No último ano, a sustentabilidade na moda se tornou assunto essencial. Novas marcas nasceram com consciência e propósito, grandes empresas tomaram atitudes e modelos de negócios e a mídia especializada deu prioridade à pauta, trazendo luz às iniciativas que se mostravam mudando o jogo. Nesta coluna, que olha para a moda como comportamento de um tempo, a sustentabilidade sempre foi um dos temas centrais e, após as semanas de moda internacionais de Nova York, Londres, Milão e Paris, o que se viu foi o assunto ter menos destaque e atitude do que era esperado.
Após um ano e meio de isolamento social, desfiles digitais e entrevistas por videochamada, a moda voltou ao seu formato presencial. Fashionistas e jornalistas puderam retornar às salas de desfile e conversar pessoalmente com os diretores criativos, mas, em meio ao furor do retorno, pouco se falou sobre consumo consciente, preocupação com o coletivo e inovações tecnológicas em prol de um futuro mais verde.
O escritor, consultor e palestrante André Carvalhal, nome referência no Brasil quando o assunto é moda com propósito, também sentiu falta do tema no centro das discussões. "O que me impressionou foi que viemos de um período de pandemia, quando muita coisa foi colocada em prova e questionada. Muita gente teve a oportunidade de rever seus negócios e sua forma de produzir, mas quando olhamos para a passarela parece que voltamos no tempo, que a pandemia nunca existiu e que as questões que foram levantadas não aconteceram. Vimos coleções enormes, muitos produtos e, novamente, uma aceleração muito grande em um ritmo que já entendemos que vai contra o ritmo da nossa sobrevivência, da nossa existência", afirma.
Duas marcas que têm o propósito como base sólida na narrativa de suas criadoras, no entanto, reafirmaram o pensamento sustentável na passarela. A inglesa Stella McCartney, precursora do movimento há mais de 20 anos, trouxe para a sua moda um forte senso de consciência e buscou inovar na criação de peças cada vez mais sustentáveis. Na última temporada, Stella apresentou uma nova proposta de couro ecológico, feito a partir de uma espécie de fungo multicelular chamado micélio, que foi aplicado na criação de bolsas em uma ação sem precedentes e ecofriendly.
A francesa Chloé também se afirmou ainda mais como marca defensora do planeta. Sob o comando da uruguaia Gabriela Hearst, a grife trouxe para a passarela matérias-primas upcycled, que seriam descartadas, mas ganharam nova vida, e apostou no cashmere de baixo impacto ambiental, além de reafirmar parcerias com cooperativas de fim social ao redor do mundo. Essas ações, aliadas a iniciativas que a Chloé vem desenvolvendo durante o ano, renderam para a grife o certificado B-Corp, que garante o sucesso financeiro de uma empresa seguindo conceitos de desenvolvimento social e ambiental. Com este feito, a marca se torna a primeira do segmento de moda de luxo a ter o selo.
O caminho longo e desafiador a ser percorrido pela moda em direção a uma maior harmonia com o ecossistema do planeta não desestimulou marcas como Chloé e Stella McCartney a trilhar a possibilidade de criar e ter sucesso de vendas respeitando o planeta. A busca deve ser constante, consciente e inegociável para que a moda siga como fator que impulsiona transformações de comportamento, como faz parte de sua história. Depende, no entanto, de marcas e consumidores atentos para não alterarmos a vocação dessa arte que é impulsionar mudanças a um mero exercício de consumo irresponsável.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>