Estadão

Ibovespa cai 0,18%, a 111,6 mil pontos, em dia de fortes quedas no exterior

A indicação pelo Copom, na noite de quarta-feira, de que o ciclo de elevação da Selic está mais próximo do fim do que parte do mercado precificava foi o contraponto, nesta quinta-feira, ao forte ajuste visto nas bolsas europeias e de Nova York – aquelas em reação a sinais mais claros de restrição da liquidez provida nos últimos anos pela política monetária, e as de NY, especialmente a Nasdaq, a decepção com os resultados trimestrais da empresa controladora do Facebook, a rede social que pela primeira vez em 18 anos registrou decréscimo no número de usuários diários.

Ao fim, após tocar de leve terreno positivo no começo e ao fim da tarde, o Ibovespa mostrava baixa moderada de 0,18%, aos 111.695,94 pontos, enquanto as perdas nos principais mercados da Europa chegaram nesta quinta a 1,57% (Frankfurt) e a 3,74% em Nova York (Nasdaq). Na B3, o giro foi contido nesta quinta-feira pós-Copom, limitado a R$ 24,3 bilhões, com a referência entre mínima de 111.224,91 e máxima de 112.502,18 pontos, saindo de abertura aos 111.897,22. Na semana, o Ibovespa cede 0,19% e, no mês, 0,40%, ainda acumulando bom ganho de 6,56% no ano.

No exterior, além da tensão proporcionada pelas movimentações militares entre a Otan e a Rússia, nesta quinta a elevação de juros pelo Banco da Inglaterra, a 0,50%, e o maior grau de preocupação com a inflação emitido pelo Banco Central Europeu (BCE) contribuíram para reforçar a cautela dos investidores, vista desde o início de janeiro, quando o Federal Reserve redobrou as indicações de que se aproxima o momento de elevação do custo de crédito na maior economia do mundo.

Com o processo de restrição na política monetária de emergentes, como o Brasil, mais adiantado do que no mundo desenvolvido, o Copom, em linha com o esperado, elevou na quarta a Selic de 9,25% para 10,75% ao ano, indicando, no comunicado, que tende a tirar o pé após este ajuste de 1,50 ponto porcentual. A leitura sobre o sinal não deixa de ser ambivalente: por um lado, o nível e a trajetória da inflação ainda preocupam o mercado, o que tem se refletido na curva de juros; por outro, um ciclo menor de ajuste da Selic tenderia a ajudar a economia e o nível de atividade, que também preocupam.

Assim, as ações dos setores de serviços e consumo (Yduqs +2,18%, CVC +2,08%, Americanas ON +2,53%) estiveram entre as favorecidas pelos investidores na sessão, também positiva para os grandes bancos (Itaú PN +1,16%, Bradesco PN + 1,47%), enquanto as de commodities mostraram desempenho negativo, especialmente Petrobras (ON -1,07%, PN -1,38%), mesmo com o avanço das cotações do Brent e do WTI nesta quinta-feira. O mercado ponderou declarações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que prometeu, caso eleito, acabar com a paridade internacional de preços da estatal, dizendo estar mais preocupado com as donas de casa do que com acionistas.

Do Copom, "o que veio com certa surpresa foi a indicação, para próximas reuniões, de aumento menor do que os 150 pontos-base, deixando alguma margem caso as condições e a inflação mudem até lá. O ciclo de aumento de juros já está no final, o que não deixa de ser positivo para a economia e o crescimento", diz Mauro Morelli, estrategista-chefe da Davos Investimentos.

"A redução do ritmo de ajuste para a próxima reunião foi a novidade, mudança que vinha dividindo o mercado: uma parte acreditava que o BC daria esse sinal, outra de que deixaria a porta aberta. Pode ser traiçoeiro deixar já esta definição, porque a inflação pode mostrar evolução ainda em ritmo alto neste primeiro trimestre, com o mercado precificando patamares mais altos na curva de juros, por conta desta persistência", diz Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, acrescentando que tal ponto pode vir a ser melhor esclarecido na ata do Copom.

"Embora o BC tenha optado por não aumentar o ritmo de ajuste neste momento, mesmo com a inflação surpreendendo negativamente, voltamos a um patamar de dois dígitos na taxa Selic, e já vemos revisões do crescimento para baixo, que devem tirar pressão da inflação no médio prazo, sugerindo que o movimento do Banco Central tem sido prudente", observa Fernanda Consorte, economista-chefe do Banco Ourinvest.

"De qualquer forma, o comunicado trouxe novamente tom de alerta, principalmente sobre o quadro fiscal e possíveis impactos que um aumento nos gastos poderia ter sobre a inflação. Ou seja, o mercado pode interpretar que o ciclo de ajuste da Selic pode ser um pouco mais longo do que o previsto anteriormente. O mercado projetava juros de 11,75% para o final deste ano e essa projeção pode subir após a decisão (de quarta). Talvez para 12%, não muito mais que isso", acrescenta.

"Os membros do comitê continuam receosos sobre a questão fiscal doméstica, enquanto se mostraram mais preocupados com o cenário externo diante da possibilidade de um ciclo de alta mais acelerada nos juros americanos, o que dificultaria a situação financeira para economias emergentes como o Brasil. Além de ainda manterem a cautela no que tange aos impactos da pandemia sobre a recuperação das cadeias globais de produção", aponta Paloma Brum, analista de investimentos na Toro.

"Ao analisarmos o comunicado do Copom, os ajustes refletidos nos juros futuros estão, de certa forma, alinhados com o caminho que o BC quer seguir, apesar da redução momentânea do ritmo de ajuste. Por isso, considerando somente esse fator, a tendência é de que a curva não sofra alterações bruscas nos próximos dias", avalia Vinicius Romano, especialista de renda fixa na Suno Research.

Para Davi Lelis, especialista da Valor Investimentos, o forward guidance que emergiu na quarta do comunicado do Copom foi de juros a 12% no primeiro semestre e a 11,75% no fim do ano, "com mais uma alta e depois começando a cair". "O BC cumpriu o que prometeu, para neutralizar inflação que vem elevada ao longo do tempo", acrescenta.

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