Com orçamentos apertados – especialmente por ser este um ano de crise -, equipamentos culturais públicos do Rio de Janeiro se valem de aluguéis para eventos privados para manter as contas em dia. E a iminência dos Jogos Olímpicos de 2016 está trazendo mais recursos: a Casa de Cultura Laura Alvim, em Ipanema, será alugada pela relojoaria suíça Omega, sendo a contrapartida uma vultosa obra infraestrutural que vai preceder a competição; a Cidade das Artes está sendo negociada com a comitiva do Japão – valores não foram divulgados, mas a dificuldade de custeio da enorme e sofisticada casa de espetáculos da Barra da Tijuca é notória.
Principal palco do Rio, o Teatro Municipal é o mais cobiçado por organizadores de premiações, concertos e shows fechados. Já abrigou, entre outros, o Grande Prêmio do Cinema Brasileira e o Prêmio Craque do Brasileirão, da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), e anualmente serve de cenário ao Prêmio da Música Brasileira, em sua 26ª edição.
Em média, o teatro recebe cerca de R$ 3,5 milhões por ano em contratos de permissão de uso para eventos – foi assim em 2014 e em 2013, e o valor deve se repetir em 2015. A quantia é bastante expressiva: representa 77% do orçamento estimado para investimentos em produções até dezembro, que é de R$ 4,5 milhões.
“Eu encaro como uma possibilidade de receita, um plus, mas é algo secundário, que entra nas brechas da programação. O teatro é do Estado, é mantido pelo contribuinte, e sua vocação é produzir ópera e balé. Não pode ser mercantilizado”, defende o novo presidente da Fundação Teatro Municipal, o compositor João Guilherme Ripper, que assumiu o cargo há menos de dois meses, vindo da direção da Sala Cecília Meireles, o segundo palco da música erudita da cidade.
O posicionamento da nova direção agradou aos corpos artísticos da casa – balé, orquestra e coro -, que se ressentem do grande número de eventos privados por lá. “A gente reclamava muito na gestão passada (da diretora de filmes e óperas Carla Camurati, que deixou o cargo em janeiro, para se dedicar à programação cultural dos Jogos Olímpicos) porque os eventos eram pensados em detrimento da programação. Tinha ensaio desmarcado em cima da hora por causa disso. A gente entende que a manutenção do teatro é cara, mas não dá para sacrificar a nossa produção”, diz a representante da orquestra, a instrumentista Jesuina Passaroto.
Na Cecília Meireles, o aluguel para a realização do concerto de aniversário de 25 anos da empresa Assim Saúde, em maio, saiu a R$ 25 mil; a gravação do CD do pianista Aleyson Scopel, em três datas em março e em maio, R$ 2 mil por dia.
No total, a Fundação de Artes do Estado do Rio (Funarj), à qual estão vinculados a Sala e os cinco teatros, os cinco museus e as três casas de cultura do Estado, além da Escola de Música Villa-Lobos, recebeu de janeiro a junho R$ 62.265,00 de origem privada. O montante representa cerca de 15% da renda advinda com bilheteria dos teatros.
“Nosso principal foco é sempre manter os teatros com espetáculos abertos ao público, pois sabemos da importância do teatro como agente transformador dos espectadores. Essa é uma receita que não é impactante, mas é bem-vinda, ainda mais num ano de crise como este”, considera o presidente da Funarj, Felipe Marron. Os contratantes em geral pedem a disponibilidade com poucos meses de antecedência, segundo ele, e se encaixam nas datas que ainda estiverem abertas.
Marron cita a Casa de Cultura Laura Alvim, construção centenária no começo da Praia de Ipanema, como um exemplo de bom negócio para o Estado: a Omega vai custear uma grande obra na casa, que vai abarcar as instalações elétrica e hidráulica (os valores não foram divulgados). Os dois teatros, fechados desde fevereiro em decorrência do mau estado de conservação, serão inteiramente reformados, e a fachada será pintada.
“A casa vai fechar nos primeiros meses de 2016 e reabrir como Casa da Suíça, totalmente revitalizada. É um legado importante para a população. Se não fosse isso, essas obras não seriam feitas, porque o Estado não tem dinheiro”, avalia.
Diretora da Laura Alvim de 2002 ao começo de 2015, Lygia Marina de Moraes vê o investimento com bons olhos. “Os teatros não são reformados há muito tempo, e chovia na cabeça do público. Fizemos vários eventos que ajudaram a casa financeiramente. Criticar e dizer que isso é privatização do espaço público é uma tolice, porque o Estado não dá conta da manutenção e é possível conciliar tudo”.
A Prefeitura não informou quanto a Cidade das Artes poderá embolsar com os japoneses. O orçamento para 2015 é de R$17.088.200, bem abaixo do ideal para manter a casa funcionando bem.