A resiliência dos dados oficiais de inflação no Brasil em junho e a geração de empregos acima do esperado para o mesmo mês nos Estados Unidos contribuíram para que o Ibovespa replicasse a cautela vista também em Nova York, em boa parte desta última sessão de semana na qual se acumularam ganhos moderadamente, aqui como em Wall Street. Hoje, o avanço no período foi aparado por desempenho negativo do Ibovespa, em baixa de 0,44%, aos 100.288,94 pontos, conseguindo preservar pelo segundo dia a linha dos seis dígitos que, até ontem, não era vista em encerramento desde 28 de junho.
Entre a mínima e a máxima desta sexta-feira, o índice oscilou dos 99.958,49 aos 101.576,67, saindo de abertura aos 100.731,54 pontos. Após alguma recuperação ontem, o giro financeiro voltou a ficar bem fraco nesta véspera de fim de semana, limitado a R$ 17,4 bilhões. O ganho de 1,35% na semana vem após o de 0,29% no intervalo anterior, que havia interrompido série de quatro perdas. No mês, o Ibovespa avança 1,77%, ainda cedendo 4,32% no ano.
À exceção de Petrobras (ON +0,91%, PN +1,12%) e ao fim dos bancos (BB ON +0,97%, Bradesco ON +0,35%), o dia se mostrava majoritariamente negativo para ações e setores de maior peso no índice, que ontem haviam avançado em bloco e passaram, em boa parte, a acumular ganhos na semana – situação estendida hoje aos papéis de Petrobras, que subiram respectivamente 0,29% e 0,95% no agregado de segunda a sexta. Na ponta do Ibovespa na sessão, destaque para Azul (+6,23%), Cielo (+5,13%) e Via (+3,40%). No lado contrário, Hapvida (-4,37%), CVC (-4,28%) e Sul América (-3,17%). Vale ON cedeu 2,31% nesta sexta-feira, ainda avançando 0,40% na semana.
Com os descontos que começaram a aparecer em abril e se aprofundaram em junho após a leve recuperação de maio, os investidores aos poucos voltam a olhar oportunidades de compra, não apenas em ações mais líquidas como também nas que ficaram bem para trás no ano. O otimismo do mercado sobre o comportamento das ações no curtíssimo prazo teve impulso no Termômetro Broadcast Bolsa desta sexta. Nenhum dos participantes disse esperar queda para o Ibovespa na próxima semana, com as expectativas divididas entre alta (76,92%) e estabilidade (23,08%), o que não ocorria desde a primeira semana de dezembro de 2021. No último Termômetro, 42,86% diziam esperar ganhos esta semana; outros 42,86%, variação neutra; e 14,29%, baixa.
Ainda assim, o cenário macro permanece enevoado pela resiliência da inflação no País, enquanto em Brasília se encaminha com dificuldade a votação, na próxima semana, da PEC dos Benefícios, com ampliação de transferências em meio às dificuldades de renda na população. Ontem, o baixo quórum fez com que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), aliado do governo, decidisse não colocá-la em votação, transferida para a próxima terça (12). Enquanto a ampliação de gastos não vem, economistas monitoram a inflação, ainda forte em junho.
"A inflação (pelo IPCA) atingiu 11,89% em junho, seguindo bem longe da meta do Banco Central para o ano. Apesar da aceleração no mês, os dados indicam um início bem gradual do enfraquecimento da alta de preços", aponta Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos, apesar do avanço em 12 meses em relação ao observado em maio (11,73%), com o IPCA acumulando alta de 5,5% desde janeiro, acima portanto da meta para o ano todo, de 3,50%.
"Ponto positivo foi a queda da difusão, que passou de 0,72% para 0,67%", observa Tatiana Nogueira, economista da XP. "À frente, com a sanção do PLP 18, medida que diminui impostos de energia elétrica, gás natural, combustíveis, telecomunicações e transportes coletivos, o IPCA deve entrar em campo deflacionário. Estimamos deflação de -0,81% em julho e IPCA de 7,0% no ano."
Para Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, os dados tenderam a ser bem recebidos pelo mercado, na medida em que vieram um pouco abaixo da mediana das projeções para o mês, apesar do avanço ante maio. "Sabíamos que haveria pontos mais específicos (com efeito no mês), como o reajuste de planos de saúde", diz o estrategista, antecipando que o IPCA deve convergir para patamar mais baixo em julho, com as reduções de ICMS já anunciadas por vários Estados.
No exterior, o destaque da agenda nesta última sessão da semana foram os dados oficiais sobre o mercado de trabalho nos Estados Unidos, com geração de vagas acima do esperado para o mês. "O payroll de junho tende a reforçar a percepção do mercado de que o Federal Reserve estará mais inclinado a elevar a taxa de juros de referência em 0,75 ponto porcentual (na próxima reunião, em julho), com o mercado de trabalho americano ainda bastante aquecido", avalia Cruz. Ele destaca, além da geração de vagas, a taxa de desemprego, que permaneceu em 3,6% pelo terceiro mês seguido, e números ainda "mostrando ganho salarial relevante" por hora trabalhada.
"O processo de acomodação dos ativos de risco está na metade do caminho. Ainda há volatilidade no segundo semestre para acontecer, e por um motivo simples: o mercado ainda não encontrou nem a taxa de juros nominal nos Estados Unidos que fará com que a economia americana esfrie o suficiente para trazer a inflação de volta ao centro da meta, nem quanto a economia precisará desacelerar para que isso aconteça", diz Daniel Miraglia, economista-chefe do Integral Group.