Sem dinheiro para investimentos, o governo vai oferecer para a iniciativa privada trechos de rodovias com a obrigação apenas de fazer a manutenção e a restauração. Ou seja, as empresas ficariam responsáveis por operações simples de tapa-buracos, cortes de vegetação e sinalização de rodovias, sem precisar investir quantias bilionárias em duplicações e obras de grande porte. Em troca, cobrariam pedágio.
O Estado apurou que os primeiros editais ficam prontos em até 60 dias, para entrar em consulta pública entre abril e maio. Inicialmente serão licitados três lotes, cujos trechos somam 1 mil km de extensão. São estradas que já estão prontas e receberam obras recentes do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Em junho, os editais devem ser enviados ao Tribunal de Contas da União (TCU), para licitação no segundo semestre.
O estado precário de boa parte das estradas brasileiras é considerado um entrave até para o crescimento econômico. Segundo pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), divulgada no final do ano passado, 61,8% das rodovias nacionais são consideradas regulares, ruins ou péssimas.
Hoje esse trabalho de manutenção é realizado exclusivamente pelo Dnit, órgão do Ministério dos Transportes responsável por cuidar dos 55 mil quilômetros de estradas federais do País, mas que tem orçamento cada vez menor (ver abaixo).
Ao repassar parte dessa malha para o setor privado, o governo quer aliviar a pressão sobre o orçamento e concentrar os recursos do Dnit em obras, em vez de reparos e manutenção.
Os “contratos de gestão” das estradas terão prazo de dez anos e serão fiscalizados pelo próprio Dnit, em vez de serem repassados para a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que gerencia as tradicionais concessões de rodovias federais.
Entre os trechos prioritários estão a BR-364 em Mato Grosso, a BR-116 em Minas Gerais e a BR-101 em várias regiões do Nordeste, como o trecho que corta Pernambuco, onde a estrada foi duplicada pelo Dnit.
A partir dos primeiros trechos, o governo vê espaço para explorar o modelo em praticamente 45% de toda a malha que o Dnit administra hoje. Um levantamento do órgão aponta que, dos 55 mil km de estradas, 25 mil km teriam condições de serem passados à iniciativa privada por meio desses contratos de manutenção e restauração.
Custos. As informações foram confirmadas pelo diretor-geral do Dnit, Valter Casimiro. “Estamos avançados nessa proposta e devemos ter um modelo consolidado até maio, em consulta pública, para que seja enviado ao TCU até junho”, diz. “O modelo vai permitir que as estradas continuem a oferecer um bom estado de trafegabilidade, sem aumentar os custos para a União.”
Os ajustes legais para viabilizar o novo modelo de concessão estão sendo discutidos por um grupo formado pelos ministérios dos Transportes, Casa Civil e Planejamento e pelo Dnit. Será preciso editar uma lei que viabilize a proposta, o que deve ocorrer por meio de uma medida provisória a ser publicada também em meados de maio.
O plano prevê que a concessionária que assumir o trecho receba uma receita fixa pelos serviços que vai prestar, independentemente do tráfego de veículos na estrada. Dessa forma, o governo quer garantir um retorno fixo ao empreendedor.
De forma similar ao que já acontece no setor elétrico, o plano prevê a criação de um tipo de câmara de compensação financeira para garantir os pagamentos aos concessionários. Trechos concedidos que eventualmente arrecadarem mais dinheiro com o fluxo dos pedágios ajudarão a bancar o pagamento de outros que arrecadarem menos.
O setor da construção vê a proposta com bons olhos. “É um grande programa, uma forma alternativa de resolver o problema da falta de investimento do Dnit e de garantir boa qualidade das estradas”, diz José Carlos Martins, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic).
Para o economista Claudio Frischtak, da Inter.B Consultoria, esse é um “movimento inevitável”. “Temos estradas importantes nas mãos do Dnit que nem sequer têm acostamento”, disse. “Estamos numa situação de crise fiscal, com restrição direta de investimentos públicos. Portanto, considero a ideia correta.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.