Os Estados Unidos iniciaram nesta quinta-feira, 12, uma operação para retirar civis da embaixada americana em Cabul, frente ao rápido avanço do Taleban e à deterioração da segurança no Afeganistão. A ação envolve três batalhões de infantaria e cerca de 3 mil soldados. O trabalho diplomático será mantido apesar da equipe reduzida, afirmou o porta-voz do Departamento de Estado americano, Ned Price.
As tropas estão a caminho do Aeroporto Internacional Hamid Karzai, na capital afegã, onde devem chegar nas próximas 24-28 horas, informou o secretário de imprensa do Pentágono, John Kirby.
A Embaixada americana em Cabul tem cerca de 4 mil funcionários. O número de civis é desconhecido. Price disse a repórteres em Washington que a retirada, que inclui cerca de 1.400 cidadãos americanos, ocorreria nos próximos dias.
"Como sempre dissemos, o ritmo acelerado dos avanços militares do Taleban e o consequente aumento na violência e instabilidade em todo o Afeganistão são de grande preocupação", disse ele. "Temos avaliado a situação de segurança, todos os dias, para determinar a melhor forma de manter seguros os que servem em nossa embaixada."
Price afirmou, no entanto, que o trabalho diplomático continua. "Deixe-me ser muito claro sobre isso: a embaixada permanece aberta", declarou aos repórteres.
A operação desta quinta-feira indica que o governo Biden tem dúvidas sobre a capacidade do governo afegão de fornecer segurança diplomática suficiente na capital. Paralelamente, negociadores americanos tentam obter do Taleban alguma garantia de que a embaixada não será atacada, disseram duas autoridades ao <i>The New York Times</i>.
Como um plano de contingência no caso de qualquer esvaziamento da embaixada se transformar em uma luta com o Taleban, funcionários do Departamento de Defesa encarregaram milhares de fuzileiros navais de iniciar um exercício de treinamento que pode, se necessário, rapidamente ser transformado em um desdobramento de retirada, disseram as autoridades. Os fuzileiros navais foram informados de que podem precisar estar prontos dentro de 96 horas, disseram as autoridades.
Nesta quinta-feira, a Embaixada enviou o último de uma série de alertas alarmantes, instando os americanos a "deixar o Afeganistão imediatamente usando as opções de voos comerciais disponíveis".
<b>Avanço</b>
As forças do governo afegão estão entrando em colapso mais rápido do que os líderes militares dos EUA esperavam. Desde o anúncio de retirada das tropas americanas, em abril, o Taleban promove uma ofensiva que já lhe deu controle efetivo de cerca de dois terços do país, embora tenha apenas cerca de 75 mil combatentes, frente a 300 mil soldados das forças afegãs treinados por americanos.
O grupo insurgente capturou mais três capitais provinciais na quarta-feira, 10, e outras duas nesta quinta-feira, 11. Entre os territórios capturados, está a terceira maior cidade do país, Herat.
Um alto funcionário do governo Biden disse em uma entrevista que o Taleban pode em breve tomar Mazar-i-Sharif, a capital da província de Balkh e o motor econômico do país. A queda de Mazar-i-Sharif e Kandahar, disse o funcionário, pode levar à rendição do governo afegão até setembro.
A avaliação militar americana mais recente, levando em consideração os últimos ganhos do Taleban, diz que Cabul pode estar sob pressão dos insurgentes em setembro e que o país pode cair inteiramente nas mãos do Taleban dentro de alguns meses, de acordo com um oficial de defesa que falou sob condição de anonimato.
<b>Possibilidades</b>
A estimativa de 30 dias é um cenário. O governo americano e as autoridades militares insistem que a queda de Cabul ainda pode ser evitada se as forças de segurança afegãs puderem reunir a determinação para oferecer mais resistência.
"Eles têm muitas vantagens que o Taleban não tem", disse Kirby, referindo-se às forças de segurança nacional do Afeganistão. "O Taleban não tem força aérea, o Taleban não possui espaço aéreo. Eles têm muitas vantagens. Agora, eles têm que usar essas vantagens. "
Mas, embora os comandos afegãos tenham conseguido continuar lutando em algumas áreas, eles praticamente se fecharam em várias capitais de províncias do norte.
O governo do presidente Ashraf Ghani falhou em realizar qualquer tipo de estratégia para defender as cidades que permaneceram sob seu poder ou retomá-las, apesar de ter dito que o faria. Forças milícias pró-governo, defendidas por oficiais afegãos e que lembram a sangrenta guerra civil da década de 1990, têm sido constantemente incapazes de empurrar o Taleban para trás.
Na quarta-feira, Ghani substituiu o chefe do exército do país e nomeou um novo comandante militar, no que foi uma de suas ações mais públicas até agora para enfrentar a ofensiva do Taleban.
Os militares americanos, por sua vez, ainda estão apoiando, até certo ponto, as forças do governo do Afeganistão com ataques aéreos. Mas esses ataques limitaram-se em grande parte à parte sul do país, em torno de Kandahar. Isso se deve à logística: agora que os Estados Unidos se retiraram da Base Aérea de Bagram, no norte, e retiraram seus aviões de guerra e seus enormes sistemas de apoio, é mais difícil chegar ao norte. Esses ataques podem exigir reabastecimento aéreo e ter outros obstáculos logísticos que os tornam mais difíceis de conduzir.
Os ataques aéreos americanos estão programados para terminar quando os EUA encerrarem formalmente seu papel na guerra em 31 de agosto. Biden poderia estendê-los, mas dada sua posição firme sobre o fim da guerra, isso parece improvável.
<b>Tensão</b>
Zalmay Khalilzad, o principal enviado americano em negociações com o Taleban, está liderando o esforço diplomático de proteção da embaixada. Khalilzad espera convencer os líderes do Taleban de que a embaixada deve permanecer aberta e segura, se o grupo espera receber ajuda financeira americana e outra assistência como parte de um futuro governo afegão. A liderança do Taleban disse que quer ser vista como um administrador legítimo do país e está buscando relações com outras potências globais, incluindo Rússia e China, em parte para receber apoio econômico.
Price não quis comentar na quarta-feira, mas disse que o financiamento estaria condicionado ao fato de os futuros governos afegãos "terem qualquer aparência de durabilidade".
"A legitimidade concede, e é essencialmente a passagem, para os níveis de assistência internacional, assistência humanitária ao povo afegão", disse ele.
Cinco funcionários atuais e ex-funcionários descreveram o clima dentro da embaixada como cada vez mais tenso e preocupado, e diplomatas na sede do Departamento de Estado em Washington notaram uma sensação de depressão tangível com o fantasma de fechá-la, quase 20 anos depois que os fuzileiros navais recuperaram o prédio incendiado em dezembro de 2001.
Várias pessoas relembraram tristemente outro acontecimento que todos querem evitar agora: a queda de Saigon em 1975, quando americanos foram retirados da embaixada de um telhado por helicóptero. (Com agências internacionais)