Variedades

Espetáculo sobre o universo de Jorge Amado une dança, música, teatro e circo

“Eu vi chover, eu vi relampear / Mas mesmo assim o céu estava azul.” O trecho da canção Oxóssi, de domínio público, dá início ao espetáculo Amado, que faz nova temporada a partir deste sábado, 17, no Teatro do Sesi. E esse olhar leve e otimista, presente nos versos, também diz muito sobre os próprios artistas que compõem o elenco, ligados ao Instituto Brincante.

Após quase perder sua sede, no ano passado, o espaço fundado em 1992 por Antonio Nóbrega e Rosane Almeida conseguiu manter seu projeto ligado às manifestações populares brasileiras (leia mais abaixo). Referências que são incorporadas naturalmente ao espetáculo Amado, em uma mistura poética de dança, música, teatro e circo.

Concebida e dirigida por Rosane, a criação se inspira no universo e na literatura de Jorge Amado. É da obra Gabriela, Cravo e Canela, por exemplo, que saem as personagens Quinquina e Florzinha, que, no palco, funcionam como narradoras. São elas as responsáveis por apresentar e costurar cada cena do espetáculo, todas independentes e inspiradas em um ou mais livros.

Em comum, as histórias apresentam a(s) ideia(s) de amor na obra do escritor baiano. Mas nem sempre de forma explícita. “É um amor contado por vários ângulos, porque as pessoas não amam só umas às outras – elas amam a bebida, a confusão, a solidão, o medo”, observa Rosane, durante ensaio acompanhado pelo jornal O Estado de S.Paulo.

No palco, os nove artistas que compõem o elenco exercem múltiplas funções. Dançarinos, como Antônio Meira e Fláira Ferro, fazem as vezes de atores. A cantora e percussionista Flora Poppovic não só integra a banda que toca ao vivo a trilha sonora como também declama textos. A própria Rosane interpreta, dança, toca sanfona. E assim por diante.

Muito desse processo criativo foi inspirado nas tradições brasileiras, em manifestações como o reisado e o cavalo marinho. “As festas populares agregam várias linguagens artísticas, o que é algo muito rico, porque elas abrem espaço para todo tipo de vocação”, analisa a diretora.

Uma parte do espetáculo que melhor sintetiza essa multiplicidade é quando todo o elenco se une, em uma grande roda, para tocar pandeiro. “Ele é um instrumento que é usado em todo o Brasil; e não existe um jeito certo de tocá-lo, há várias maneiras.” No palco, os artistas usam não só as mãos, mas o corpo todo para tocá-lo. Então, o que começa como um número de percussão acaba virando uma grande coreografia.

Para chegar a esse resultado, a preparação artística foi baseada na troca de experiências entre os integrantes do grupo, em um artista ensinar o que faz de melhor ao outro. “Todo o processo do Amado, desde os ensaios, foi um processo de compartilhamento de saberes; porque, se as pessoas sabem, elas têm de trocar isso umas com as outras”, diz Rosane.

Dona Flor e Seus Dois Maridos ganhou espaço em uma bonita e delicada coreografia, protagonizada por Fláira Ferro, Antônio Meira e Cristiano Meirelles. Os movimentos são embalados pela canção A Flor, composta especialmente para o espetáculo por Alencar Martins, violonista que integra o elenco. Dança e música já são suficientes para relembrar a famosa história, sem encenações teatrais.

Um dos momentos em que o viés musical de Amado ganha maior evidência é no repente que leva o nome do espetáculo. Ali, aparecem em cena instrumentos improvisados, como o marimbau e o tambor de água. Neste último, tocado com baquetas, o som é obtido por meio de uma cabaça que flutua em uma bacia dágua. A música, assinada por Antônio Marinho e Leonardo Gorosito, faz referência, em sua letra, a diversas obras, como Capitães de Areia, Tocaia Grande e Jubiabá.

Trilha sonora

A princípio, a ideia de Rosane Almeida e do diretor musical Leonardo Gorosito era selecionar para o espetáculo canções de um conterrâneo de Jorge Amado, o compositor Dorival Caymmi. Mas os custos com direitos autorais seriam altos demais. O que parecia um empecilho acabou virando oportunidade.
Os músicos do elenco começaram, então, a compor letras e melodias especialmente para a ocasião. “O Alencar (Martins) assumiu muito isso, e começou a compor várias músicas; mas ele não falava nada antes, chegava já com a ideia pronta”, relembra Gorosito.

Além de composições feitas pelo elenco, a trilha sonora de Amado ainda inclui temas tradicionais, de domínio público. Deu tão certo que ela foi gravada em CD (R$ 20), que será lançado e vendido durante essa temporada no Teatro do Sesi. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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