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Filme renegado pelo pai mostra como Amy Winehouse era genial

Alguns filmes programados para a sessão da meia-noite no Festival de Cannes deste ano geraram bochincho muito antes de o evento começar. Love, o novo longa de Gaspar Noë, pelas cenas de sexo explícito que o diretor franco-argentino de cara anunciou que iam encher a tela, e põe tela cheia nisso. E logo Amy, o documentário de Asif Kapadia sobre a cantora e compositora Amy Winehouse. Amy estreou arrebentando na Inglaterra. Nas mídias sociais não se fala outra coisa. Kapadia conseguiu, de novo.

Cineasta inglês de ascendência indiana, Kapadia, de 43 anos, já é conhecido do público brasileiro. Realizou o documentário – ótimo – sobre Ayrton Senna. Ele usa basicamente o mesmo procedimento estético em seu novo documentário. Muito material de arquivo, depoimentos em off. No caso de Amy, houve a reação da família. Às vésperas da exibição do filme em Cannes estourou como uma bomba a notícia de que a família – leia-se: o pai – havia ficado escandalizado com o material filmado. Ou melhor, com o foco da direção. Kapadia não apenas mostra a extraordinária artista que era Amy. Essa mulher revolucionou o soul, era intensa e visceral. Lisonjeiro com ela, o filme é menos lisonjeiro com a família, e o pai. Se Amy não estava preparada para a fama, e sofreu por isso, a família – e o pai -, vindos da classe operária, logo perceberam que tinham uma mina de ouro. E resolveram lucrar com isso.

Diante do filme, e do retrato que pinta dele, o pai bradou que não reconhecia sua Amy na abordagem de Asif Kapadia. Ele retirou seu apoio, mas já era tarde. Em Cannes, sempre existem filas, para não importa qual filme. Para Amy, foram gigantescas. O filme mostra como Amy só queria compor e cantar, mas o assédio da mídia e a agenda carregada a jogaram no álcool. Não foi só o pai. Todo mundo queria sua fatia no sucesso. Que ela era excepcional, fica claro de saída, no filme doméstico que mostra a jovem Amy, travestida de femme fatale, cantando Happy Birthday na festa de um amigo. Ela podia não ser exatamente uma Marilyn Monroe, mas era uma potência vocal, prenhe de erotismo.

É interessante comparar Amy com Senna porque a preferência de Asif Kapadia vai para figuras que tombaram no auge. Senna já era mito antes daquela curva. Amy também, antes da intoxicação por álcool. A diferença é que em Amy o somatório de informação vai criando o clima para o que já foi comparado a um expresso para o inferno. Nada poderia evitar que o trem da vida de Amy Winehouse a levasse para aquele desfecho. Outra comparação é com o documentário Kurt Cobain – Montage of Heck. Com base em material fornecido pela família, o diretor Brett Morgen não fez um filme chapa-branca, mas montou o quebra-cabeça de um artista torturado (e dominado) por seus demônios. Como Amy. Se a palavra não fosse desgastada, se poderia dizer que Amy é genial. Talvez não o filme, ótimo, mas a artista. O que se perdeu com sua morte é impossível de medir.

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