Tarso Marques chega por volta das 11h à agência de carros importados Deutsch Sports Car, no Jardim América, zona oeste de São Paulo. Percorre um tapete vermelho que corta o chão da loja e passa ao lado de uma série de Porsches em direção ao amigo Nicola e à reportagem do Estadão, que o aguarda para um bate-papo. Vai falar do que mais gosta de fazer na vida, pilotar carros de competição. E também de como quase perdeu a vida para a covid.
Tarso cumprimenta a todos e se coloca à disposição. Tem um ar jovial no rosto que transmite paz. Parece feliz e aliviado. Em março do ano passado, esse curitibano não fazia ideia de que sairia vivo do hospital ao enfrentar um dos maiores dramas pessoais de seus 46 anos de vida. "Cheguei até a preparar o meu testamento", revela.
Um ano depois, recuperado da covid-19 que comprometeu 85% dos seus pulmões e sem sequelas, orgulha-se de mais uma de suas conquistas na carreira. Ex-piloto da Fórmula 1, Tarso vai se juntar a Christian Fittipaldi e Nelsinho Piquet como um dos poucos brasileiros que correram pela Nascar Cup Series, prestigiada categoria americana do automobilismo. A estreia será no dia 3 de julho, no Kwik Trip 250 Road America, Elkhart Lake, no Estado de Wisconsin. Depois disso, Tarso Marques ainda vai pilotar em mais sete etapas do campeonato.
Com contrato de três anos com a equipe Stange Racing, ele sabe que o ponto principal nesta temporada é aperfeiçoar o carro número 79, que está sendo montado do zero, para tentar algo mais promissor nas próximas temporadas.
"O ideal é primeiro tentar se classificar para as corridas. Depois, terminá-las e, por fim, tentar ir melhorando no grid", disse o piloto. "Estou muito ansioso porque já tem alguns anos que não corro."
A última competição oficial da qual participou foi a Endurance Brasil, em 2019, antes de pegar covid. Nem por isso, ele se vê desmotivado. "Estarei em uma situação difícil, a equipe é nova. Eu sei que vou pegar uma pedreira, sou bem pé no chão, mas estou ansioso. A hora que o carro começar a ser montado, quando tirarem a primeira peça da caixa, quero estar lá ao lado para acompanhar o processo", acrescentou.
Poder participar mais uma vez de um campeonato no automobilismo é uma vitória pessoal de Marques. Em março de 2021, ele contraiu a covid e encarou a batalha pela vida como a mais importante de sua história.
"Nos primeiros seis dias, eu cheguei a fazer exames e não foi constatado nada", explicou. "Achava que, se pegasse covid, não sentiria nada por ser atleta e por estar bem preparado fisicamente. Estava me cuidando, tinha muita preocupação com meus pais e não queria ter me infectado por causa da quarentena."
Mas no 12º dia da doença, a quarentena foi um dos seus menores problemas. Ele teve uma piora súbita e foi parar no hospital. Tarso relata ter recebido várias ligações da mãe. O pedido da matriarca era um sexto sentido para algo grave que estava por vir.
"Neste dia, minha mãe me ligou mais de dez vezes, eu cheguei a ameaçar bloqueá-la no celular. Como não a atendi, ela ligou para a minha mulher pedindo para que fosse ao médico. Eu participei de um compromisso na internet, uma live, e depois passei a monitorar minha temperatura que começou a subir. Quando chegou a 39ºC resolvi ir para o pronto socorro", relatou o piloto.
Ao chegar ao centro médico, o piloto realizou exames mais específicos e uma tomografia constatou que seus pulmões estavam 70% comprometidos. Sem acreditar no diagnóstico, Tarso Marques pediu que fossem realizados novos testes.
Durante aquela madrugada, ele conta ter começado a sentir os primeiros sintomas da doença e viu o seu quadro se agravar. Em nova tomografia, realizada por outra equipe médica já na parte da manhã do dia seguinte, foi constatado que a doença já havia avançado e que agora os seus pulmões já estavam com 85% de comprometimento.
"Na época não havia vagas e improvisaram uma UTI no quarto mesmo", recorda. No período, chegou a sofrer uma parada cardíaca. Ao todo, foram 11 dias de internação na UTI adaptada. Após uma pequena melhora, mas ainda sem estar 100% recuperado, Marques resolveu seguir o tratamento em casa para liberar a vaga no hospital.
O processo para recuperar a forma física foi lento. Por causa dos vários remédios que teve de tomar no período, afirma ter engordado 20 kg. Quatro meses depois, em julho daquele ano, começava a ter seus primeiros avanços em relação à recuperação. "Hoje, já me sinto 100%. Não tenho sequelas", festeja.