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Há 50 anos, escritores e um escândalo impulsionavam a Primavera de Praga

Este período de “socialismo com rosto humano” introduzido por Alexander Dubcek, que mais tarde seria chamado de Primavera de Praga, teve origem em um congresso tchecoslovaco de escritores de 1967, segundo a socióloga Jirina Siklova.

Homens de letras, como Kundera e o futuro presidente tcheco, Vaclav Havel, instaram o Partido Comunista (PC) a garantir a liberdade de expressão, abrindo caminho para a própria liberdade.

“O PC começou a se dividir e estava claro que algo iria mudar”, afirma Siklova, que naquele momento estava afiliada ao partido. “A esperança era imensa”.

Petr Pithart, que também era comunista naquela época, e depois presidente do Senado (1996-1998 e 2000-2004), recorda as tensões entre tchecos e eslovacos, outro fator que, segundo ele, debilitou o sistema.

“Os eslovacos queriam ser tratados como iguais perante os tchecos e entenderam que um choque frontal era sua única opção”, aponta.

Em 5 de janeiro de 1968, Alexander Dubcek, um eslovaco, se põe à frente do país como primeiro secretário do PC. Criticado por sua política, o presidente Antonin Novotny, chefe de Estado desde 1957 e do PC desde 1953, teve que lhe ceder o lugar, porque o Comitê Central proibiu que ele acumulasse os dois cargos.

Esta cadeia de eventos criou um ambiente que “acelerou muito as coisas”, diz Pithart.

A queda de Novotny

Novotny abandonou o posto-chave na liderança do PC, a polícia começou a investigar um tráfico de sementes de trevos procedentes dos armazéns do exército. Um dos principais suspeitos era um protegido do presidente, o general Jan Sejna, que o havia organizado para financiar sua vida de luxo e suas amantes. Para evitar a prisão, Sejna foi para a Itália e, daí, aos Estados Unidos, onde obteve asilo político (e forneceu valiosas informações de inteligência militar).

“Foi um grande escândalo e em dois ou três dias, todas as barreiras caíram, os meios começaram a falar de tudo”, recorda Pithart.

Sejna também foi acusado de ter considerado, junto com outros oficiais conservadores, como o general coronel Vladimir Janko (que se suicidou em 14 de março de 1968), organizar um golpe militar para manter Novotny no poder.

Sua fuga precipitou a queda do presidente, que renunciou em 22 de março de 1968.

“De repente, as pessoas descobriram a solidariedade, poderíamos inclusive dizer que estavam dispostos a sacrificar algo. Reinou uma euforia fantástica”, diz Pithart.

Foram publicados livros proibidos, como “Um Dia na Vida de Ivan Denisovich”, de Alexander Solzhenitsyn, foram representadas obras de teatro de Havel e Ionesco e as fronteiras foram abertas. Filmes até então proibidos foram projetados, as pessoas escutavam música moderna e se produziram debates em um tom muito livre.

Strip-tease

Até fotos de mulheres nuas apareceram em revistas, e também surgiram os espetáculos de strip-tease.

Mas a invasão do Pacto de Varsóvia rapidamente pôs fim a tudo isso.

Em 21 de agosto, as forças soviéticas, búlgaras, do leste alemão, húngaras e polonesas invadiram a Checoslováquia para restabelecer a ortodoxia comunista e forçar os novos dirigentes a recuarem.

Siklova deixou o PC em 1969, e depois a universidade, para se tornar um varredor.

Passou um ano na prisão, em 1981, quatro anos depois de que a oposição publicou um manifesto chamado Carta 77. Siklova e Pithart o haviam assinado.

Pithart devolveu sua carteirinha do PC em 1969 “para protestar contra Dubcek, contra a forma como negociou após a ocupação”.

O estudante de Direito que cursou parte da sua formação em Oxford acabou, de repente, sondando águas subterrâneas e vivendo em uma caravana.

Mas hoje, quando relembram 1968, Siklova e Pithart asseguram que a Primavera de Praga foi um sucesso, pois deu um forte golpe à URSS e ao seu prestígio no mundo.

“O socialismo com rosto humano ficou nos espíritos como uma alternativa, como uma possibilidade. Não somos obrigados a ter um socialismo do tipo soviético, com seu peso”, afirma Siklova.

Para Pithart, o comunismo era apenas um disfarce para a “ideia imperial russa”, que assumiu uma forma distinta.

“O comunismo é passado. Mas devemos temer a Rússia de novo, não porque seja comunista, mas porque milhões de russos estão dispostos a morrer por esta ideia imperial e não há nenhuma outra nação no mundo que seja capaz disso”.

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