A imagem escolhida para divulgar a exposição Jairo e João: O Teatro na Fotografia de Jairo Goldflus e João Caldas Sobre a Cena Teatral é emblemática: traz Marília Pêra pensativa, sentada em uma poltrona, cabeça apoiando na mão que também segura o cigarro. Tirada em 2004, a foto registra uma cena da peça Mademoiselle Chanel, dirigida por Jorge Takla e um dos momentos marcantes da grande atriz.
Emblemática porque não apenas perdurou ao longo do tempo, como marcou o próprio momento do fato apresentado, eternizando uma arte – o teatro – que, por sua natureza, é efêmera: as cenas ficarão na memória de quem as viu, sem um registro físico como o cinema, a música, a literatura. Assim, a mostra, que abre na quarta, 1.º, no Instituto Artium, tem o mérito de recuperar vestígios do que já não existe mais. "Jairo e João buscam o belo paradoxo de capturar o incapturável, já que o teatro só existe mesmo enquanto acontece", observa o diretor e cineasta Rafael Gomes, curador da exposição.
São 86 fotos impressas e 128 exibidas em vídeos de espetáculos diversos. O ponto de partida é 2004, quando Goldflus iniciou seu trabalho no teatro, registrando o musical Chicago – Caldas começou antes, ainda jovem, em 1980, quando fotografou os bastidores do álbum Clara Crocodilo, de Arrigo Barnabé.
O visitante logo nota as diferentes escolhas estéticas de cada fotógrafo: enquanto Goldflus privilegia as imagens de estúdio, onde a cena pode ser cuidadosamente construída, Caldas prefere o calor da ação, registrando a atuação do elenco. "Os retratos de Jairo são marcados pela beleza, precisão e rigor formal", comenta Gomes. "Já a extensa e sólida produção fotográfica de João tende a privilegiar a cena propriamente dita. São fotografias de palco, instantâneos dos espetáculos, que conjugam a pulsação e a intensidade das apresentações teatrais com raro senso de composição e domínio técnico."
<b>MOLDURAS</b>
Assim, na primeira sala estão 22 ampliações, 11 de cada profissional. As imagens estão dispostas aos pares, sendo que uma de Goldflus está acompanhada de outra de Caldas, uma de costas para a outra. A exposição dispensa molduras e as fotos estão colocadas em apoiadores de vidro que lembram os cavaletes de cristal criados por Lina Bo Bardi para o Masp. O cenógrafo André Cortez, que assina a expografia da mostra, criou diferentes dispositivos, que ocupam tanto o espaço interno quanto o jardim do Instituto Artium.
A forma de visualização também é engenhosa: o espectador que se posicionar em um canto da sala terá a visão das 11 imagens de Caldas; e, se se posicionar no lado oposto, conseguirá ver as de Goldflus. "Ambos oferecem um precioso balanço do teatro musical e do não cantado dos últimos 18 anos", comenta o curador, que reservou ainda outra sala para expor juntas imagens que ambos fizeram do mesmo espetáculo ("há um perfeito diálogo entre elas") e também uma mesa contendo apenas a produção de Caldas, uma vez que seu acervo é mais substancioso. "Ele contempla a vastidão teatral de São Paulo, desde musicais a experiências cênicas."
O <b>Estadão</b> acompanhou uma visita de Caldas e Goldflus ao instituto, onde trocaram impressões. "Ao fotografar no estúdio, tenho o privilégio de observar a emoção dos atores ao receber pela primeira vez seus figurinos", conta Goldflus, hoje com 54 anos. "É o momento em que eles mais se aproximam dos personagens. Vi isso quando Marília Pêra primeiro experimentou os figurinos de Chanel, recém-chegados de Paris. Ela se olhava cuidadosamente no espelho, já experimentando movimentos."
Já Caldas, de 64 anos, prefere a ação – e sem direito a observações prévias. "Não gosto de primeiro ver o espetáculo para então fotografar: prefiro clicar de primeira. Tento reproduzir o desenho dos movimentos."
Goldflus prefere o registro em preto e branco. "É a poesia que combina com o teatro, tonalidades que não me distraem. O colorido é muito real, acaba datando a imagem."
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>