A vitória da Cemig na disputa pelo lote D do leilão realizado na quarta-feira, 25, provocará pressão adicional sobre o caixa da estatal mineira. Com dívida líquida de R$ 11,1 bilhões ao final do terceiro trimestre, a companhia terá que desembolsar R$ 1,44 bilhão até o fim de dezembro como forma de pagamento de bônus de outorga. Uma despesa adicional que, por si só, poderá levar os indicadores de alavancagem da companhia a patamares próximos dos limites acordados com os credores.
A preocupação com a alavancagem é um tema recorrente entre analistas que acompanham o setor elétrico e também dentro da própria diretoria da estatal mineira. A cada trimestre, o diretor de Finanças e Relações com Investidores, Fabiano Maia Pereira, destaca as ações adotadas pela empresa com o objetivo de melhorar o perfil de endividamento do grupo. Dez dias atrás, por exemplo, o executivo afirmou que a renovação das concessões das distribuidoras ajudaria a Cemig Distribuição a alongar as dívidas com vencimento de curto prazo.
Agora, a esses vencimentos de curto prazo se junta a primeira parcela referente ao bônus de outorga do lote arrematado, no valor de R$ 1,44 bilhão, e outros R$ 775,6 milhões a serem pagos ao governo federal até junho de 2016. Um compromisso que pode fazer com que a dívida líquida da Cemig supere R$ 13,3 bilhões.
Considerando o Ebitda acumulado em 12 meses até setembro passado, a relação entre dívida e Ebitda poderia subir de 1,67 vez ao final de setembro para 2 vezes em dezembro, no limite do patamar considerado ideal pela companhia. No caso do indicador que dimensiona a dívida líquida em relação ao patrimônio líquido (PL), o número poderia alcançar 48,3%, ainda mais acima do que os 40% esperados e do que os 43,8% apurados em setembro.
O estatuto do grupo mineiro permite, contudo, que a relação entre dívida líquida e Ebitda possa alcançar 2,5 vezes quando existirem motivos conjunturais. A relação consolidada de endividamento com base no PL poderia chegar a 50%, limites que já passam a ser considerados pela Cemig. Tanto que o conselho de administração decidiu encaminhar à Assembleia Geral Extraordinária (AGE) de acionistas, prevista para 29 de dezembro, uma proposta relativa à ultrapassagem de covenants estatutários em 2015.
Alavancagem
Os analistas Marcos Severine, Henrique Peretti e Carolina Yamaguchi, do JP Morgan, destacam que a estatal mineira possuía R$ 1,55 bilhão em dívidas a vencer no decorrer do quarto trimestre deste ano. Desse montante, a companhia já havia rolado R$ 789 milhões até o início de novembro. Outros R$ 4,28 bilhões vencerão em 2016. Ambos os números não incluem as despesas previstas com a concessão das 18 usinas incluídas no lote D do leilão.
“A despesa de aproximadamente R$ 2 bilhões com as concessões pode afetar severamente a relação entre dívida líquida e Ebitda da Cemig em 2016, adicionando outra fonte de pressão sobre a empresa”, destacam os analistas Vinicius Canheu e Arlindo Carvalho, do Credit Suisse.
Outro potencial fator de pressão sobre o caixa da Cemig em 2016 está associado à opção de venda (PUT) detida pelo Fundo de Participações (FIP) Redentor, a partir da qual a Cemig terá que comprar a participação que o Redentor detém na Parati, que é integrante do bloco de controle da Light. A opção de venda é exercível em maio de 2016 e, por isso, a estatal mineira tem aproximadamente seis meses para encontrar um interessado nessa fatia do Redentor. Do contrário, terá que desembolsar recursos também com a compra dessa participação.
Desvalorização
A vitória da Cemig no leilão não foi bem recebida pelos investidores, tanto que as ações da companhia apresentaram queda na bolsa. O valor de mercado da estatal, de acordo com a Economática, terminou a quarta-feira, 25, em R$ 8,878 bilhões, novamente abaixo de R$ 9 bilhões.
O valor de mercado da Cemig não caía abaixo de R$ 9 bilhões desde março de 2005. Teve início, então, uma trajetória de alta cujo pico ocorreu em 2012, quando o valor da empresa chegou a superar os R$ 30 bilhões.
No final daquele mesmo ano, com a edição da Medida Provisória (MP) 579, sobre a renovação das concessões das geradoras, a situação começou a se inverter. A trajetória de queda ganhou força entre o ano passado, com a eleição do petista Fernando Pimentel (PT) para o governo de Minas Gerais, e este ano, após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinar que a concessão das usinas Jaguara e São Simão não poderia ser prorrogada. O tema agora está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF).
Após quase dez anos e meio, o valor de mercado da Cemig voltou a cair abaixo de R$ 9 bilhões neste ano, até atingir o piso de R$ 8,393 bilhões em setembro passado. “A Cemig terá um período difícil, adequando a despesa com a concessão em seu balanço”, destacaram em relatório os analistas Pedro Manfredini, Raul Cavendish e Gustavo Fingeret, do Itaú BBA.