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Homem linchado no Guarujá: áudio da vítima faz polícia adotar nova linha de investigação

A Polícia Civil conseguiu identificar três suspeitos de espancar até a morte o comerciante Osil Vicente Guedes, de 49 anos, na última quarta-feira, 3, no Guarujá, litoral de São Paulo. Dois deles têm antecedentes criminais, de acordo com os investigadores. Os nomes foram preservados para não atrapalhar as investigações.

Os policiais buscam confirmar a motivação do crime. As duas principais hipóteses são de um crime encomendado ou de linchamento após fake news. Na primeira, uma das suspeitas é o envolvimento da psicóloga Vanessa Almeida, ex-mulher de Osil. De acordo com os familiares, a vítima enviou um áudio aos parentes em Pernambuco informando que ela havia sido responsável por uma sessão de espancamento que ele sofreu. O áudio foi divulgado por familiares nesta terça-feira, 9, dia do enterro do comerciante.

Um dos suspeitos é o ex-cunhado da vítima, segundo apurou o <b>Estadão</b>. O homem de 35 anos foi identificado a partir das imagens que mostram a vítima sendo espancada. Em depoimento, ele negou participação. O outro suspeito teria usado um pedaço de madeira. O terceiro foi flagrado nas imagens arrastando a vítima.

Essa primeira "surra" teria acontecido dois dias antes do espancamento que o vitimou. O ato de violência ocorreu após Osil procurar a ex em busca de reconciliação. Ele havia ameaçado se matar caso eles não reatassem, segundo relatou à polícia um dos irmãos da vítima, de 61 anos, que não quer se identificar. "A família quer a investigação para saber a verdade. A gente quer justiça", diz o irmão.

Segundo parentes, os dois estavam separados havia dois meses e viviam um relacionamento conturbado, com brigas e discussões. A família confirmou que Osil tinha problemas psicológicos e fazia uso contínuo de medicamentos para depressão, agravada após a separação do casal.

Osil e Vanessa se conheceram como paciente e psicólogo. Osil havia encontrado o nome de Vanessa em uma consulta na internet por psicólogos. Depois de seis meses de tratamento, os dois começaram um relacionamento amoroso.

"Você acredita muito na conversa de Vanessa. Ela te contou que ela chamou três traficantes para me espancar? O cunhado dela e mais dois, mais dois bandidos perigosos. Ela te contou isso?", pergunta o comerciante em uma mensagem de áudio enviada a uma parente.

Vanessa já foi chamada pela polícia para depor. Ela negou envolvimento no espancamento. Fontes ligadas à polícia afirmam que sua versão não convenceu totalmente os investigadores e ela pode ser chamada novamente. O Estadão tenta contato com Vanessa desde a última segunda-feira, sem sucesso.

Outra linha de investigação, que perdeu força nos últimos dias, se refere à acusação falsa de que Osil teria roubado uma motocicleta. No momento da agressão, ele circulava com um veículo emprestado – o proprietário, que não quis se identificar, confirmou o empréstimo. Testemunhas relataram à PM que gritos de "pega ladrão" foram direcionados a Osil. A polícia quer entender quem deu esse grito e a razão, questões que os investigadores consideram fundamentais.

A família descarta essa versão. "Isso não é verdade. É uma pessoa direita. Inventaram uma desculpa para poder bater nele. Eu acho que queriam justificar que estavam batendo nele", diz o irmão. Osil estava internado desde o dia da agressão na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Santo Amaro, no Guarujá, onde foi declarada sua morte encefálica no domingo. Ele deixa três filhos. Todos estão com a mãe, no interior de São Paulo.

<b>Linchamento de comerciante choca o Guarujá: Fiquei com os gritos na cabeça </b>

Os vizinhos, comerciantes moradores de Vicente de Carvalho, bairro onde Osil morava e trabalhava, estão chocados com o crime que aconteceu há uma semana. É uma percepção subjetiva, não há números, não há dados, mas o choque é real. As pessoas não se identificam com medo de retaliações dos autores do crime; quando falam sobre a tragédia, algumas olham para o céu ou para o chão buscando uma explicação.

O <b>Estadão</b> esteve no local da tragédia, entre a Avenida Oswaldo Cruz e Rua Tambaú. Comerciantes relatam ter ouvido os barulhos da briga – gritos, gemidos e batidas -, mas só perceberam a gravidade da situação com a chegada da ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para socorrer o morador descrito como pessoa tranquila, evangélico e que convivia com problemas emocionais relacionados à depressão.

É um impacto que vai demorar a passar, como tenta explicar a comerciante de uma loja de material para construção praticamente ao local em que Osil foi brutalmente espancado por quatro homens. "Fiquei com os gritos na cabeça. Na hora, não caiu a ficha. Depois, quando vi a ambulância, percebi que era grave. Quando veio a notícia da morte, fiquei sem chão", diz uma senhora de 67 anos.

O choque e o espanto são acompanhados do medo. Todas as pessoas ouvidas pelo Estadão só aceitam ser entrevistadas sob a condição de anonimato. Só depois de estabelecida a condição, elas falam. E, mesmo assim, escolhem bem as palavras. Silêncios. Há receio de retaliação por parte dos responsáveis pelo crime. "A gente nem sabe o que dizer. A gente entende quando uma pessoa vai, mas não dessa forma", diz uma vizinha do depósito de reciclagem que Osil administrava.

Vizinhos do depósito de reciclagem que ele administrava, a quase um quilômetro de distância do local da morte, estranham o silêncio no local. Osil morava no mesmo endereço da própria empresa de reciclagem. Eles dizem que o movimento era constante, com entrada e saída de plásticos, madeira, ferro – tudo o que permitisse reaproveitamento.

Cláudio Guedes, de 61 anos, planeja fechar o depósito. Ele também atua no ramo, mas vai ficar apenas com seu depósito. Para isso, ele pretende vender materiais, concluir negociações que ficaram no meio do caminho e pagar algum eventual credor. Não quer deixar dívidas. Os dois cães de Osil, entre eles um pitbull, não estão se alimentando. "A gente coloca a comida, mas eles não comem. Já perceberam alguma coisa estranha."

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