Pouco depois de voltar da turnê pelo Brasil, realizada em agosto do ano passado, a francesa Laure Briard se sentiu fraca, doente. Naqueles dias que lhe pareciam intermináveis, em Toulouse, cidade onde mora, lembrou-se de Jorge Ben Jor. Ouviu o som do carioca uma vez, duas vezes, três vezes… “E realmente me senti bem. É algo que existe na música dele que mexe comigo”, explica a francesa. “Até hoje (a obra de Jorge Ben Jor) tem um efeito em mim, me cura, me faz bem.” Para Jorge, o Ben Jor, vem Jorge, a canção, uma das músicas do disco (ou EP) Coração Louco, o primeiro trabalho de Laure cantado em um português afrancesado e gracioso, lançado nesta sexta-feira, 29, nas plataformas digitais, pelo selo Midnight Records.
Curiosamente, Laure não fala português, “no máximo, algumas frases”, ela explica, em inglês. No álbum, contudo, ela faz o possível para soar brasileira, mesmo diante da barreira linguística – e a fusão da estética nacional (bem indireta, veja bem, não se trata de um álbum que emule a bossa nova) com o indie pop dela, faz o necessário para que o disco fale as duas línguas da mesma forma.
O caminho dela pelo português, é claro, tem início na música. Foi ao som de Antonio Carlos Jobim, Vinicius de Moraes e, claro, João Gilberto, o primeiro contato. A bossa nova, nosso gênero mais referenciado no exterior, veio antes. Depois, os tropicalistas. Por fim, Laure mergulha pelo universo dos artistas independentes, como Giovani Cidreira, grande voz vinda de Salvador.
Sucessor dos álbuns Revelation (2015) e Sur La Piste de Danse (2016), Coração Louco existe graças ao encontro de Laure com o Boogarins, banda-sensação do novo rock nacional, entorpecida de psicodelia e experimentação, que está, há três anos, excursionando por Estados Unidos e Europa. Durante o tradicional (e ultraindie) South By Southwest, em Austin (Texas), no primeiro semestre, Laure conheceu os rapazes do grupo de Goiânia. Trocaram contatos, esboçaram a ideia de uma turnê por território brasileiro. O giro por aqui ocorreu em agosto e Laure já tinha uma música criada, Janela, em português – com o auxílio do vocabulário adquirido em canções brasileiras e, é claro, do tradutor do Google.
“Foi quando conversamos (ela e Benke, guitarrista do Boogarins) sobre o disco”, ela conta. Voltou e, em uma semana no estúdio no Estúdio Mestre Felino, em Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, criou Coração Louco ao lado de Benke, Dinho Almeida (guitarra) e Ynaiã Benthroldo, do Boogarins, e Danilo Sevalli (teclado), da Hierofante Púrpura. Assim, reuniu as oito canções presentes em Coração Louco, um disco que escancara o que há de mais precioso na força da música: a conexão. Laure sentiu o Brasil, ela explica, em palavras como “coração”, “janela” e “madrugada” e, a partir delas, criou. Suas canções nos transportam diretamente para uma noite abafada e de ar parado em um apartamento em Toulouse, no sul da França, com um disco brasileiro a girar na vitrola.
Laurie Briard
“Coração Louco”
Midnight Records; plataformas digitais
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.