Cultura (convênio que tínhamos com a Secretaria de Cultura de Guarulhos e Ministério da Cultura) mais algumas contribuições de amigos que admiram os trabalhos da Casa dos Cordéis. Mas, o projeto foi concluído no mês de julho deste ano de 2016 (os Pontos de Cultura tem a duração de três anos). Hoje, apesar de tentar várias alternativas, não existem meios de como seguir com bancando o projeto.
 
Espaço AAPAH – Bosco, o que você fará sem a Casa dos Cordéis? Sabemos que era seu projeto de vida? 
Bosco Maciel – Buscarei condições e forças para seguir em frente. A Casa dos Cordéis não existirá no Gopoúva, mas renascerá em outro local de nossa cidade. Entretanto, se não houver condições mesmo para atuarmos em Guarulhos, aí Casa dos Cordéis seguirá com suas atividades culturais em outra cidade. 
 
Espaço AAPAH – Faça um balanço de todos esses anos de Casa dos Cordéis? O que ficou de aprendizagem e o que poderia ter feito diferente? 
Bosco Maciel – A aprendizagem foi muito grande. Tornamos o projeto cultural conhecido em todo Brasil. Quanto ao que poderia ser feito de forma diferente, estou certo que tentei de tudo para dar sustentabilidade ao projeto. Mas, é cada vez mais forte a certeza de que, trabalhar com cultura em nosso país é realmente muito difícil. Mas, nada impede de seguirmos lutando. Pois, sabemos que a educação e a cultura são as únicas ferramentas que – em última instância – alçarão o Brasil ao patamar que lhe é devido. E, isto já é um grande estímulo para seguirmos em frente com todo nosso entusiasmo.
 

[1] Jornalista, responsável pela assessoria de comunicação da AAPAH, coautor dos livros “Guia Histórico Cultural de Logradouros – Lugares e Memórias de Guarulhos” e “Signos e Significados em Guarulhos: Identidade – Urbanização – Exclusão”.

 

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