O Ministério da Saúde vai declarar nesta quarta-feira, 11, estado de emergência sanitária nacional em razão de um surto identificado em Pernambuco de nascimento de bebês com microcefalia, malformação que causa sérias deficiências de desenvolvimento. Até o momento, foram notificados 141 casos em 55 cidades – a maioria registrada nos meses de setembro e outubro.
O número é 15 vezes superior à média apresentada no período de 2010 a 2014: 9 casos por ano. Há ainda notificações no Rio Grande do Norte e na Paraíba, mas em menores proporções.
“Não há registros de uma situação como essa na história recente”, descreveu o diretor do Departamento de Vigilância de Doenças Transmissíveis do ministério, Cláudio Maierovitch.
A partir da decretação de emergência nacional, um grupo de especialistas será formado para investigar as causas do aumento tão significativo do número de casos. Bebês com microcefalia nascem com perímetro cefálico menor do que a média. O problema pode ser provocado por uma série de fatores, desde desnutrição da mãe, abuso de drogas até infecções durante a gestação, como rubéola, toxoplasmose, citomegalovírus.
Uma das suspeitas da equipe que investiga o surto é a contaminação da mãe pelo zika. Transmitido pelo Aedes aegypti, o mesmo mosquito que provoca a dengue, o vírus causa uma reação que até agora era dada pouca importância nos adultos: febre baixa, coceiras, manchas vermelhas pelo corpo. A doença chegou ao Brasil neste ano e atingiu principalmente Estados do Nordeste.
O aumento de casos de bebês com microcefalia coincide com período em que gestantes poderiam ter tido contato com o vírus. No início do ano, Pernambuco enfrentou uma epidemia de dengue e zika vírus. Foram contabilizadas 113.328 infecções no Estado, cinco vezes mais do que havia ocorrido em 2014.
“É ainda uma suspeita. Mas boa parte das mães apresentaram em comum justamente as manchas pelo corpo durante os primeiros meses de gestação”, contou o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e colaborador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Carlos Brito.
O caso foi comunicado à Organização Pan Americana de Saúde e ao Ministério da Saúde. Há duas semanas, um grupo da Vigilância em Saúde está no local, para analisar as hipóteses. Mães e bebês estão sendo submetidos a exames, para identificar a presença de situações em comum que possam levar à origem do surto.
Uma das maiores dificuldades enfrentadas pelas equipes é o fato de não existir um exame específico para o zika. O teste realizado para confirmação dos casos tenta encontrar traços do DNA do vírus.
“O problema é que um eventual contato do bebê com o zika ocorreu ainda durante a gestação. O resultado negativo não necessariamente quer dizer que bebê e mãe não foram contaminados”, avaliou Brito.
No Rio Grande do Norte, até o início desta semana, haviam sido identificados 10 bebês nascidos com microcefalia. Há ainda outras 11 gestantes com bebês que já tiveram o diagnóstico da malformação.
“Das gestantes analisadas, 70% apresentaram relatos de manchas pelo corpo, coceiras durante os primeiros meses da gestação”, disse o pesquisador Cleber Luz, da Fiocruz, que também investiga o aumento significativo do número de casos de nascimentos de bebês com o problema. “É preciso deixar claro que outras hipóteses têm de ser avaliadas. Estamos sendo muito cautelosos, mas não podemos descartar nenhuma hipótese.”
Qualquer que seja a causa, o impacto para saúde pública e para famílias é grande. “Crianças que nascem com microcefalia têm de ser acompanhadas regularmente. Vão necessitar de fisioterapia, terapia ocupacional. Muitas podem ter problemas de visão, cognitivos, epilepsia”, explicou a neurologista infantil Adélia Henrique Souza, uma das primeiras a identificar o aumento do número de casos em Pernambuco. “Sempre atendi em consultórios um ou outro caso. Mas não em tamanha magnitude.”
Diante do aumento de casos, a Secretaria de Saúde de Pernambuco tornou obrigatória a notificação de casos de nascimento de bebês com microcefalia. Também foi lançado na segunda-feira, 9, um protocolo para detecção de casos, para atendimento e acompanhamento dos bebês.
Nesta primeira etapa, o protocolo indica quais exames devem ser feitos em caso de suspeita do nascimento de bebês com problema e para onde devem ser encaminhados. Também será feito um manual para acompanhamento das gestantes e identificação do problema ainda durante o período da gestação. Serviços também serão desenvolvidos para atender os bebês.