A obra da romancista maranhense Maria Firmina dos Reis (1822-1917) foi decisiva na formação das mulheres do século passado, permitindo refletir sobre a educação daquela época. Essa foi uma das conclusões da primeira mesa da 20ª Festa Literária Internacional de Paraty, a Flip, na manhã desta quinta-feira, 24, na cidade fluminense.
Participaram as historiadoras Luciana Martins Diogo e Lilia Schwarcz, com mediação de Eneida Leal Cunha. "Foi uma intelectual negra, com menos recursos, mas que teve seu projeto e seu protagonismo", observa Lilia, lembrando que Maria Firmina, autora de romances como Úrsula (1859), é considerada a primeira escritora afro-brasileira.
"Nossa historiografia se esquece dos momentos dos negros, com silenciamentos, o que os torna, ainda hoje, como uma maioria minorizada na sociedade brasileira, o que é uma grande contradição", continua a historiadora.
Para Luciana, Maria Firmina foi uma autora consciente do que estava fazendo. "Ela tinha um planejamento e, mesmo vivendo no interior do Brasil, no Maranhão, Maria Firmina era atenta ao seu tempo."
A historiadora acredita que a autora brasileira deve ter lido o romance A Cabana do Pai Tomás, que a americana Harriet Beecher Stowe publicou em 1852. "Ela pode ter lido essa obra e escolhido elementos que, fazendo diálogo com Gonçalves Dias, inspiraram seu romance que usou para interpelar o futuro."
Com isso, tornou-se a primeira autora de uma literatura
afro-brasileira, com livros em que a vida dos personagens e suas contradições humanas ganham destaque e são fundamentais", comenta Lilia, lembrando que Maria Firmina se nutriu das histórias de amigos escravizados, o que conferiu mais autenticidade à suas histórias.
A importância de sua obra hoje ganha cada vez mais relevância, segundo Lilia. "A escritora americana Toni Morrison dizia que as palavras não representam a violência, mas são a própria violência. Assim, precisamos fazer o contra discurso se queremos ter noção mais exata da historiografia literária brasileira."