Desde a crise de 2008, saber como conduzir a política fiscal em momento de queda aguda da atividade econômica é uma pergunta que ronda todos os países, destacou nesta sexta-feira, 29, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Manoel Pires. O desafio se coloca, segundo o secretário, porque nas recessões ocorre sempre uma queda muito forte das receitas públicas. “Essa queda ocorre em velocidade muito maior que a capacidade de qualquer país de cortar despesas”, afirmou Pires, em apresentação no II Seminário Internacional de Política Fiscal, promovido pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e pela Fundação Getulio Vargas (FGV) no Rio.
O secretário destacou, ainda, que a velocidade com que um governo é capaz de cortar gastos públicos varia conforme a rigidez do orçamento de cada país. “Quando o orçamento é muito rígido, a velocidade de corte é muito menor”, disse Pires, completando que, nesses casos, como o do Brasil, a única opção é cortar investimentos, o que gera rodada adicional de queda na atividade, levando a um ciclo vicioso.
Pires defendeu o ajuste fiscal feito pelo governo federal desde o início de 2015. Segundo o secretário, “estamos conseguindo trazer a despesa discricionária para abaixo do nível de 2008”.
O problema, lembrou Pires, é que as despesas obrigatórias continuam crescendo, ano a ano. Assim, a queda nas discricionárias não tem se mostrado suficiente para o governo voltar a obter resultado primário positivo de forma “recorrente”.
“Precisamos rediscutir despesas obrigatórias. As despesas discricionárias também são importantes”, afirmou Pires, destacando a importância dos investimentos públicos.
Além disso, segundo o secretário, uma redução permanente das despesas discricionárias não é sustentável ao longo do tempo. Por isso, o governo aposta numa “reforma fiscal”, propondo a criação de um limite para as despesas e a discussão sobre a reforma da Previdência, criando uma espécie de “âncora fiscal” para as expectativas. Essa solução é melhor, segundo Pires, porque evita a opção, no curto prazo, por um “ajuste recessivo”.
Limite para despesas
O secretário defendeu ainda a proposta, feita pela equipe econômica em projeto de lei, de criar regras de limite para o crescimento das despesas públicas. Segundo cálculos apresentados por Pires, se essas regras já existissem em 2011, as despesas públicas representariam hoje 1,77 ponto porcentual a menos como proporção do Produto Interno Bruto (PIB).
Atualmente, as despesas equivalem a cerca de 19% do PIB, segundo dado apresentado pelo secretário. “Quando há um limite no gasto público, podemos focar a discussão nas prioridades orçamentárias”, disse Pires.
Nas contas do Ministério da Fazenda, com um gasto 1,77 ponto porcentual menor como proporção do PIB, o governo teria hoje resultado “muito próximo” do equilíbrio fiscal. Pires defendeu ainda outras medidas, além da reforma da Previdência, como a reavaliação de políticas públicas, com a criação de critérios de análise e acompanhamento, e uma reforma administrativa do Estado.
Dívida dos Estados
Segundo Pires, o Ministério da Fazenda considerou “adequado” o voto do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a questão das dívidas dos Estados com a União na última quarta-feira. Relator dos mandados de segurança sobre o caso, Fachin votou contra a mudança das regras de pagamento das dívidas.
“O voto do STF foi em linha com o que a gente entende que é adequado. A solução para essa questão está na aprovação do projeto de lei”, disse Pires, referindo-se à proposta do governo federal de reestruturar as dívidas dos Estados cobrando contrapartidas em termos de controle de gastos.
Após o voto do relator, os ministros do STF decidiram suspender por 60 dias o julgamento sobre a mudança no pagamento dos juros das dívidas entre Estados e União. A sugestão foi feita pelo ministro Luís Roberto Barroso, que defendeu que essa é uma questão política e não jurídica e que os entes federativos deveriam sentar e negociar uma saída conjunta.
No início do mês, Fachin havia dado liminares favoráveis aos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais para que eles pudessem pagar as dívidas que têm com a União usando juros simples e não compostos. No voto, ele ponderou: “Reconheço que são graves os problemas financeiros por que passam os Estados. De outro lado, são nítidas as limitações de caixa da União”.
Pires considera que a disputa entre Estados e a União em torno das condições de pagamento das dívidas dos governos subnacionais com o federal é a questão mais urgente da política fiscal na atualidade. “A questão que está em discussão no Supremo tem uma implicação fiscal imediata que a torna a questão mais urgente a ser tratada”, disse a jornalistas, após dar palestra no evento. “Ter um acréscimo de dívida de R$ 400 bilhões é um risco fiscal muito grande”, completou o secretário.