Alguns economistas que avaliam o cenário econômico e fiscal para o ano que vem colocam em dúvida as previsões do governo, e acreditam que o déficit primário pode ser maior que os R$ 139 bilhões previstos. A avaliação é que o governo conta com a “sorte” para fechar o número, pois depende de fatores imprevisíveis: virada na economia, retomada da arrecadação e boa vontade dos investidores para entrar de cabeça no programa de concessões e arrematar todos os ativos. Trata-se de um cenário auspicioso que nem todos acreditam ser possível em prazo tão curto.
Na avaliação do economista Felipe Salto, esse otimismo é arriscado, por produzir números “inflados”. Exemplo: o Projeto de Lei Orçamentária Anual, o Ploa, na visão de Salto, apresenta um volume elevado de receitas extras, sem deixar claro de onde virão. “A receita líquida total esperada pelo governo, se confirmada, teria um crescimento da ordem de 5%, acima da inflação, no ano que vem”, diz. Ocorre que, segundo ele, não é possível conseguir tamanho aumento de receita com o Produto Interno Bruto (PIB) crescendo 1,6%, como previu o governo. “Mesmo com concessões e venda de ativos, o número está inflado”, diz.
Com base no perfil de queda da arrecadação que se viu neste ano, e no comportamento histórico de crescimento dos gastos, Salto estima que o buraco nas contas públicas pode ser maior: haveria R$ 50 bilhões de déficit adicional – além dos R$ 139 bilhões previstos. E isso já aplicando todas as regras que criam o teto para o crescimento dos gastos, dentro da Proposta de Emenda Constitucional (PEC do Teto).
“A PEC do Teto é positiva, mas sozinha não faz verão”, diz. Para ele, o governo terá de adotar medidas adicionais para fechar a conta: securitização da dívida, revisão dos contratos de compras de bens e serviços, interrupção de todos os reajustes salariais, incluindo o do Judiciário, e revisão de desonerações, subsídios e subvenções.
Viável
O secretário de acompanhamento econômico do Ministério da Fazenda, Mansueto Almeida, admite que cumprir a meta vai exigir esforço, mas garante que, se o número está no Ploa, é porque foi avaliado como viável pela equipe econômica. Tudo que está lá, principalmente as concessões, é factível. “Neste ano, entraram no caixa do governo R$ 21 bilhões, de um total de R$ 23 bilhões previstos em concessões. Como os R$ 24 bilhões do ano que vem podem ser difíceis de alcançar? O número é conservador”, diz.
Almeida também visualiza que a recuperação pode ficar até acima dos 1,6% previstos. “Nossa projeção de crescimento é até inferior à de outros economistas respeitados: A MB, de José Roberto Mendonça de Barros, e Marcelo Carvalho, do BNP Paribas, estão prevendo crescimento perto de 2%, Santander, de 1,5%”, diz Almeida.
Essa visão, porém, não é compartilhada pela economista Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). “Neste momento, 1,6% de crescimento já é uma projeção otimista”, diz ela. Vilma leva em consideração os indicadores do Ibre, referência na pesquisa, análise e produção de estatísticas. No boletim desta semana, a instituição ainda projeta um crescimento de 0,6% para o PIB no ano que vem. “Eles vão precisar mesmo fazer um esforço para cumprir a meta e, além do esforço, terão de contar com a sorte”, diz ela.
Segundo Vilma, já é possível identificar que os aumentos concedidos aos servidores, ainda em tramitação no Congresso, vão pesar. Despesas com pessoal e encargos sociais terão 2% de alta real em 2017. “Nesse aspecto, despesa com pessoal, em tese, não está no ajuste”, diz ela.
Haverá dupla pressão do mercado de trabalho. Nas projeções do Ibre a taxa de desemprego no ano subirá para 12,6% e a renda real vai cair 0,3%. Essa dinâmica, vai aumentar gastos com seguro desemprego e reduzir a arrecadação da Previdência, levando o governo a gastar mais. “Para cumprir a meta, vai precisar fechar todas as concessões e talvez fazer um esforço adicional de receita”, diz Vilma. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.