Enquanto o governo busca espaço no Orçamento do ano que vem para tirar do papel uma versão turbinada do Bolsa Família, o ministro da Economia defendeu nesta quarta-feira, 15, um aumento "moderado" do benefício médio do programa de transferência de renda. "Ímpetos eleitorais aconteceram no passado e acabou em impeachment, não queremos que isso se repita", disse Guedes, em evento do Movimento Pessoas à Frente, criado no ano passado para se tornar uma espécie de área de recursos humanos de apoio ao poder público brasileiro, com a participação de grandes nomes da iniciativa privada.
O presidente da República, Jair Bolsonaro, conta com essa nova versão do Bolsa Família para estancar a queda de popularidade do seu governo e conseguir a reeleição em 2022.
O ministro defende que o benefício médio do novo programa – batizado de Auxílio Brasil – fique em R$ 300, mas há dois pontos que travam a nova versão do Bolsa Família.
Hoje, não há espaço no teto de gastos (regra que limita o avanço das despesas à inflação) para comportar o custo com a ampliação do Bolsa Família. O espaço foi ocupado pelo crescimento dos precatórios, dívidas judiciais que saltaram de R$ 55 bilhões neste ano para R$ 89,1 bilhões em 2022.
Guedes voltou a dizer que os poderes brasileiros "precisam conversar", independentemente de afinidades."Nossos supremos poderes precisam conversar. Principalmente quando a decisão de um afeta o outro", afirmou, se referindo às decisões judiciais que determinam o pagamento de valores pelo Executivo.
No mesmo evento, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, foi irônico sobre uma solução para o "meteoro" do aumento desses gastos. "Guedes é meu amigo. É tão meu amigo que coloca no colo um filho que não é meu", alfinetou, brincando Fux.
Logo após a "brincadeira" de Fux, Guedes respondeu. "É só um pedido desesperado de socorro, de forma alguma depositar o filho ou a responsabilidade no seu colo. É que, quando a gente está desesperado, pede proteção aos presidentes dos poderes", afirmou.
<b>Lei de Responsabilidade Fiscal e IR</b>
A outra ponta está relacionada à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que prevê que uma medida de aumento permanente de despesa (como a ampliação do Bolsa Família) precisa vir acompanhada de uma fonte de custeio, isto é, uma receita também duradoura e que seja capaz de financiar o gasto.
Como fonte de receitas para o custeio do Auxílio Brasil, a equipe de Guedes listou a tributação sobre lucros e dividendos distribuídos à pessoa física, entre outras mudanças propostas na reforma do Imposto de Renda. O objetivo original era aprovar as alterações no IR e, assim, ter a fonte de recursos necessária para o programa social.
A reforma do IR já foi aprovada na Câmara dos Deputados, mas enfrenta fortes resistências no Senado Federal, onde pode não avançar.
Na terça-feira, 14, Guedes disse que a não aprovação da reforma do Imposto de Renda poderia levar o governo a ter de reeditar o auxílio emergencial.
"Inadvertidamente o mundo empresarial vai a Brasília e faz um lobby contra o (projeto de reforma do) Imposto de Renda. Ele na verdade está inviabilizando o (aumento do) Bolsa Família. Vai produzir uma reação do governo que é o seguinte: ah é, então quer dizer que não tem fonte não, né? Não tem tu vem tu mesmo. Então é o seguinte, bota aí R$ 500 logo de uma vez e é auxílio emergencial. A pandemia está aí, a pobreza está muito grande, vamos para o vamos ver ", disse Guedes durante evento do BTG Pactual.
Em seguida, o ministro reconheceu que essa via criaria um "problema tremendo para todo mundo". Embora o auxílio tenha sido crucial para ajudar famílias vulneráveis na pandemia, seu gasto, superior a R$ 300 bilhões, elevou a dívida pública de forma significativa.
"Ora, está criando um problema tremendo para todo mundo, inclusive para quem vos fala. Eu não estou lá para fazer bagunça, e vai virar bagunça se não tiver uma solução tecnicamente correta", alertou Guedes.
Como mostrou o Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), o governo tem um "plano B" para a fonte de recursos do Auxílio Brasil, que é o plano de cortes em subsídios que será enviado ao Congresso Nacional neste mês. Mas essa opção também depende do aval dos parlamentares para avançar, o que pode ser um obstáculo.
Dentro do governo há defensores da renovação do auxílio emergencial. Como mostrou a reportagem, a ala entusiasta dessa medida argumenta que o substituto do Bolsa Família é perene, mas não atende a todo público do benefício a vulneráveis.
Recriado em abril, o auxílio emergencial de 2021 contempla 39 milhões de famílias elegíveis, enquanto o Auxílio Brasil deve alcançar cerca de 17 milhões.