Países do mundo todo estudam protocolos para afrouxar o isolamento e reativar a economia, mesmo com a pandemia de coronavírus ainda em expansão. Nas discussões, o problema que todos enfrentam é o mesmo: não há um plano-padrão. Agora, a missão dos governos será retomar a atividade econômica sem desencadear uma segunda onda de infecções, que provocaria nova quarentena e mais prejuízos.
A história serve como alerta: a gripe espanhola, que infectou um quarto da população mundial e matou milhões de pessoas entre 1918 e 1920, foi e voltou várias vezes e só foi contida após a terceira onda. Por enquanto, todos os olhos estão voltados para a cidade de Wuhan, origem do surto atual, onde esta semana a quarentena de 76 dias foi suspensa pelo governo da China.
"Temos de reabrir de alguma forma. Não podemos ficar assim por 20 meses", disse Michael Osterholm, diretor do Centro de Pesquisa e Política de Doenças Infecciosas da Universidade de Minnesota. "Se ficarmos tanto tempo fechados, como Wuhan, destruiremos a sociedade como a conhecemos."
A reabertura, no entanto, exigiria exames para identificar anticorpos e determinar as comunidades menos afetadas. "Por enquanto, esses testes não estão validados na maioria dos países", disse David Heymann, professor de epidemiologia da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres. "Até que estejam disponíveis, será um jogo de adivinhação."
Por isso, especialistas recomendam ações graduais e pedem que as autoridades estejam preparadas para contratempos em um processo que pode durar meses. Em Wuhan, embora carros, trens e aviões tenham voltado a operar, algumas restrições permanecem. Moradores, por exemplo, precisam provar que estão indo para o trabalho para serem autorizados a sair de casa. Autoridades dizem que o vírus está sob controle, mas continuam cautelosas, temendo um novo surto.
Na Ásia, o risco de uma segunda onda é real. Cingapura e Hong Kong foram forçados a adotar novas restrições, o que mostra que mesmo países que tiveram sucesso inicial em conter o surto têm pouco espaço para complacência. Na quarta-feira, Cingapura registrou 142 novas infecções, e pelo menos 40 delas foram em dormitórios de trabalhadores estrangeiros de baixa remuneração.
A preocupação é que, por mais que a taxa de infecção caia, na ausência de uma vacina, o vírus voltará assim que o isolamento for suspenso. Por isso, nos EUA, um grupo de especialistas criou um roteiro de abertura gradual, que pede um estágio intermediário no qual escolas e empresas reabram, mas as reuniões ainda sejam limitadas. Se os casos começarem a subir de novo, restrições seriam impostas novamente.
Foi essa a abordagem escolhida pela Áustria. Lojas de ferragens e de jardinagem, além de pequenos estabelecimentos, poderão abrir após a Páscoa. A partir de 1º de maio, segundo anunciou o chanceler, Sebastian Kurz, a permissão se estende a todos os varejistas.
Dinamarca e Noruega também planejam reduzir gradualmente as restrições, começando com a reabertura das escolas, mas mantendo o veto a grandes aglomerações em locais públicos. "A Noruega conseguiu controlar o vírus", disse a primeira-ministra norueguesa, Erna Solberg. "O trabalho agora é manter esse controle."
Mas, abrir economias relativamente pequenas, como Noruega e Áustria, é mais fácil do que fazer a engrenagem rodar em países do G-20. Na Itália, o governo já sinalizou que as atividades de algumas empresas poderão voltar a partir da semana que vem. Se a situação continuar melhorando, algumas lojas poderão reabrir no início de maio, embora bares e restaurantes permanecerão fechados.
Com aviões comerciais presos em solo, cadeias de suprimentos rompidas e fábricas ociosas, a economia global de US$ 90 trilhões sofre o pior choque desde a Grande Depressão, quando o PIB mundial caiu cerca de 15%, entre 1929 e 1932.
Mas, infelizmente, segundo especialistas, não há um mapa do caminho que os governos posam usar para decidir quando e como pisar no acelerador após uma interrupção tão abrupta das atividades econômicas, especialmente quando a retomada coloca em risco a vida de mais pessoas.
"Todo mundo quer voltar à normalidade, mas não há nada que eu saiba que consiga prever onde um novo surto está surgindo", disse Eric Topol, diretor do Instituto de Pesquisa Scripps, da Califórnia. "Se não houver uma maneira de manter as pessoas sob algum tipo de vigilância para ver se o vírus está voltando, será uma receita para o fracasso."
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>