O presidente Jair Bolsonaro atuou para ter o controle da Câmara e do Senado com receio de sofrer um processo de impeachment no Congresso e de ver seu mandato abreviado. Após passar quase dois anos criticando a "velha política", Bolsonaro deu uma guinada no discurso de campanha e atropelou adversários ao distribuir recursos e cargos para beneficiar seus candidatos. A ofensiva incluiu o pagamento de volume recorde de emendas parlamentares, em janeiro. Como parte da mesma tática, o gabinete do ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, foi transformado, nos últimos dias, em quartel-general das negociações.
O "tratoraço" deu certo, com a eleição de Arthur Lira (PP-AL) na Câmara e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) no Senado.
Até 26 de janeiro, às vésperas da eleição, o governo destinou outros R$ 504 milhões de emendas parlamentares para deputados e senadores. O volume é inédito na comparação com o mesmo mês de anos anteriores.
A eleição que renovou a cúpula do Congresso ocorreu ontem em clima tenso. Bolsonaro montou uma estratégia de blindagem do governo, aliando-se ao Centrão, bloco de partidos conhecido pela prática do "toma lá dá cá". Entre as ofertas do Palácio do Planalto com o objetivo de atrair votos para Lira e implodir a candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP), apoiada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), houve distribuição de cargos, loteamento da máquina pública e recursos extraorçamentários, como revelou o Estadão.
O governo liberou no fim de dezembro R$ 3 bilhões em recursos "extras" do Ministério do Desenvolvimento Regional para 250 deputados e 35 senadores destinarem a obras em seus redutos eleitorais. Contemplados, apoiadores de Baleia mudaram o voto e aderiram à campanha de Lira. Na outra ponta, apadrinhados por aliados de Baleia que ocupavam cargos na administração federal foram demitidos.
Ramos negou irregularidades. "Não negociamos cargos e emendas por causa de eleições no Congresso", disse.
"Isso é, descaradamente é compra de votos", afirmou o senador Lasier Martins (PSD-RS), que chegou a entrar na disputa à presidência do Senado contra Pacheco como forma de protesto, mas retirou a candidatura antes da votação.
Para o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho "zero três" de Bolsonaro, não há contradição com o discurso de campanha. "Pouco importa essas questões, eu quero saber de eleger um presidente (da Câmara) que não vai deixar caducar as medidas provisórias e que vai pautar as matérias que estiveram no centro das eleições de 2018. Isso é o que eu quero saber", afirmou Eduardo.
<b>Interferência</b>
Irritado com a pressão do governo para destruir a campanha de Baleia e derrotá-lo, Maia telefonou para Ramos, na semana passada, reclamando da interferência do Planalto na disputa. Auxiliares de Bolsonaro disseram que o presidente da Câmara chegou a xingar Ramos de "general bandido" e "duas caras". Maia negou que tenha usado esses termos, mas pediu desculpas.
Na noite de domingo, porém, véspera do fim de seu mandato à frente da Câmara, o deputado se reuniu com o presidente do DEM, ACM Neto, e com integrantes do bloco de apoio a Baleia. Ali ameaçou até mesmo aceitar um processo de impeachment de Bolsonaro. Logo depois, porém, recuou.
"Eu espero que ele seja feliz", disse Bolsonaro em tom irônico, ontem, em conversa com apoiadores. "O meu mandato também vai acabar um dia", emendou o presidente, que está em campanha pela reeleição.
<b>Ministérios</b>
Promessas de cargos também não faltaram nas negociações com o Centrão. Em um primeiro momento, Bolsonaro fará uma reforma ministerial menor, mas cederá uma das pastas mais cobiçadas: o Ministério da Cidadania, hoje ocupado por Onyx Lorenzoni (DEM), responsável pelo programa social Bolsa Família.
Neste desenho, Onyx seria remanejado para a Secretaria-Geral da Presidência. A cadeira dele no Ministério da Cidadania deverá ser entregue ao Republicanos, partido que abriga o senador Flávio Bolsonaro (RJ) e o vereador Carlos Bolsonaro (RJ), filhos do presidente. Dirigido pelo deputado Marcos Pereira (SP), o partido é ligado à Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). Os deputados Márcio Marinho e João Roma, ambos do Republicanos da Bahia, são cotados para comandar esse ministério.
O partido reivindica, ainda, a recriação do Ministério de Indústria e Comércio Exterior, pasta que, no governo Michel Temer, era capitaneada por Marcos Pereira. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>