Por que a segunda onda de casos de microcefalia no Brasil foi menor do que a de 2015? Em artigo publicado no New England Journal of Medicine, pesquisadores brasileiros lançam três hipóteses para a expressiva redução de casos novos em 2016, quando comparada com 2015.
Os autores – entre eles, Wanderson Oliveira, Cláudio Maierovitch e Eduardo Hage – observaram uma semelhança importante na evolução epidemiológica entre dois problemas relacionados ao zika, a Síndrome de Guillain-Barré e microcefalia.
Em 2015, quando a epidemia de zika atingiu sobretudo a região Nordeste do País, foi registrado um aumento muito importante da síndrome, até então considerada rara. Os casos ocorriam em média 3 semanas depois do aparecimento dos primeiros sintomas de zika. Pacientes com a síndrome apresentam uma paralisia progressiva, começando pelos membros inferiores e podendo chegar ao pulmão.
Quase quatro meses depois desse aumento inesperado de Guillain-Barré, os casos de microcefalia começaram a surgir. Autores notaram que os gráficos (formados a partir da distribuição do número de novos casos ao longo das semanas) de Guillain-Barré e de microcefalia praticamente se repetiam. “O comportamento era muito parecido, com uma diferença de 23 semanas entre eles”, conta Cláudio Maierovitch, pesquisador da Fiocruz.
Em 2016, a curva de Guillain-Barré se repetiu. “A distribuição de casos ao longo das semanas foi muito semelhante ao de 2015”, diz Maierovitch. Para alívio de profissionais de saúde e da população em geral, no entanto, o aumento de casos de microcefalia, esperado para tempos depois, não ocorreu.
Pesquisadores citam três hipóteses para explicar a mudança de comportamento. A primeira delas é a redução importante da circulação do zika. Os casos de Guillain-Barré teriam sido consequência não de uma reação ao zika, mas de chikungunya, vírus também transmitido pelo Aedes aegypti e igualmente associado à Guillain-Barré.
“Experiências de outros países mostram que a chikungunya também provoca a síndrome, mas com menos frequência do que a zika”, explica o pesquisador da Fiocruz. Isso poderia justificar em parte o número de casos de pacientes com a síndrome não tenha aumentado muito, em relação a 2015. “A epidemia de chikungunya foi em grandes proporções. Mas acredita-se que sua capacidade de provocar a síndrome seja menor do que zika.”
A segunda hipótese é de que a epidemia registrada no Nordeste de microcefalia esteja associada a um outro fator, ainda não identificado. “A transmissão do zika da mãe para o bebê pode ser um dos fatores da microcefalia, mas talvez não o único. Uma possibilidade é a de que esse fator associado não tenha se repetido em 2016.” Autores citam ainda a hipótese de que o medo da microcefalia tenha reduzido o número de gestações em 2016 ou ampliado os casos de aborto. “São três hipóteses. Uma não exclui a outra”, diz Mairovitch.