Cidade! Mais precisamente a cidade de São Paulo, tão fotografada em sua imensidade, muito julgada em sua aparência. Quem a define feia não a conhece. Quem a define enigmática se sente por ela atraído e procura de alguma forma compreendê-la. Pode ser via música, verso, literatura, mas sem dúvida nenhuma a imagem lhe rende a melhor homenagem. Muito já foi mostrado, poucas vezes foi compreendida. Muito foi definida: cidade pedra, cidade cinza, da chuva e da garoa. Cidade amada, cidade odiada. Mais uma vez, uma exposição procura apresentar a cidade de São Paulo, suas múltiplas vertentes, suas múltiplas possibilidades de ser compreendida. Talvez por isso o nome desta exposição “Equações da Metrópole”, inaugurada último sábado, 28, na Casa da Imagem, mereça um momento de reflexão.
Com curadoria de Henrique Siqueira e Mônica Calderón a mostra é composta por 124 imagens do acervo fotográfico do Museu da Cidade de São Paulo e dois filmes de Benedito Junqueira. Um módulo especial no Solar da Marquesa de Santos, prédio ao lado da Casa da Imagem, será dedicado ao fotógrafo Valério Vieira, com sua obra (de 1922) Panorama de São Paulo.
Nesta exposição os curadores partiram do próprio acervo do Museu da Cidade, percorrendo um período de 140 anos de história fotográfica da cidade entre 1862 e 2002. A ideia é apresentar o cenário de São Paulo, não só a passagem de vila à metrópole já tão explorada, mas mostrar as mais variadas fases da sua construção e de seus personagens. Então, se no andar inferior da Casa da Imagem a presença é a da paisagem, no superior é o habitante da cidade que domina: “Queremos mostrar o habitante no espaço urbano, a infância, o trabalho na indústria, na construção civil”, nos conta Henrique Siqueira. Uma cidade que não existe sem seus habitantes. “Desmitificar a visão da metrópole e tentar compreender o cenário da cidade”, diz o curador. Assim, desfilam à nossa frente imagens de fotógrafos que desde o fim do século 19 e durante o século 20 se voltaram a desvendar a cidade por meio da imagem. Uma tentativa de entender esta cidade tão vilipendiada, rompida e rasgada, que cresceu solta e que se impõe ao nosso olhar.
Criar uma memória da cidade de São Paulo tem raízes antigas. O acervo do Museu da Cidade de São Paulo, com mais de 74 mil fotografias e 154 anos de histórias, foi formado por Aurélio Becherini (1879-1939), considerado o primeiro fotojornalista da cidade de São Paulo. Suas fotos são as responsáveis por ele ter sido contratado pela prefeitura de São Paulo, pelo então prefeito Washington Luís (1869-1957), que queria registrar as transformações que viria a fazer. Preocupado, Becherini adquire por conta própria fotografias que já haviam sido feitas por outros fotógrafos, também empenhados em registrar a cidade, tais como Augusto Militão de Azevedo (1837-1905), Guilherme Gaensly (1843-1928) e Valério Vieira (1862-1941). Desta forma ele pôde elaborar um Álbum Comparativo da Cidade de São Paulo.
Em 1934, sempre se antecipando, Becherini procura o então prefeito Fabio Prado (1887-1963) e lhe oferece seu arquivo, formado por suas fotografias e por fotografias que havia adquirido de outros fotógrafos. Será o próprio Mario de Andrade (1893-1945), que dirigia o recém-criado Departamento de Cultura, que vai se entusiasmar com o material e aprovar sua compra. Mas será outro fotógrafo, Benedito Junqueira Duarte (1910-1995), que se encarregará de organizar, limpar e identificar o material. É assim que nasce a seção de iconografia do Departamento de Cultura da cidade de São Paulo. É assim que São Paulo tem a mais antiga coleção pública de fotografias da cidade.
E é desta forma que vamos acompanhar a exposição, percorrendo os mais variados momentos da cidade, sua paisagem rural e sua verticalização, o registro de seu centenário em 1954, o retrato da cidade por German Lorca, Sérgio Jorge, Marcia Alves e Cristiano Mascaro. Uma cidade que à revelia de seus retratistas cresce e escapa. E ainda falta muito para conhecer, ou melhor, para resolver as equações da metrópole! As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.