Estadão

EUA: republicanos ameaçam isenção fiscal da Disney por oposição a leis anti-LGBT

A guerra cultural americana atingiu seu ápice na última semana, quando o governador da Flórida, Ron DeSantis, assinou uma lei para acabar com o estatuto que permite à gigante do entretenimento Disney atuar como um governo local na região onde instalou seu parque de atrações em Orlando.

A mudança legislativa, aprovada pelo Parlamento estatal nesta semana, é consequência de uma disputa política entre o líder republicano e a empresa, iniciada após o diretor executivo da Disney, Bob Chapek, criticar publicamente uma lei aprovada por DeSantis em março que proíbe o ensino de assuntos relacionados à orientação sexual e identidade de gênero na Flórida.

"(A Disney) é uma empresa com sede em Burbank, Califórnia, e usa seu poder econômico para atacar os pais do meu Estado. Vemos isso como uma provocação e vamos lutar contra isso", declarou o governador ao assinar a lei. O status especial da Disney "era uma aberração", disse DeSantis em uma entrevista coletiva. "Nenhum indivíduo ou nenhuma empresa na Flórida é tratado dessa maneira."

A Disney perderá seu estatuto especial a partir de junho de 2023. Embora o impacto financeiro na empresa e no Estado seja incerto, a mudança pode alterar a forma como a Disney opera seu extenso império na Flórida Central e azedar o relacionamento, até então próximo, que ela mantinha com governos estaduais há mais de 50 anos.

DeSantis é um potencial candidato republicano às eleições de 2024. No vácuo de liderança deixado pelo ex-presidente Donald Trump, DeSantis vem cortejando eleitores conservadores em questões como imigração, aborto e direitos LGBT. Com seu último movimento contra a Disney, ele poliu suas credenciais conservadoras, mostrando que está disposto a enfrentar o que descreveu como uma empresa "militante" com sede na Califórnia que não compartilha os valores da Flórida.

Mas a decisão de DeSantis não é individual e segue uma tendência nacional. Parlamentares republicanos de todo o país estão promovendo uma série de projetos de lei que limitam a discussão de direitos LGBT nas escolas. Os mais radicais tratam defensores da comunidade como "sequestradores" que recrutam crianças para sua própria sexualidade ou identidade de gênero. Um dos principais republicanos do Senado criticou recentemente os fundamentos legais de uma decisão da Suprema Corte de 2015 que afirma o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo – uma decisão que tem amplo apoio público.

Muitos republicanos argumentam que seus recentes esforços legislativos são voltados para dar aos pais mais controle sobre a educação de seus filhos e não visam marginalizar a comunidade LGBT. Em vez disso, dizem eles, a pressão conservadora em torno das escolas públicas é uma espécie de resposta ao ensino de "teoria racial crítica" nas escolas.

Mas a movimentação incisiva vem despertando críticas dentro do próprio partido. Alguns republicanos temem que as iniciativas possam sair pela culatra com eleitores moderados, que não concordam com uma agenda anti-LGBT.

"A curto prazo, é um assunto que traz um bom capital político, e é por isso que vemos tantos Estados fazendo projetos de lei parecidos", disse Tim Miller, ex-porta-voz da candidatura presidencial do republicano Jeb Bush em 2016. "Mas acho que há alguns grandes riscos para os republicanos. Há uma razão pela qual a política sobre o casamento LGBT mudou tão rapidamente: a grande maioria deste país não quer ver gays ou pessoas trans como alvos."

Charles Moran, presidente do Log Cabin Republicans, um grupo republicano que defende a igualdade entre heterossexuais e LGBTs americanos, disse que não se opõe à lei dos Direitos dos Pais na Educação da Flórida, que ele considera limitada em escopo.

Mas seu grupo está se esforçando para desenvolver uma estratégia legislativa estadual para rastrear outras leis de direitos dos pais que estão circulando pelo país e seriam mais agressivas contra a comunidade LGBT. "Cada uma dessas leis é diferente em cada Estado, e algumas delas são realmente perigosas", disse Moran. "Em alguns casos, vamos sair e nos opor."

A onda de novas iniciativas surpreendeu Moran. "Eu não estava preparado para fazer isso este ano", disse ele. "Estou tendo que construir rapidamente uma equipe de análise legislativa para realmente analisar e identificar os Estados que têm esses projetos de lei."

O Partido Democrata, por sua vez, vem classificando as medidas republicanas como hostis. "Esta é uma questão de cunho político e uma tentativa de vencer uma guerra cultural", disse a secretária de imprensa da Casa Branca, Jen Psaki, em uma recente entrevista em podcast. "E eles estão fazendo isso de uma maneira que é dura e cruel para uma comunidade de crianças."

"Vou me emocionar com esse problema, porque é horrível", continuou Psaki. "São crianças que sofrem bullying, e todos esses líderes estão tomando medidas para machucá-los, às suas vidas e às suas famílias."

<b>Futuro</b>

O distrito especial da Disney, Reedy Creek Improvement District, foi aprovado em 1967 pelos congressistas da Flórida para facilitar a construção do parque Walt Disney World perto de Orlando. O parque ocupa um espaço de 100 km2 e inclui duas cidades e terrenos nos condados de Orange e Osceola, no centro do Estado. Em virtude do acordo, a Disney administra o distrito como se fosse um governo local, arrecadando impostos e garantindo serviços públicos essenciais como coleta de lixo, tratamento de água, etc.

A decisão de anular o estatuto especial levantou dúvidas sobre o futuro da área onde o parque está localizado. Segundo as leis estaduais, se o distrito especial for dissolvido, seus bens e dívidas serão transferidos para os governos locais que circundam o território. "Isso poderia repassar US$ 2 bilhões da dívida da Disney para os contribuintes" de Orange e Osceola, tuitou a senadora democrata Linda Stewart. (Com agências internacionais).

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