A variedade de embalagens de cerveja nas gôndolas dos supermercados caiu, e a culpa pode ser, por contraditório que pareça, da alta produção da indústria. "Há um problema estrutural. Sempre que o ritmo de produção de cerveja passa dos 14 bilhões de litros por ano, falta vidro", diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Cerveja (Cervbrasil), Paulo Petroni.
Com isso, na hora da compra, o consumidor está com opções mais limitadas – o que, em última instância, pode prejudicar as vendas do produto. O índice de ruptura da Neogrid – indicador que mede a falta de produtos nos supermercados brasileiros – passou de 11,9% na categoria de cerveja, em agosto, para 15,3%, em setembro.
De acordo com Robson Munhoz, diretor de operações da Neogrid, esse indicador não aponta, necessariamente, que falta cerveja nas gôndolas, mas que não se encontram determinadas linhas ou marcas. "Ainda há soluço de matéria-prima para a indústria e ela está revendo seu portfólio. Algumas fábricas não estão recebendo a embalagem de 310 ml, por exemplo, e tomam a decisão de não envasar determinadas marcas", explica.
<b>Efeito da renda</b>
Para Petroni, essa falta de variedade pode afetar as vendas da bebida. "Com a inflação, que diminui a renda disponível da população, a falta de embalagens menores prejudica o consumo", afirma.
Ou seja: com o dinheiro valendo menos, o consumidor tende a buscar embalagens menores da bebida. Se determinada marca não tem essa disponibilidade, ele troca por outra ou acaba por abandonar a compra desse item. A redução do tamanho da embalagem é um subterfúgio a que diversas indústrias, como a de alimentos e a de cosméticos, recorrem em tempos de dificuldades de emprego e renda, como o atual.
O presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro), Lucien Belmonte, confirma que a produção de vidros para a indústria cervejeira vem abaixo da demanda há cerca de dois anos. "Há grandes aumentos de oferta programados para 2022, mas ainda não resolve, para 2023 a oferta fica mais acertada", diz.
Uma vez que o problema não é novo, Belmonte afirma que as fábricas tiveram condições de se programar. Por isso, aquelas que aumentaram estoques de embalagem e fizeram encomendas mais programadas não sofrem com a falta. A produção da bebida tradicionalmente sobe no terceiro trimestre, para dar conta da demanda de consumo no verão.
A falta de embalagens no setor de bebidas, aliás, não é exclusividade do setor de cervejas. No ano passado, diversas vinícolas do Rio Grande do Sul reportaram escassez eventual de garrafas por causa do aumento do consumo. A demanda por vinho subiu quase 20% no ano passado e, pela primeira vez, o consumo per capita da bebida no País passou dos 2 litros, conforme mostrou reportagem do <b>Estadão</b> nesta semana. A escassez de embalagens de papelão afeta também outros segmentos das indústrias de alimentos e bebidas.
<b>Em falta </b>
O índice geral de ruptura, considerado todo o varejo alimentício, permanece em níveis altos pelo sexto mês consecutivo. Em setembro, o índice registrou uma leve queda em relação a agosto, de acordo com a Neogrid: a taxa ficou 11,1%, contra 11,63% do mês anterior.
Munhoz conta que, apesar de as vendas nos supermercados terem diminuído em setembro, os estoques das redes de varejo também se reduziram e a ruptura de abastecimento também decresceu.
Os três fenômenos raramente ocorrem juntos, de acordo com o executivo. Esse alinhamento indica um desaquecimento do varejo, o que dá condições aos supermercados para batalhar um pouco mais por preços melhores.
A lógica é: como os consumidores compraram menos, não há falta de itens nas prateleiras, mesmo que os estoques dos varejistas tenham diminuído. Assim, o varejo consegue reprimir a demanda de encomendas à indústria.
Segundo a Neogrid, além da cerveja, outras categorias que registram alto índice de falta de produtos nas gôndolas estão as bebidas à base de soja, com ruptura de 20% (ante 18,3% no mês passado) e ovos, com 15,9% em setembro (ante 17,2% em agosto).
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>